Comportamento & Equilíbrio

Misoginia: a disputa perversa pela Maternidade — Parte I

Pensando na misoginia, praticada por mulheres que odeiam mulheres, pretendo aprofundar essa reflexão, tão complexa e delicada e fazer seu link com a disputa perversa na maternidade

Para os homens, ter filhos nunca é um projeto de vida. Muito mais frequente é o plano de ter um milhão de reais aos 30 anos. Às vezes, a moeda é a outra, parece que aumentando o desejo de Poder. Desejos de ser um grande e poderoso profissional, também aparecem. Hoje este desejo é atropelado pelas recentes ocupações cibernéticas, que aparentam Poder financeiro, pouca ou nenhuma necessidade de leitura ou de aquisição consistente de conhecimento.
O desejo de ter filhos fica restrito às mulheres. Mas, agora, ele permanece escondido, como se fosse vergonhoso. O maior lugar de desejo é reservado, também, às profissões cibernéticas, acreditadas como o grande futuro. Ser “influenciadora” é uma meta. Não precisa de muito esforço, e é viralizado como muito promissor, com um apelo narcisista bastante forte, e que também não precisa de nenhum estudo.

O exibicionismo foi transformado em valor positivo. Tudo é exposto, principalmente as opiniões ácidas e os símbolos de riqueza. Entre meninas e, também, meninos que cultuam o próprio corpo. Mas, para além da exposição e adoração de corpos, temos a possessão deles. A Pulsão de Apoderamento, conceito traçado por Freud, em 1908, e por ele referido até 1920, pode nos ajudar a compreender a questão da perversão, presente na violência endêmica do nosso tempo atual. Pensando na Misoginia, praticada por mulheres que odeiam mulheres, pretendo aprofundar reflexão, tão incongruente, complexa e delicada, e seu link com a disputa perversa na Maternidade. Apesar da grande dificuldade, não me furtarei a essa pretensão arriscada. Sei que irei desagradar muitas. Na próxima semana, nos debruçaremos sobre esse Conceito Psicanalítico, a Pulsão de Apoderamento, pouco conhecido ao lado dos conhecidíssimos conceitos da Pulsão de Vida, a sexual, e da Pulsão de Morte, formuladas por Freud.

(Foto: Reprodução internet)
(Foto: Reprodução internet)

Os corpos de Mulheres e Crianças dão a impressão que podem ser acessados, livremente, por “Senhores Feudais”. Estupros em profusão, assassinatos também. Os números, subnotificados todos sabem a razão, são alarmantes. No Brasil, são quatro Feminicídios a cada 24 horas, e um estupro a cada oito minutos, em meninos, meninas e mulheres, com concentração maior até os 14 anos, perfazendo cerca de 192 estupros a cada 24 horas. Mas “influenciadores” judiciais contabilizam tudo na sacola da Mãe louca, e Criança mentirosa. Já chegaram até a afirmar que 80% das denúncias de abusos sexuais intrafamiliares são falsas. Fica a pergunta: qual o tapete que encobre os 192 estupros por dia? Para onde vão? A Misoginia, em sua maioria de mulheres, patrocina essa conta que não fecha.

Mas se os “influenciadores” manobram a vida de multidões, o algoritmo é o imperador de todos. Ele decide. Ele conduz. Ele, sem ter estudado, assalta seu tempo. Mas, ele é o Poder que é desejado, é o Poder que reina. Para mim, essa conotação é nova. Fui educada para seguir minha cabeça, para não ser “Maria vai com as outras”, ser influenciável era visto como uma certa fraqueza, era não saber pensar por si mesmo com os conhecimentos que tinha. Isso, em nada obstruía a possibilidade de convencimento, com eventual mudança de determinada posição porque estimulava a capacidade crítica. Hoje, dar opinião, com ou sem conhecimento do tema, pouco importa, se tornou até uma espécie de “profissão”.
E, por iniciativa própria baseada na simpatia ou antipatia, por pedido ou contrato, uma “influenciadora” pode decidir pela lacração de uma mulher que mexeu com alguma coisa. Feito. Seguindo caminhos similares, “lacrações” são laudadas, mulheres que odeiam mulheres, induzindo ao erro nas instâncias da justiça. Não se baseiam em fundamentos, mas, em fundamentalismo. Se é uma mulher denunciando um homem, ela é louca, mentirosa, ressentida, vingativa. Nunca pode ser uma mãe exercendo seu dever de cuidado e proteção de um filho ou filha.
Vale ressaltar que a verdade, termo filosófico, epistemológico, afetivo, que fazia parte da configuração do humano, faleceu. A Ciência está em coma, respira com ajuda de aparelhos, perdeu sua importância, qualquer um afirma qualquer coisa como se tivesse passado pelos métodos científicos comprováveis. “Eu penso que penso, logo estou certo!”. Bem diferente da conhecida questão existencial.

Ana Maria Iencarelli

Ana Maria Iencarelli

Psicanalista Clínica, especializada no atendimento a Crianças e Adolescentes. Presidente da ONG Vozes de Anjos.

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