Comportamento & Equilíbrio

Você sabe o que é “a lei de alienação parental”? — Parte I

Lei da Alienação Parental se baseia na ideia machista de que mulheres são vingativas

Você pensa que sabe. A grande maioria das pessoas acha que esta é uma lei que protege crianças. Foi assim que ela foi vendida. Seu lobby até hoje afirma isso. Mas o que menos importa para essa lei é a criança. Gardner, um médico generalista americano que defendia a pedofilia, cunhou esse termo “alienação parental” com pretensão de introduzir também o que chamou de “Síndrome de alienação parental”, o que nunca conseguiu pela inconsistência da tese e a falta de cientificidade.
Gardner que se dizia psiquiatra, mas nunca teve Registro na Associação Americana de Psiquiatria, e se dizia professor da Universidade de Columbia, mas apenas prestava serviço voluntário uma vez por semana na clínica da faculdade, voluntário sem vínculo empregatício, escreveu em seu livro “True and Falses accusations of child sex abuse” (Acusações verdadeiras e falsas de abuso sexual infantil, em tradução livre), Creative Therapeutics, New Jersey, 1992, sua gráfica onde editava seus próprios livros sem nunca ter passado pelos seus pares ou Academia, como é de praxe, que: “as atividades sexuais entre adultos e crianças fazem parte do repertório natural da sexualidade humana, uma prática positiva para a procriação porque a pedofilia estimula sexualmente a criança, torna-a muito sexualizada e a faz ansiar pelas experiências sexuais que redundarão num aumento da procriação”, pp. 24-5.
Além disso, Gardner propõe que muitos tipos diferentes de comportamento sexual humano, incluindo a pedofilia, o sadismo sexual, a necrofilia (sexo com cadáveres), a zoofilia (sexo com animais), a coprofilia (sexo envolvendo defecação), podem ser vistos como tendo espécies de valor de sobrevivência e, assim, terem a garantia de não serem excluídos da lista das chamadas formas naturais de comportamento sexual humano. Pp. 18 a 32.
É dele também a afirmação de que “não é o abuso sexual intrafamiliar que causa o trauma, é porque a nossa sociedade reage exageradamente à pedofilia que as crianças sofrem”. Pp. 594-5. E, “diga à criança que o abuso sexual por um pai é normal”. Pág. 572.
O elenco de “pérolas” desse Sr. é longo. E, fantasmagórico. Horripilante. Tenebroso. Como o é a sua tese de instruções para o acobertamento dos comportamentos abusivos de genitores com seus filhos. Vou poupar o leitor de mais barbarismo e crueldade. O intrigante é que, no Brasil, e só no Brasil, único País do mundo, nós temos a Lei da Alienação Parental que saiu daí. E esse guru continua vigorando.
Você sabia que o inventor do termo alienação parental escreveu estas teses em defesa da pedofilia? Certamente que não. O livro principal, são alguns porque ele escrevia não tinha nem prefácio de alguém, e ele mesmo publicava em sua gráfica, sem passar por nenhum crivo científico ou correlato, eu o possuo. Ele é raro porque foi recolhido nos Estados Unidos quando foi descoberto e denunciado pelas crianças que se tornaram adultas, que ele os tinha prejudicado com seus laudos que inocentavam os pais abusadores e acusavam as mães que haviam denunciado os abusos, conseguindo a inversão de guarda e o afastamento das mães. As vítimas dessa armação, ao completarem 18 anos, tendo sido entregues pequenas a seus abusadores, foram à Polícia e o denunciaram. Ao ser investigado pelo FBI, pelo crime de Pedofilia, tentou se matar com uma overdose de heroína. Não teve êxito, foi salvo. Então ao saber que o FBI estava chegando perto de prendê-lo, com um objeto pontiagudo ele desferiu vários golpes contra si mesmo até atingir a jugular, e sangrar até morrer. Esse é o guru da alienação parental.
Essa lei, de agosto de 2010 veio trazendo sangue em seu enunciado. Uns dias antes de ter sido votada na Câmara, morria Joanna Marcenal, cinco anos, vítima de maus-tratos de todos os tipos, cuja mãe foi acusada, fraudulentamente, de alienação parental, perdeu a guarda e foi afastada pela Juíza por 90 dias sem nenhum contato, nem telefônico. Mãe “alienadora” é tratada como sendo de altíssima periculosidade. A menina morreu nos primeiros 30 dias. Eram muitas as marcas em seu corpinho.
O Conselho Federal de Psicologia escreve que a Lei de alienação parental transforma o objeto de alegação de uma parte em punição para a outra parte. Ou seja: a acusação do pai dizendo que a mãe o está “alienando” é tratada como perniciosa e se efetiva “alienando” a mãe. A antiga justiça, que antecedeu os códigos legais, do olho por olho e dente por dente.

Joanna Marcenal, Henry Borel, Bernardo Boldrini, Isabella Nardoni e Joaquim Ponte Marques, crianças que foram mortas por quem deveria cuidar delas (Foto: Divulgação/Montagem: Jean Marangoni/Jornal Fatos & Notícias)

Dirão alguns que tem mãe que “faz alienação”. Raso pensamento manipulado por um termo, um neologismo para definir o que todos conhecemos entre casais e ex-casais que fazem dos filhos uma moeda de troca, manipulam, fazem chantagem emocional, chantagem afetiva, mentem, durante o período do luto da relação, luto pelos projetos a dois, pelo cotidiano da vida familiar, resultado da frustração dessa perda. É muito comum, principalmente, entre casais mais imaturos.
Essa lei, a 12.318/2010 levou um ano e cinco meses para ser votada como lei, teve apenas uma audiência pública, com a presença apenas do Conselho Federal de Psicologia (CFP), sem presença das associações civis, sem Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), num final de noite, ao apagar das luzes, no calor da Copa das Américas. Um jabuti eficiente.
O PL 6371/2019 pede a Revogação dessa lei da mordaça de quem denuncia abuso ou violência doméstica. Há 11 anos busca-se essa Revogação pelos estragos que vêm sendo produzidos em crianças. São mais de 20 Audiências Públicas, Nota Técnica do Conanda, pronunciamento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da ONU-Criança na pessoa de seu Presidente Luiz Pedernera, Juízes, Promotores Públicos, Defensores Públicos, Advogados, Psicólogos, 41 Deputadas Federais que subscreveram o PL, Associações Civis, Mães vítimas, Crianças que fazem apelos para serem escutadas.
Perguntas que não querem calar: quem tem essa força para manter essa lei 12.318? Sabemos quem a escreveu, por motivo pessoal. De onde vem essa garantia de desvio de propósito? Violações várias e ausência de contraditório, seriam constitucionais? Por que o ECA, que contempla toda a Proteção Integral da Criança, está sendo rasgado?

Ana Maria Iencarelli

Ana Maria Iencarelli

Psicanalista Clínica, especializada no atendimento a Crianças e Adolescentes. Presidente da ONG Vozes de Anjos.

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