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O erro salva a fábrica

Quem entra num laboratório de testes elétricos pela primeira vez costuma achar que ficamos (finalmente) malucos. Lá dentro, a gente faz o impensável: provoca sobrecargas de propósito. Injetamos correntes brutais em fusíveis e disjuntores só para ver se eles “caem” na hora certa. Parece destrutivo, mas é vital. Precisamos saber se, quando o sistema superaquecer de verdade, a proteção vai funcionar ou se a fábrica inteira vai virar cinzas.
O disparo do disjuntor, ao contrário do que parece, não é uma falha. É o sucesso da segurança. A ironia é que, quando a gente tira o capacete, põe o terno, entra na sala de conferências e vai fazer uma reunião corporativa, essa lógica vira do avesso.

No mundo empresarial, o plano estratégico é tratado quase como uma escritura sagrada. Se a realidade mostra que o plano estava errado, a liderança medíocre não ajusta o plano; ela pune quem trouxe a má notícia ou maquia o relatório. Isso não é gestão. É negligência técnica disfarçada de autoridade.

Existe uma briga eterna entre o Projeto e a Obra. O seu plano de metas é como um projeto elétrico no papel: lá o mundo é lindo, a linha é reta, a resistência é zero e a temperatura é sempre 25 °C. Só que o papel aceita qualquer desenho. A rede elétrica real — e o mercado — só obedecem à física. Na prática, tem conexão frouxa, tem poeira, tem atrito.
E é aí que mora o perigo do medo.

Testes elétricos (Foto: Freepik gerada por IA)

Quando sua equipe tem pavor de errar, a empresa fica cega. O vendedor esconde que o cliente reclamou, o operador faz uma gambiarra silenciosa na linha de produção, e todo mundo finge que está tudo bem. O resultado? Você continua injetando energia (e dinheiro) num sistema que já está em curto. Uma hora, o transformador principal explode — seja o caixa da empresa ou a saúde mental do time.

Liderar de verdade é entender que a execução é um ciclo de calibragem. É energizar, medir, ver que esquentou e ajustar a rota. O maior inimigo da sua empresa hoje tem nome técnico: chamamos de “Jumper” (ou o famoso by-pass). Na elétrica, quando um fusível queima três vezes e o operador tem medo de parar a máquina para investigar, ele arranca o fusível e coloca um pedaço de arame no lugar. A máquina volta a rodar? Volta. O chefe fica feliz com a produção? Fica. Mas a proteção acabou.

Testes elétricos (Foto: Freepik gerada por IA)

O silêncio da sua equipe é exatamente esse jumper. É uma falsa sensação de normalidade enquanto o sistema derrete por dentro sem ninguém ver. Entenda: um erro avisado rápido é um fusível de dez reais que queimou para salvar um motor de dez mil. É barato. É didático. Mas, para que a equipe reporte isso, você precisa desligar a “alta tensão” do medo. Em vez de gritar “quem queimou isso?”, experimente perguntar “por que a corrente subiu tanto?”.

Desafio da Semana
Não existe plano à prova de falhas, existe capacidade de correção rápida. Por isso, deixo um convite para sua próxima reunião de status. Inverta a pauta. Não pergunte só o que deu certo. Institua a “Análise de Falha”. Pergunte ao time: “onde o disjuntor desarmou essa semana? O que a gente tentou fazer que não funcionou como no PowerPoint, e o que aprendemos com isso?”.
Valorize quem traz o problema à tona antes do incêndio. Transforme sua empresa num sistema inteligente, onde a falha pequena é isolada e estudada, garantindo que a energia continue fluindo onde realmente importa: no resultado.

Francisco Neto

Francisco Neto

Francisco Neto Engenheiro eletricista da Conexa Engenharia Transformo soluções inteligentes em energia, eficiência e segurança @eng.fneto

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