Economia

Reforma Tributária – “chocha, capenga, manca, anêmica, frágil e inconsistente”

Em 2017, após o presidente Temer ser acusado de corrupção, a sua defesa emitiu um documento de quase 100 páginas para desqualificar a acusação. A leitura de parte desse documento no Jornal Nacional, pela jornalista Renata Vasconcelos, viralizou na internet até os dias de hoje. Peço licença aos criadores e à jornalista Renata Vasconcelos para utilizar a mesma frase para descrever a reforma tributária apresentada pelo ministro Paulo Guedes. Então aqui vai, essa proposta de reforma tributária é “chocha, capenga, manca, anêmica, frágil e inconsistente”.
Desde que assumiu o cargo de ministro da economia, Paulo Guedes perdeu grande parte da credibilidade que o circundava. E o motivo para isso? Bom, podemos apontar vários. Primeiro, podemos olhar para o próprio presidente, que no começo do seu governo se preocupou muito mais com as pautas ideológicas do que com as técnicas, contrariando seu discurso de campanha. Com falas desnecessárias por parte do presidente e de alguns ministros, a credibilidade concedida ao governo pelas urnas derreteu e com isso a governabilidade se tornou difícil. Prometendo grandes mudanças, reformas e privatizações, Paulo Guedes não conseguiu, até agora, entregar nada do que prometeu e, assim, sua credibilidade também se perdeu.
Talvez esse seja o motivo de nenhuma reforma expressiva ter passado. Talvez seja apenas um dos motivos. Mas o fato é que o governo, que pretendia ser reformista, se rendeu ao “mais do mesmo”. A equipe econômica teve, aproximadamente, 18 meses para preparar essa proposta, o que é tempo de sobra. Alardeavam que estava quase pronta, que restavam poucos detalhes. Ora, não seria então nenhuma loucura imaginar que entregariam uma reforma completa, que excluísse de uma vez as injustiças na tributação, como a alta incidência de impostos sobre o consumo ou com uma atualização da faixa isenta do IR. Ao invés disso, foi apresentada uma reforma tão simples que, praticamente, se resume na junção do PIS e do Cofins e na criação de um novo imposto, como se já não tivéssemos o suficiente. E o que torna tudo pior, propostas similares já estão em debate no congresso, ou seja, de novo, a proposta do governo, não tem praticamente nada.
A importância dessa proposta está na necessidade de tornar o Brasil mais eficiente. Por exemplo, segundo o Banco Mundial, o Brasil é o país que as empresas mais gastam horas para pagar seus impostos, cerca de 1500 horas, ou 62,5 dias de trabalho – e o segundo colocado está distante, a Bolívia, com 1025 horas. E não, não estamos falando da carga tributária, mas, sim, do trabalho que as empresas têm para poder pagar os impostos. Para os países da OCDE, o clube dos países ricos, se gasta 158,8 horas, 10,5% do que é gasto aqui. No Brasil, a cada 200 funcionários, um é da área contábil, já na Europa é de um para 500 e nos EUA de um para 1000.
Temos hoje cerca de 73 tipos de tributos e aproximadamente 97 obrigações acessórias. Além disso, estima-se que cada empresa tenha que seguir 3790 normas. Ainda carregamos a terrível média de ter a cada hora uma nova norma para ser seguida. Não é exagero, a cada 60 minutos, em média, uma nova norma é editada. Toda essa bagunça tributária gera um gasto de, aproximadamente, R$ 60 bilhões por ano. Para se ter uma ideia, é três vezes o valor do Bolsa-Família ou quase metade do que se gasta com educação.
Ainda vale ressaltar as injustiças sociais que esse atual sistema tributário promove. Grande parte dos nossos impostos são de consumo. Esse tipo de imposto é cruel, pois prejudica a atividade econômica e não faz distinção entre ricos e pobres. O trabalhador que ganha um salário paga o mesmo que o bilionário. Outro problema é a atualização da tabela de Imposto de Renda. Os salários foram atualizados, houve ganho real, houve inflação, mas a faixa de quem é isento não foi atualizada, fazendo com que cada vez mais pessoas de classes baixas paguem o IR.
No meio dessa bagunça toda, perdemos muito valor. No meio dessa bagunça toda, muitas empresas optam por não investir no Brasil. O custo disso vai além dos R$ 60 bilhões. O prejuízo vai dos negócios que nunca vão acontecer aos negócios que foram punidos por errar em sua parte tributária. Precisamos urgentemente gerar mais renda no Brasil e aumentar nossa eficiência. A reforma tributária é um passo essencial, mas parece que não vamos ter grandes mudanças. No meio de uma piscina olímpica de confusão, a proposta do governo é como retirar um copo de 200 ml dessa piscina. Seria possível escrever muito mais sobre como nosso sistema tributário é ineficiente e como a proposta do governo foi fraca. Mas peço licença novamente aos autores dessa frase e à jornalista Renata Vasconcelos, vou descrever a proposta de reforma tributária como “chocha, capenga, manca, anêmica, frágil e inconsistente”.

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