Apagão docente: jovens se afastam da profissão

Idade média dos professores está aumentando à medida que as novas gerações se desencantam com a carreira

De tempos em tempos, o alerta ressurge: o Brasil está à beira do colapso quando o assunto é o número de docentes aptos a lecionar na educação básica. O medo do fenômeno batizado como apagão docente — a falta de professores — estampou manchetes de jornal às vésperas do primeiro turno das eleições presidenciais do ano passado. Realizado pelo Instituto Semesp, órgão ligado às mantenedoras do ensino superior privado paulista, um novo estudo projeta o possível déficit de 235 mil professores no ano de 2040 caso nada seja feito para reverter o quadro atual.

Esse número equivale a 20% dos atuais 2,2 milhões de docentes da educação básica brasileira. A queda projetada se deve a motivos diversos: diminuição da procura dos jovens pelos cursos de licenciatura; alto índice de desistência da profissão nos primeiros anos de carreira; iminente aposentadoria de muitos educadores em atividade e baixa atratividade da docência, fruto do pouco reconhecimento social e da remuneração insuficiente. Fenômenos estes que não comportam solução isolada, exigindo ações articuladas.

Estamos vivendo um apagão do magistério já faz muitos anos, associado à precarização da formação. É algo para ser enfrentado com absoluta prioridade, pois a qualidade depende de termos bons profissionais”, avalia César Callegari, ex-secretário de Educação Básica do MEC e ex-secretário de Educação do município de São Paulo.

Falar do possível apagão docente ou de sua existência já consumada e suas causas parece sempre notícia requentada. Mas, a cada vez que se acende o fogo, o fundo está mais seco. Ou seja, a situação está pior. Em 2007, um estudo feito por membros do Conselho Nacional de Educação (CNE), assinado por Mozart Neves Ramos, Murílio Hingel e Ibañez Ruiz (Escassez de professores no ensino médio: propostas estruturais e emergenciais) alertava para a urgência de incremento da formação para a etapa.

Quatro anos antes, em 2003, apenas 30% da população adulta brasileira (de 25 anos em diante) tinha o diploma do médio, contra 42% dos argentinos e 49% dos chilenos, para ficar apenas nos países da região. Por isso, era preciso formar docentes para a etapa.

Na época, o governo federal estimulou as licenciaturas e a formação adequada de docentes (em especial pela Universidade Aberta do Brasil, via EAD) que lecionavam em áreas distintas daquelas para as quais estavam habilitados e, em alguns casos, ainda sem curso superior. O aumento da oferta de professores, ao lado de outras medidas, fez com que o percentual de formados no médio subisse quase 20 pontos percentuais. Em 2019, eles eram 48,8% dos brasileiros adultos, segundo o IBGE.



A pesquisa do Semesp aponta de forma clara o envelhecimento dos docentes em atividade e a queda dos jovens ingressantes na profissão. Entre 2016 e 2021, todas as faixas etárias a partir de 40 anos (40 a 49; 50 a 54; 55 a 59; mais de 60 anos) tiveram crescimento expressivo em seu total de professores, enquanto nas três faixas mais próximas do início da carreira (até 24 anos; 25 a 29; 30 a 39), houve decréscimo em relação a seu total anterior.

Nas duas faixas com maior número de docentes, a tendência é inversa entre si. Enquanto entre aqueles de 30 a 39 anos houve decréscimo de 13,9% (de 769,3 mil para 662,4 mil entre 2016 e 2021), a faixa de 40 a 49 anos engordou 12,3%, de 671,9 mil para 754,7 mil no mesmo período.

De 55 anos em diante o crescimento percentual é ainda maior. A conclusão é que muitos desses profissionais se mantêm na ativa à espera da aposentadoria. Já os mais jovens — até 24 anos e de 25 a 29 anos — estão desistindo mais da profissão em busca de outras carreiras.

Os números batem com a percepção dos levantamentos realizados pela Conectando Saberes, instituição que reúne cerca de 900 professores e 10 secretários municipais.

Nós mesmos acabamos sendo os detratores da nossa carreira. Por isso, trabalhamos ouvindo quais são as demandas dos professores”, diz Paolla Vieira, diretora da instituição.

O trabalho resultante das pesquisas tem investido em duas linhas: o aumento do repertório docente, tentando desenhar um perfil do ‘educador do futuro’, e propostas de saúde e bem-estar dos corpos docente e discente. Além disso, os professores também mostraram interesse em questões como liderança e engajamento comunitário, em especial após a pandemia.
Fonte: Revista Educação