Política

Democracia relativa — Parte1

No Brasil as coisas estão invertidas e, usando um ditado muito popular, “é o poste mijando no cachorro”, literalmente

Um amigo do meu trabalho sempre comenta que no Brasil as coisas estão invertidas e, usando um ditado muito popular, ele diz: “é o poste mijando no cachorro”. O Brasil de ponta cabeça, ou de cabeça para baixo. Nesse contexto, a última notícia divulgada na mídia deixa qualquer estagiário de Direito extremamente confuso, bagunçando na cabeça dele todos os conceitos de Direito Internacional ensinado na sala de aula.
Recentemente o ex-presidente Jair Bolsonaro foi intimado pelo Supremo Tribunal Federal para prestar informações e explicar o motivo pelo qual dormiu na Embaixada da Hungria por duas noites. Indiretamente salta aos olhos a acusação de que ele estaria buscando asilo político, com medo de ter um mandado de prisão expedido contra a pessoa dele.

Esta decisão judicial fere de morte a Constituição Federal, o Direito Internacional e as Leis brasileiras. É que o direito internacional reconhece que a Embaixada é protegida por lei, sendo considerada inviolável, de modo que a justiça brasileira não tem jurisdição sobre aquele espaço territorial. O mesmo acontece com as aeronaves e embarcações que estão a serviço de países estrangeiros.

Os artigos 22, 24, 27, 29 e 30 da Convenção de Viena de 1961, sobre Relações Diplomáticas, que foi homologada no Brasil pelo Decreto nº 56, de 08/06/1965, explicam que os locais, documentos e correspondências das missões diplomáticas são invioláveis, não podendo ser objeto de busca, requisição, embargo ou medida de execução. A mesma inviolabilidade também funciona para os agentes diplomáticos e suas residências particulares, como parte de sua imunidade.

Desse modo, a Convenção de Viena de 1961 estabeleceu para seus signatários o princípio da inviolabilidade, que define que autoridades do Estado local não podem ingressar na missão diplomática sem autorização do chefe da missão.
Recentemente foi divulgado na imprensa que o Supremo Tribunal Federal intimou Jair Bolsonaro para explicar o motivo de ter permanecido por duas noites na Embaixada da Hungria. Essa informação foi divulgada na mídia pelo jornal americano The New York Times, que teve acesso às imagens do interior da Embaixada, mostrando o trânsito e a permanência de Jair Bolsonaro no local.

Aqui entra o grande problema: é que o Supremo Tribunal Federal não pode usar essas imagens dentro de um processo qualquer, porque elas foram obtidas de forma ilegal, pois violaram o domicílio da Embaixada. Qualquer profissional do Direito sabe que a violação do Domicílio acontece não somente quando alguém adentra fisicamente no local, mas também obtendo por meio ilícito as imagens de sistema de videomonitoramento. Um exemplo disso é que a Polícia e a acusação não podem usar como prova, sem autorização judicial, as imagens do interior de uma residência.

No caso da Embaixada, envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro, não existe autorização judicial, provavelmente não existe autorização do Chefe da Embaixada (o Inquérito Policial é sigiloso e nem mesmo a defesa de Jair Bolsonaro tem acesso à integra do Procedimento Persecutório), bem como não pode existir autorização judicial, porque, como dito antes, a Embaixada não está sob jurisdição da justiça brasileira.

Aí reside o grande absurdo, porque até mesmo um juiz substituto do interior de Costa Marques/RO (usei esse exemplo porque quase foi a minha realidade) sabe que as imagens divulgadas pelo jornal The New York Times são ilegais e não podem fundamentar nenhuma decisão ou processo judicial.
Verdadeiramente é ou não é “o poste mijando no cachorro”?

Márcio Greik

Márcio Greik

Delegado Federal

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