Olhar tem mesmo um brilho diferente quando estamos mais felizes
Não é apenas impressão sua. Quando você está muito feliz, o olhar realmente fica diferente e aquele brilho que até então muita gente achava que não passava de uma impressão, é verdadeiro. Os olhos, de fato, entregam momentos de alegria e satisfação.
Segundo Emerson Arcoverde, psiquiatra do Hospital Onofre Lopes, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Huol/UFRN), pertencente à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Rede Ebserh), o brilho no olhar vai muito além de uma expressão popular. “Serve de maneira fidedigna como auxílio para a expressão, assim como para acessarmos as emoções mais simples ou mais complexas”, diz.
Esse brilho diferente acontece especialmente quando se alinha a ativação cerebral com a motivação interna, de acordo com o neurocientista Fernando Gomes, do Hospital das Clínicas de São Paulo. É como se o circuito cerebral do prazer se conectasse imediatamente à tarefa que está sendo desempenhada.
“O olhar é mais vinculado pelo sistema límbico, que é a parte emocional do cérebro. Quando se gosta muito de uma atividade, no momento da execução, vem naturalmente um brilho no olhar. Quando há a possibilidade de fazer algo que se gosta, há esse brilho, sim”, diz Gomes.
Ainda de acordo com o neurocientista, há também uma ativação do sistema nervoso autônomo, que propicia a lubrificação dos olhos com a lágrima, por isso se dá o brilho no ar.
“Há um conjunto das expressões faciais que fazem esse sentido. As ativações musculares, principalmente do terço superior da face, transmitem o foco, o contentamento, que são capazes de serem lidos. É como se olhasse mesmo para dentro do cérebro e ativasse o circuito do prazer. O hormônio da dopamina, que é do prazer, também é acionado em uma tarefa que dá esse prazer”, diz.
Além da dopamina, o cérebro ainda reage liberando serotonina e adrenalina, que são ativadas no estado de contentamento.
“Os olhos e a comunicação facial revelam 100% do que uma pessoa sente. As palavras ditas nem sempre são exatamente o que querem dizer, mas os olhos e a expressão fácil não conseguem mentir”, revela Gomes.
Segundo o psicólogo Ronaldo Coelho, especialista em psicologia institucional pela Universidade de São Paulo (USP), a sensação de satisfação faz com que o olhar fique lânguido, frouxo. Mas é diferente de quando estamos tristes ou cansados. “Quando a pessoa apresenta uma mescla dessas duas expressões, interesse e satisfação, concluímos que ela está feliz. O nosso olhar fica mais ‘à mostra’ e o efeito de ‘brilho nos olhos’ entrega o ouro”, diz.
É possível reconhecer os sentimentos pelo olhar
A liberação de substâncias por parte do cérebro e a movimentação da musculatura na face acabam, de fato, entregando exatamente o que estamos sentindo. Segundo Coelho, é exatamente isso que permite que, na maioria das vezes, as pessoas acertem o tipo de emoção que você está lidando em um determinado momento.
“Nós aprendemos a interpretar as reações físicas do corpo de uma maneira que costuma ser bem próxima da emoção que a pessoa está sentindo. Isso é tão certo que, por vezes, é mais fácil uma outra pessoa perceber nosso sentimento que para nós está difícil de reconhecer”, explica.
As emoções são o que modulam a vida e as relações de uma pessoa. “Fazer uma boa leitura do que o outro está sentido, como ele está naquele momento, será fundamental para sabermos como vamos nos colocar na relação com ele”.
E nossos olhos são os que mais entregam os efeitos das sensações que experimentamos. “Mesmo quando tentamos disfarçar, nossos olhos podem, ainda, entregar que estamos disfarçando”, revela Coelho.
Ainda segundo o psicólogo, comunicar as emoções numa fração de segundos somente pelo olhar passa a ser essencial quando, por exemplo, é preciso decidir se vai fugir ou lutar em uma situação em que o outro mostra estar disposto a isso. Essa comunicação também ajuda a se aproximar quando há a identificação de atração sexual mútua.
Sinais são involuntários
Engana-se quem pensa que pode controlar o que está sentindo. Coelho explica que as emoções da pessoa são os sinais de interesse e satisfação que o corpo produz involuntariamente.
“Quando estamos muito interessados, a nossa pupila dilata, o olho tende a se lubrificar mais e nosso olhar tende a repousar por mais tempo sobre o que nos interessa”, diz.
O brilho no olhar que uma pessoa tem quando está feliz é um desses exemplos. “Estar feliz tem a ver com experimentar um profundo interesse, seja por uma pessoa, uma coisa, uma atividade, a própria vida, somado à sensação satisfação”, ressalta o psicólogo.
Tristeza também é entregue no olhar
E como o olhar é mesmo a janela da alma, sentimentos de tristeza, raiva ou vergonha também ficam claros. Até Charles Darwin chegou a falar do assunto no livro ‘Expressão das Emoções nos Homens e nos Animais’, publicado originalmente em 1872. Nele, ele define os “músculos da melancolia”, e a musculatura ao redor dos olhos é responsável pela expressão fechada e pesada, característica em pessoas melancólicas.
“Desde este período, a expressão fechada em pessoas não somente entristecidas, mas deprimidas, tem chamado atenção para a relação da expressão com as diferentes emoções. A expressão característica de enrugamento da testa ou olhar fechado são exemplos da importância do olhar até na procura de sintomas depressivos”, ressalta Arcoverde.
Segundo ele, a influência do olhar na expressão das emoções é tão certa, que testes para avaliar reconhecimento de emoções se baseiam apenas na observação da região dos olhos. “Parece existir um reflexo de como estamos emocionalmente na expressão facial, particularmente ao redor dos olhos, e nossa expressão facial reforça tais emoções. Baseado nisso, um dos tratamentos propostos atualmente como ajuda em casos de depressão maior é a aplicação de toxina botulínica na musculatura da fronteira, mesmo protocolo utilizado para impedir a contratura muscular e, consequente, enrugamento da testa”, diz ele.
Ainda segundo o psiquiatra, o tratamento consiste em tentar eliminar a expressão pesada caracterizada pelo enrugamento presente no olhar nos deprimidos, para que se reverta o reforço que esta expressão pesada tem sobre as emoções negativas e sintomas depressivos.
Fonte: UOL