Economia

BC de Galípolo está prestes a subir os juros para o maior nível em 19 anos

Gabriel Galípolo, presidente do Banco Central: indicado de Lula chefia equipe que deve levar a Selic ao maior nível em 19 anos

Por Vandré Kramer

Em sua terceira reunião sob o comando de Gabriel Galípolo, indicado de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o Banco Central está prestes a elevar a taxa básica de juros (Selic) para o maior patamar em 19 anos. A Selic — hoje em 14,25% ao ano, nível mais alto desde 2016 — será anunciada pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) no fim da tarde desta quarta-feira (7), após dois dias de reunião. A expectativa predominante indica uma alta de meio ponto percentual, que levaria a taxa de juros para 14,75% ao ano.
A última vez em que a Selic atingiu esse ponto foi em julho de 2006, ainda no primeiro mandato de Lula, quando Henrique Meirelles chefiava o BC. Mesmo que a Selic suba apenas 0,25 ponto nesta quarta, chegando a 14,5%, já alcançará o maior nível em 19 anos.

Seria uma situação constrangedora para o presidente da República, que passou a primeira metade deste terceiro mandato criticando a política de juros do BC sob Roberto Campos Neto, antecessor de Galípolo, que foi indicado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL).

Reportagem da Gazeta do Povo mostra que em diversas ocasiões parlamentares alinhados a Lula criticaram Campos Neto por elevar a taxa de juros, mas estão em silêncio diante da continuidade do aperto monetário sob Galípolo.

A expectativa de aumento se justifica pelo que o Copom comunicou após o último encontro, em meados de março. Na ocasião, o colegiado sinalizou que, “em se confirmando o cenário esperado”, faria “um ajuste de menor magnitude” na reunião seguinte. Dessa forma, uma eventual decisão de não elevar a Selic tende a provocar ruídos no mercado financeiro, reacendendo dúvidas sobre a independência de Galípolo no cargo. Vem do governo que o indicou, aliás, uma das fontes de pressão sobre a inflação que o BC precisa combater: uma série de medidas de cunho populista que pode colocar cerca de R$ 150 bilhões na economia até 2026, elevando a demanda por produtos e serviços.

Cenário para definição da Selic envolve riscos internos e externos
Analistas consultados pela Gazeta do Povo destacam que o cenário econômico apresenta riscos tanto no ambiente interno quanto no externo. Um dos principais focos de preocupação é a inflação. Na segunda-feira (5), os contratos de opções negociados na B3 apontavam probabilidade de 74,8% de aumento de 0,5 ponto. O consenso entre bancos, corretoras e consultorias também sinaliza para a elevação da Selic a 14,75% ao ano, que representaria o possível encerramento do ciclo de alta nos juros iniciado em setembro, de acordo com o boletim Focus, publicado nesta segunda (2).

Há, entretanto, quem projete um ajuste maior. A Suno Research, por exemplo, considera como cenário-base um aumento de 0,75 ponto percentual nesta reunião, com a possibilidade de um ajuste menor, de 0,5 ponto. “O risco fiscal, medidas de estímulo e, principalmente, a desancoragem das expectativas de inflação em relação à meta mantêm um cenário desafiador para o BC”, afirma o economista-chefe, Gustavo Sung.

Inflação em desaceleração, mas ainda distante da meta
Um dos principais fatores a pesar na decisão do Copom é a inflação, medida pelo IPCA. Embora as projeções para 2025 tenham apresentado leve revisão para baixo no Boletim Focus — marcando a terceira queda consecutiva nas expectativas — a inflação ainda se encontra mais de um ponto acima do teto da meta estabelecida. A expectativa para este ano é de 5,53%, segundo o último Focus.

A redução nas projeções inflacionárias sinaliza maior confiança do mercado na condução da política monetária, trazendo alívio para os agentes econômicos. A percepção de maior controle sobre os preços gera efeitos positivos no mercado financeiro, beneficiando investidores e empreendedores. Contudo, o processo de desinflação ainda é incipiente e vulnerável. A inflação segue pressionada e acima do limite superior da meta, mesmo em itens menos voláteis. A inflação de serviços permanece resiliente, sustentada por um mercado de trabalho ainda aquecido. Fatores como o aumento das tarifas de energia elétrica e medidas de estímulo governamental podem exercer pressão adicional sobre os preços.

O desafio do BC ao definir a taxa Selic: equilíbrio entre inflação e crescimento
A combinação de inflação em desaceleração, mas ainda elevada, e a Selic em patamares restritivos apresenta um dilema clássico para a autoridade monetária: como garantir a convergência da inflação para a meta sem prejudicar excessivamente setores sensíveis ao crédito. A Selic em 14,75% representa uma das taxas reais mais altas do mundo, o que afeta o investimento produtivo e a capacidade empreendedora.

O ambiente econômico apresenta incertezas crescentes. No cenário externo, a deterioração das relações comerciais internacionais, especialmente entre EUA e China, gera preocupações. Essa instabilidade pode elevar custos globais e afetar a taxa de câmbio. A XP Investimentos ressalta que o cenário global se tornou mais incerto após eventos recentes, embora tendências como a possível recessão americana e um dólar mais fraco possam contribuir para a desinflação.
No cenário doméstico, a atividade econômica mostra-se resiliente, com o mercado de trabalho aquecido. Adicionalmente, as novas medidas de estímulo anunciadas pelo governo podem fortalecer a demanda interna, potencialmente exigindo maior rigor na política monetária.

Estratégia de comunicação: flexibilidade para responder a cenários em mudança
Diante da elevada incerteza, analistas indicam que o Copom provavelmente optará por não se comprometer formalmente com a magnitude de ajustes futuros em seu comunicado pós-reunião. Essa estratégia assegura maior flexibilidade para responder a mudanças no cenário econômico, preservando a autonomia técnica da autoridade monetária.

Manter as “portas abertas” no comunicado não significa, necessariamente, o encerramento do ciclo de alta dos juros. A Associação Brasileira de Bancos Comerciais (ABBC) e a XP Investimentos acreditam que o fluxo de notícias levará o Copom a fazer um último ajuste no próximo mês, que pode ser de 0,25 ou 0,5 ponto percentual. A Suno Research considera prudente manter o cenário de junho em aberto.

Os analistas destacam a importância de o BC monitorar atentamente a evolução dos principais indicadores, condicionando suas decisões à trajetória da inflação, do hiato do produto e dos impactos da taxa de câmbio. Seria pertinente, segundo a ABBC, que o Copom apresentasse uma avaliação preliminar dos potenciais efeitos de choques externos, explicitando os canais de transmissão.

Os efeitos da alta na taxa Selic para empresas e consumidores
A expectativa de desaceleração da inflação e a sinalização de um possível fim do ciclo de alta têm impacto direto no comportamento dos agentes econômicos. Para empresas endividadas, isso pode abrir espaço para renegociação e planejamento de novos investimentos. Juros mais estáveis e inflação sob controle tendem a reduzir o custo de capital, favorecendo decisões de investimento e alongamento de passivos.

No entanto, a manutenção de juros elevados continua sendo um obstáculo para uma retomada mais robusta em setores sensíveis ao crédito, como o varejo e a construção civil. Por outro lado, a esperada desaceleração da inflação e a recuperação gradual do poder de compra das famílias beneficiam o setor de serviços, incluindo atividades como alimentação fora do lar e turismo.

Fonte: Gazeta do Povo

Luzimara Fernandes

Luzimara Fernandes

Jornalista MTB 2358-ES

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