Geral

Da segurança pública à segurança humana

Um caminho possível a partir da Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS) e do Sistema Único de Segurança Pública (Susp)

Café Coado, com Gracimeri Gaviorno

As sociedades modernas são marcadas pelo reconhecimento da sua composição diversificada não apenas em relação a cor, etnia, sexo, gênero, condições socioeconômicas, mas, também, por diferentes posições que envolvem interesses, valores, questões religiosas e ideológicas. Tamanha diversidade acaba, por vezes, gerando alguns conflitos. Para tratar desses conflitos, temos a coerção e a política.

A coerção é sempre a forma mais custosa de resolução. Além do emprego de recursos, possui um custo político, considerando que transforma o indivíduo em transgressor subjugado. Por outro lado, a política, em sua definição mais primitiva, como forma de resolução pacífica dos conflitos, seria a mais desejável, trazendo a negociação como possibilidade e a resignação como resultado.
Mas vamos falar de política pública, como intervenção em uma questão, um problema ou um conflito, que é selecionado para entrar na agenda pública.

Dessa forma, o Estado é levado a reunir esforços para responder a uma insatisfação social. Algumas vezes a insatisfação é transitória e contingente. Outras, tem natureza complexa e permanente. A Segurança é, nesse contexto, uma política pública e assim dever ser compreendida. O Estado seleciona a intranquilidade social como uma questão relevante para estar na agenda pública. Sua natureza complexa e não transitória faz com que a insegurança como problema e a segurança como política pública estejam de forma permanente na agenda pública.

Há algum tempo a pauta tem reclamado atenção dos parlamentares e gestores públicos, e não é por acaso que tem feito parte cada vez mais dos processos eleitorais. Mas não pode ser esquecida nos intervalores desses processos.
Para entender como a segurança tem sido tratada no Brasil, é importante registrar que apenas em 1997, no Governo Fernando Henrique, foi criada a Secretaria Nacional de Segurança Pública. De lá para cá, tivemos significativos avanços, é verdade. Mas considerando a latente insatisfação social, revelada, inclusive, pela escolha de profissionais de segurança nos processos eleitorais, é preciso trazer respostas efetivas para esta reclamação social.

A pauta dos direitos humanos foi fundamental para discutir de forma mais profissionalizada a segurança pública. No Brasil, a partir da reforma democrática ocorrida com a Constituição de 1988, a opção política de tratar o infrator como sujeito de direitos desencadeou ações necessárias nas instituições públicas e nos movimentos legislativos. Nosso grande desafio, porém, consiste na busca de soluções para dar respostas às vítimas sem violar os direitos humanos dos infratores e de promoção da tranquilidade social com ações que torne efetiva a prevenção criminal.

Não podemos fechar os olhos para um conflito instalado entre o que popularmente se convencionou chamar de “direitos dos manos” e os direitos das pessoas de bem. Opa, mas os direitos humanos devem existir para todos! E é exatamente neste ponto que a sociedade não tem se sentido representada, gerando uma insatisfação das vítimas — diretas, indiretas ou potenciais — da insegurança pública.

Não podemos separar os “Direitos Hu-manos”. O caminho para a conciliação deve ser trilhado para fortalecer a segurança e restabelecer a tranquilidade pública ou levá-la, pelo menos, a níveis aceitáveis. Um caminho viável passa por considerar os diversos atores que devem ser envolvidos na discussão. Vamos agrupá-los aqui em quatro tipos.

Tomando como base o artigo 144 da Constituição Federal, identificamos um primeiro grupo formado pelos órgãos de segurança: federais, estaduais e municipais, incluindo as guardas municipais e as polícias penais e, embora ainda não destacadas constitucionalmente, as polícias técnico-científicas, que caminham para a autonomia e reconhecimento constitucional.

Num segundo grupo, podemos identificar o sistema de justiça, formado pelo Poder Judiciário, Pelo Ministério Público e também pela advocacia, tão necessária ao equilíbrio da justiça.

Num terceiro grupo, ainda timidamente reconhecido, estão os organismos ligados à segurança privada. Com seus recursos humanos e tecnológicos, tem crescido em apoio à tranquilidade pública. Por fim, num quarto grupo, trazemos a importante participação dos atores ligados às necessidades mais fundamentais para uma vida digna em sociedade. Aqui estão incluídos a família, as igrejas, as comunidades, os profissionais, os conselhos e os movimentos ligados ao sistema de segurança e de justiça, às questões de etnia, de idade e de gênero, à educação, à saúde e à cultura, ao esporte e ao lazer, além daqueles ligados à geração de emprego e renda, todos eles podendo ser considerados recortes dos direitos humanos.

Compreendendo essa atuação multifacetária, nos aproximamos do entendimento do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) que faz um reposicionamento da Segurança Pública para a Segurança Humana, considerada como um dever do Estado e direito de todos. No entanto, o conceito de Estado envolve os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, além da sociedade civil organizada e a iniciativa privada e os cidadãos. A responsabilidade compartilhada é uma das recomendações do estudo que o UNODC apresentou em 2011, no seminário “Gestão da Segurança Pública do Distrito Federal e Entorno”.

Nesse caminho trilhou a Lei nº 13.675/2018, com a criação da Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS) e instituição do Sistema Único de Segurança Pública (Susp). E este é o tema do Simpósio de Inteligência que acontecerá nos dias 17 e 18 de novembro no Auditório do Parque Botânico da Vale. O evento, que está na sua 14ª edição, é promovido pela Rede Capixaba de Inteligência com a apoio do Espírito Santo em Ação. Estima-se um público de duzentos participantes entre as forças de segurança e de justiça e também da sociedade civil. Um típico exemplo de aplicação do sistema Único de Segurança Pública.

Finalizamos o Café Coado desta semana com um convite aos leitores para participar do evento e discutir o assunto de forma qualificada. As inscrições podem ser feitas pelo link https://bit.ly/xiv_simpósio_RCI .

Se você quiser nos enviar uma mensagem, utilize o e-mail: colunacafecoado@gmail.com.

Gracimeri Gaviorno
Delegada de polícia; mestre e doutora em direitos fundamentais; professora; Instrutora e mentora profissional para lideranças
E-mail: colunacafecoado@gmail.com

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