A necessária discussão sobre a reindustrialização do Espírito Santo

Países desenvolvidos possuem políticas específicas para o setor industrial, sendo necessário o estabelecimento de metas de longo prazo
Por Robson Valle

A questão da desindustrialização brasileira não é recente, recua a pelo menos quatro décadas. Sua retração em relação ao setor de serviços e do agronegócio é evidente e prejudicial para o país, em virtude de ser a indústria o setor onde conteúdo tecnológico e capital é agregado de forma intensiva. Desta forma, exige demanda de trabalhadores altamente capacitados e serve como âncoras para o desenvolvimento onde se instalam. A política do governo federal para este setor, intitulada por Nova Indústria Brasil (NIB), prevê investimentos de aproximadamente R$ 300 bilhões de reais até 2026, além de financiamentos para o setor. Falar em reindustrialização para este setor faz todo o sentido.
Burocracia excessiva e alta carga tributária são outros fatores que comprometem a vitalidade e dinamismo deste setor
Países desenvolvidos possuem políticas específicas para o setor industrial, sendo necessário o estabelecimento de metas de longo prazo. No caso brasileiro seria necessário considerar a “curva de aprendizado” adquirida nas últimas décadas, como a ineficácia da política dos “campeões nacionais”, eliminação de subsídios para setores industriais ineficientes e alinhamento de uma política industrial com maior abertura ao comércio exterior, estimulando sempre concorrência e mecanismos rigorosos de “compliance”. Burocracia excessiva e alta carga tributária são outros fatores que comprometem a vitalidade e dinamismo deste setor.

Também não se pode discutir uma política industrial de longo prazo sem considerar temas como insegurança jurídica, dirigismo estatal e infraestrutura precária, nos modais logísticos. Soma-se a isso a necessária formação de capital humano qualificado para esse ambiente, onde inovação, meritocracia e empreendedorismo andam de mãos juntas.
O Espírito Santo está bem posicionado para esse debate, em virtude de suas características geográficas e sua vocação natural para o comércio exterior. A existência de incentivos fiscais é importante, como a inserção na área da Sudene e mecanismos como o Invest-ES, entretanto, o estabelecimento de metas de longo prazo deveria priorizar lições básicas que apresentam resultados a bastante tempo.
São exemplos a agroindústria de papel e celulose integrada a um terminal portuário próximo (Aracruz), siderúrgicas acopladas a portos de exportação (Serra) e, recentemente grandes agroindústrias de café solúvel (Linhares), próximas de um novo porto em seu município vizinho (Aracruz). Isto sem citar o setor de mármore e granito, no sul do Estado, que será beneficiado pela expansão portuária contratada para aquela região.
Isto sinaliza que nossa reindustrialização do Espírito Santo passa por uma integração com sua vocação para o comércio exterior, que é diversificada e ligada aos aspectos geográficos e recursos de cada região. Expectativa semelhante aconteceria na região de Conceição de Barra, onde a exploração de sal-gema para fins industriais poderia beneficiar e ser beneficiada por um projeto portuário de grande porte em São Mateus.

Em Vila Velha, a proximidade com o porto de Vitória apresenta reais condições para que as empresas de Química Fina (cosméticos, p.ex.) ali instaladas, ganhem escala em projetos industriais de maior porte. Esse fato seria favorecido pela sua proximidade também com Cariacica, um polo logístico estratégico no Estado, com significativos investimentos em condomínios logísticos e centros de distribuição.
Outra característica interessante é do setor de petróleo e gás aqui instalado. Já existe o setor portuário específico, em vários pontos do Estado, entretanto, não temos ainda uma indústria petroquímica integrada a estes terminais. Até pouco tempo atrás (2015), existiu a expectativa de uma unidade de produção de fertilizantes e outros produtos químicos (metanol, melamina, dentre outros) a partir do gás natural, em Linhares (definido pela Petrobras como UFN-IV), contudo por razões diversas, não prosperou. Ainda assim, existem especulações de projetos ligados a este setor, como a produção de combustíveis em refinarias modulares em Jaguaré, pelo setor privado.
Além disso, é necessário inserir a questão ambiental neste debate e a falsa dicotomia entre desenvolvimento e destruição do meio ambiente. No passado, previsões catastrofistas ocorreram durante a introdução do eucalipto, inicialmente em Aracruz, e que não ocorreram. De fato, a questão ambiental faz parte de um conjunto de interesses que são de fato, inegociáveis, pela nossa sociedade. E isto se reflete na elaboração de qualquer projeto industrial com documentos fundamentais como EIA/RIMA e licenças ambientais (LI, LO e LP).
O programa Nova Indústria Brasil até possui alguns aspectos positivos, quando apresenta a intenção de incentivar investimentos em P&D e suporte financeiro para modernização de equipamentos, ainda assim o cerne de uma política industrial sustentável deve mirar sempre o longo prazo. Neste aspecto é imprescindível equacionar a grave questão fiscal das contas públicas da União, para que taxas de juros possam convergir para valores que permitam a atratividade de investimentos industriais (p.ex., a TIR), de todos os portes.
O Espírito Santo possui inúmeras possibilidades para uma reindustrialização sustentável, para que sua população prospere. O setor industrial sempre que se consolida em uma região, se torna grande impulsionador de seu desenvolvimento, porém isto não pode se dar por políticas de subsídios de curto prazo, ignorando condições estruturantes da economia no longo prazo. O país já testou políticas neste sentido no passado recente, com resultados conhecidos. Cabe a nós o posicionamento no novo ciclo político que se inicia em 2026, para que nossas escolhas se traduzam em reais condições de desenvolvimento econômico e social para o povo capixaba.
Robson Valle
Engenheiro químico, vice-presidente da Associação Profissional dos Químicos do ES (Aproquimes)
Página pessoal: https://rvalle.com.br/eqes/