Economia

Caminho para Economia do Hidrogênio não é tão suave quanto se pensava

Uma Economia do Hidrogênio parece ser altamente desejável, mas a “paisagem” que ela criará não é tão agradável como se imaginava

Com informações do PSI

Pesquisadores do Instituto Paul Scherrer, na Suíça, analisaram quais regiões do mundo poderiam produzir hidrogênio de forma mais econômica para construir uma economia baseada nessa fonte de energia alternativa e limpa, em substituição às alternativas baseadas em combustíveis fósseis. Uma de suas descobertas é que simplesmente substituir combustíveis fósseis por eletricidade e hidrogênio não acabará com as emissões de gases de efeito estufa.
A eletrificação do transporte, da indústria e das residências, juntamente com a migração para fontes renováveis de eletricidade, como energia hidrelétrica, eólica e solar, é um dos principais elementos para atingir a neutralidade em termos de clima, zerando qualquer efeito estufa adicional.

No entanto, a eletricidade não pode ser empregada em todos os lugares como fonte de energia — para aplicações específicas, sua densidade de armazenamento de energia é insuficiente. Quando demandas maiores precisam ser atendidas, o hidrogênio deve entrar em cena. Aviação, agricultura e indústria siderúrgica, por exemplo, representam aplicações que poderiam reduzir muito seus impactos climáticos usando hidrogênio — que pode ser convertido para produzir fertilizantes ou hidrocarbonetos sintéticos.

Os pesquisadores coletaram dados geográficos e econômicos e previsões para descrever o desenvolvimento de uma Economia do Hidrogênio em quatro cenários diferentes. No primeiro cenário, o mundo continua com os negócios como de costume, ainda dependendo de combustíveis fósseis. No quarto e mais otimista, são adotadas medidas rigorosas de proteção climática e conseguimos atingir a meta de 1,5ºC de elevação da temperatura global. No momento, aproximadamente 90 megatoneladas de hidrogênio são produzidas em todo o mundo a cada ano. Dependendo do cenário, a estimativa é que a demanda por hidrogênio ficará entre 111 e 614 megatoneladas por ano em 2050.

Onde há espaço suficiente para eletrólise?
O hidrogênio pode ser produzido por vários processos. A reforma do metano a vapor, na qual o elemento é extraído do gás natural, petróleo ou carvão, ou seja, combustíveis fósseis — sob condições de alta pressão e temperatura, é atualmente o método dominante. Os cenários mais otimistas assumem que os eletrolisadores PEM (membrana de troca de prótons) serão cada vez mais usados. Esses dispositivos usam eletricidade e uma membrana de eletrólito de polímero para dividir a água em hidrogênio e oxigênio. Se for usada apenas eletricidade verde, de fontes renováveis, para alimentar o processo, ele pode ser executado sem combustíveis fósseis, produzindo até 90% menos gases de efeito estufa do que a reforma do metano a vapor.

A questão central, no entanto, é em quais partes do mundo o hidrogênio deveria ser produzido usando essa tecnologia. “Aplicamos principalmente critérios econômicos, em outras palavras, olhamos onde a produção seria mais barata”, explica o pesquisador Tom Terlouw.

Dois fatores se mostraram decisivos: Onde a enorme demanda por eletricidade verde necessária para eletrólise pode ser atendida de forma mais eficiente, com abundância de fontes alternativas de energia, como eólica e solar? E onde há terra adequada suficiente para construir as instalações de produção necessárias?

O Canadá é ideal
Grandes partes do Canadá acabaram se mostrando as melhores regiões do mundo para a futura produção de hidrogênio. “Há muitos espaços abertos onde venta muito e, portanto, são ideais para instalar turbinas eólicas,” detalhou Terlouw. “Além disso, há bastante água ao redor e a situação política é estável – embora não tenhamos considerado esses dois critérios em grandes detalhes em nosso estudo. Mas, é claro, a disponibilidade de água para eletrólise também desempenha um papel, assim como a questão de se o país em questão é um do qual o hidrogênio pode ser importado de forma confiável”.

Deixando de lado esses critérios, o centro dos Estados Unidos também oferece boas condições, assim como partes da Austrália, do Saara, do norte da China e do noroeste da Europa — seja porque há muito sol para energia solar ou muito vento e espaços abertos para a construção de turbinas eólicas e, claro, das fábricas de hidrogênio. Os países industrializados da Europa Central, como a Suíça ou a Alemanha, são menos adequados para a produção de hidrogênio porque quase nenhuma terra está disponível para turbinas eólicas, e os níveis de radiação solar são relativamente baixos.

Outras regiões e países densamente povoados, como o Japão ou grandes áreas costeiras dos EUA e da China, só poderiam produzir hidrogênio a um custo comparativamente alto. “Identificamos uma certa discrepância entre regiões com alta demanda por hidrogênio e regiões com alta capacidade de produzi-lo eficientemente”, resumiu Terlouw.

Uma economia de hidrogênio teria que superar essa discrepância por meio do comércio global, mas isso requer energia adicional – bem como cooperação política. Em última análise, os requisitos de energia surgem porque o hidrogênio é geralmente transportado como um composto, por exemplo, na forma de amônia ou metanol. O volume do gás puro é muito grande, enquanto a forma líquida muito mais compacta requer resfriamento massivo.

Aproximadamente 64% dos potenciais de produção de H2 estão concentrados em áreas com escassez de água [Imagem: Tom Terlouw et al. – 10.1038/s41467-024-51251-7]

Desvantagens ecológicas do hidrogênio verde
O estudo também analisou outros efeitos colaterais ambientais de uma potencial economia de hidrogênio, que são frequentemente ignorados pelo público. “Primeiramente, é importante enfatizar que mesmo uma economia de hidrogênio funcional continuará a produzir emissões residuais de gases de efeito estufa”, disse Terlouw. O estudo coloca essas emissões residuais em quase uma gigatonelada de equivalentes de CO₂ por ano. As emissões totais estão atualmente em torno de 40 gigatoneladas. “Não será possível reduzir o impacto climático a zero”, acrescentou Christian Bauer, coautor do estudo.

Isso ocorrerá principalmente porque a produção e a distribuição de hidrogênio estão associadas com emissões de gases de efeito estufa. Por um lado, estima-se que 2,5% do hidrogênio seja liberado na atmosfera por meio de vazamentos, por meio dos quais o próprio hidrogênio atua indiretamente como um gás de efeito estufa, promovendo a formação de gases de efeito estufa potentes, como metano e ozônio.

Por outro lado, os sistemas de eletrólise apresentam as chamadas emissões incorporadas, que ocorrem durante a produção e o transporte dos materiais necessários, mesmo que os sistemas finais funcionem com eletricidade verde. “Muitos dos sistemas e máquinas usados em uma economia de hidrogênio são fabricados em países onde, no futuro previsível, sua produção dependerá amplamente de combustíveis fósseis”, relatou Terlouw.

A maioria dos painéis solares vem da China hoje em dia, por exemplo, onde a maior parte da eletricidade ainda é produzida por usinas de energia a carvão”.

Qualquer proposta que leve a sério a neutralidade em termos de clima precisa compensar essas emissões residuais capturando e removendo quantidades equivalentes de dióxido de carbono da atmosfera. Tecnologias como captura direta de ar, na qual equipamentos especiais removem CO₂ do ar, podem ser usadas para esse propósito. Ou reflorestamento, onde o plantio de árvores adicionais retém certas quantidades de carbono do ar.

Materiais críticos
De acordo com Terlouw e Bauer, outros efeitos ambientais de uma economia de hidrogênio também precisam ser levados em consideração, além de seu impacto no clima. As máquinas e sistemas usam uma variedade de materiais que são prejudiciais ao meio ambiente ou cuja produção é prejudicial ao meio ambiente.

As turbinas eólicas, por exemplo, contêm ímãs permanentes feitos de elementos de terras raras, metais cuja extração na China não atende aos padrões ambientais europeus. O catalisador usado na eletrólise PEM é o irídio, um metal considerado problemático simplesmente por ser tão raro. E as grandes quantidades de terra e água necessárias para produzir hidrogênio também podem constituir um fator ambiental negativo, ainda mais se concorrerem com a produção de alimentos.

Por último, mas não menos importante, há a grande questão da aceitação social”, aponta Terlouw. Em áreas com escassez de água, antes de ser eletrolisada a água do mar primeiro teria que ser dessalinizada, o que requer energia e terra adicionais. “As pessoas aceitarão que paisagens costeiras sejam ocupadas por grandes usinas de produção de hidrogênio, por exemplo?”. “No estudo atual, ainda não levamos esses fatores em consideração”, admite Bauer. “Mais estudos estão por vir. Queremos apontar possíveis meios de alcançar a transição energética. Se vamos prosseguir com eles, e quão rigorosamente o faremos, é, em última análise, uma questão sociopolítica”.

Bibliografia
Artigo: Future hydrogen economies imply environmental trade-offs and a supply-demand mismatch
Autores: Tom Terlouw, Lorenzo Rosa, Christian Bauer, Russell McKenna
Revista: Nature Communications
Vol.: 15, Article number: 7043
DOI: 10.1038/s41467-024-51251-7

Fonte: Inovação Tecnológica

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