O Outro como meu espelho
Por natureza, somos seres sociais, o que significa que vamos construindo nossa identidade a partir da interação com o mundo
Você já se perguntou porque algumas pessoas incomodam tanto? A resposta está no fato de que este Outro, que pode ser um familiar, um amigo, um cônjuge ou apenas alguém conhecido, esteja servindo como um espelho e, com o seu reflexo, mostrando aspectos que encontramos dificuldade em reconhecer em nós mesmos. Podemos ver, refletidos neste Outro, alguns defeitos e qualidades que possuímos. Por exemplo, se algum comportamento desta pessoa me incomoda, possivelmente esteja projetando nesta, características que representem meu mundo interior.
Mas como isso ocorre? Por natureza, somos seres sociais, o que significa que vamos construindo nossa identidade a partir da interação com o mundo. Desta experiência social são estabelecidos crenças e valores que contribuem para que criemos referências que nos sirvam de comparativos e são estas que influenciam o nosso modo de interagir e perceber as pessoas. Se existe um olhar de identificação, existe também uma linguagem e uma troca de comunicação. E é exatamente através desta comparação e deste reconhecimento do Outro que vamos nomeando a nossa realidade.
Sendo assim, se uma característica em alguém me agrada, faço inconscientemente uma comparação positiva, projetando neste, características em consonância com aquilo que de bom reconheço em mim. Por outro lado, se uma característica deste alguém me desagrada, instantaneamente a recrimino e, como um processo de defesa, projeto para fora, como um algo pertencente apenas a este Outro. Esse fenômeno se dá através da projeção, que é um mecanismo de defesa do Ego que atua através do inconsciente, fazendo com que possamos projetar fora aquilo que não aceitamos em nossa personalidade. São as nossas “sombras” e, por termos dificuldade em admiti-las, preferimos negá-las ou escondê-las.
O pai da Psicanálise, Sigmund Freud, formulou uma frase bastante interessante a este respeito: “Quando Pedro me fala de Paulo, sei mais de Pedro do que de Paulo”. Neste sentido, quando falamos de alguém, estamos revelando muito mais daquilo que somos, do que propriamente do que este Outro seja. Jung, outro grande psicanalista da época de Freud postulou a seguinte frase: “Tudo o que nos irrita nos outros pode nos levar a uma melhor compreensão de nós mesmos”.
Portanto, antes de criticar ou julgar é importante formularmos as seguintes perguntas: Por que estou me sentindo tão incomodado com o comportamento dessa pessoa? Será que o outro precisa se transformar para me deixar feliz ou eu preciso me transformar para me fazer feliz? A questão importante a ser analisada é que cada pessoa é singular e o modo de agir do Outro é unicamente dele. Não podemos mudar uma pessoa e, mesmo que isso fosse possível, o problema não seria resolvido, já que a questão não mora no discurso ou o comportamento deste.
Se algo incomoda é necessário, antes, identificarmos esse gatilho para que assim seja possível descobrirmos o real motivo do desconforto que fora acionado em nós. Lembrando que o nosso domínio está apenas em controlar aquilo que somos e se algo precisa ser mudado, precisamos começar a mudança a partir de nós mesmos. Analisando e compreendendo, no campo das relações, quem somos e como se estabelece a dinâmica destes encontros é que poderemos desenvolver nossa consciência e maturidade emocional. Desta forma, vamos adquirindo mais liberdade e, consequentemente, a vida vai se tornando mais leve e as convivências mais agradáveis.