Sítio arqueológico maia de três mil anos retrata o cosmo e a ‘ordem do universo’

Novo estudo sugere que sítio arqueológico maia de 3.000 anos no México era antigo cosmograma que representava a “ordem do universo”
Por Éric Moreira
Um estudo recente revela que o sítio arqueológico de Aguada Fénix, com três mil anos de idade, representa um enorme mapa urbano que ilustra a “ordem do universo” segundo a perspectiva dos antigos maias. Localizado na região sudeste do México, este local é descrito como um cosmograma, uma representação simbólica da visão cosmológica de seu povo.
Aguada Fénix é considerada a “arquitetura monumental mais antiga e maior da área maia”, superando em tamanho muitas cidades antigas da Mesoamérica, conforme descreve o estudo. Segundo os pesquisadores, embora a construção tenha demandado um esforço considerável, sua relevância cultural parece ter motivado a participação voluntária da comunidade, sugerindo que seus construtores não foram forçados a trabalhar.
Essa construção pode ter sido um evento comunitário celebrativo para os antigos habitantes, similar ao que se acredita ter ocorrido com Stonehenge na Inglaterra pré-histórica. Os autores do estudo, publicado na revista Science Advances em 5 de novembro, indicam que esses “grandes eventos de construção e rituais coletivos também podem ter envolvido banquetes, troca de mercadorias entre diferentes grupos e oportunidades de encontrar parceiros, o que provavelmente forneceu incentivos adicionais para as pessoas se reunirem”.
Aguada Fénix remonta a 1050 a.C., antes da invenção do sistema de escrita maia, o que significa que não existem registros escritos sobre o local. O sítio foi abandonado por volta de 700 a.C. e foi objeto de investigação entre 2020 e 2024, onde não apenas escavações foram realizadas, mas também foi empregada tecnologia de lidar (detecção e medição por laser) para mapear a paisagem.
A análise revelou que o cosmograma foi construído através de uma complexa rede de estruturas que incluem canais, estradas elevadas e uma represa. Esses elementos se entrelaçam formando uma série de cruzes. A dimensão do cosmograma, com 9 por 7,5 quilômetros, é comparável ou até superior à das cidades mesoamericanas posteriores, como Tikal e Teotihuacan.
No centro da estrutura, existe um conjunto de pequenos edifícios e plataformas conhecido como “grupo E”, contendo depósitos enterrados com objetos possivelmente cerimoniais, como ornamentos em pedra verde representando um crocodilo e uma ave, além de vasos cerâmicos e pigmentos. Embora um pequeno lago fornecesse água para os canais, os arqueólogos observaram que a imensidão do cosmograma em comparação ao tamanho do lago tornaria difícil manter os canais preenchidos por longos períodos. Ademais, não foram encontradas evidências de irrigação agrícola nos canais, sugerindo que eles não eram utilizados para cultivo.

O cosmograma permaneceu incompleto no momento em que o local foi abandonado em 700 a.C., com algumas das vias aquáticas nunca finalizadas. A pesquisa também indicou a ausência de sinais de hierarquia social em Aguada Fénix — diferentemente de outros sítios maias posteriores como Tikal e Copan, onde evidências apontam para uma estrutura social rígida.
Os pesquisadores estimaram que mais de mil pessoas foram necessárias para erguer Aguada Fénix. É provável que “figuras de liderança, que possuíam habilidades especializadas e conhecimento de observações astronômicas e cálculos calendáricos”, escreveram os autores do novo estudo.
A interpretação completa do significado do cosmograma é desafiadora devido à falta de registros escritos da época. Contudo, Takeshi Inomata, professor de arqueologia na Universidade do Arizona e principal autor do estudo, sugere que o movimento solar está refletido em seu design. Ele afirma ao Live Science que os antigos habitantes “provavelmente pensavam que o universo estava ordenado de acordo com os eixos norte-sul e leste-oeste”. O eixo leste-oeste estaria “ligado ao movimento do sol e provavelmente também estava relacionado à passagem do tempo”.
Além disso, os construtores alinharam Aguada Fénix em relação à direção específica do nascer do sol, conectando-se ao ciclo ritual de 260 dias que se tornaria crucial para os maias e astecas posteriores. “Então, provavelmente, eles acreditavam que as ordens do espaço e do tempo estavam interligadas”, afirma Inomata.
Questões
Reações da comunidade acadêmica foram diversas. Michael Smith, professor de arqueologia na Universidade Estadual do Arizona, expressou ceticismo quanto à caracterização do local como um “cosmograma”, pedindo definições mais claras. Em contrapartida, David Stuart da Universidade do Texas elogiou a pesquisa como uma descoberta significativa respaldada por análises rigorosas: “considero esta uma descoberta importante, fruto de uma análise muito cuidadosa e meticulosa por Takeshi e sua equipe”.
Outros acadêmicos também reconheceram o valor dos achados, apontando que os depósitos encontrados no grupo E corroboram as teorias propostas pela equipe. James Aimers da Universidade Estadual de Nova Iorque destacou que o aspecto mais relevante da pesquisa reside no entendimento de que essa monumentalidade foi construída coletivamente ao invés de sob ordens de governantes poderosos.
Para mim, a afirmação mais importante do artigo é que toda essa monumentalidade foi construída coletivamente, e não sob a direção de governantes poderosos”, afirma em e-mail ao Live Science. “Isso está em consonância com muitas novas interpretações que enfatizam a ação coletiva em vez da hierarquia na Mesoamérica”.
Fonte: Aventuras na História
















