População do Brasil deve encolher em quase 50 milhões até o fim do século, aponta estudo
Pesquisadores apontam que a estimativa de vida dos brasileiros poderá saltar de em torno de 76 anos para uma média de 82 até o fim do século
Até o fim desde século, a população do Brasil deve encolher em quase 50 milhões de pessoas, a China cairá de primeiro para terceiro país mais populoso do mundo, Japão, Itália e Portugal devem ter suas populações reduzidas a menos da metade e a lista dos 10 países com mais habitantes no planeta incluirá cinco africanos — hoje, só a Nigéria faz parte dessa lista.
Este novo mundo com populações mais enxutas e idosas, onde migrações e trocas multilaterais preencherão vácuos na força de trabalho e abrirão espaço para novas potências é descrito por um novo estudo feito por pesquisadores da escola de medicina da Universidade de Washington e publicado nesta terça-feira (14) pela revista científica britânica The Lancet.
A partir de novas fórmulas para estimar taxas de natalidade, mortalidade e fluxos de circulação de pessoas, os autores desafiam previsões consagradas ao apontarem que a população mundial não deve crescer indefinidamente.
Para os pesquisadores, depois de alcançar um pico de 9,7 bilhões de pessoas, a população global começará a encolher a partir de 2064 até chegar a 8,8 bilhões em 2100 — quase dois bilhões de pessoas a menos que o previsto em estimativas da ONU, por exemplo.
Resultado de um aumento no acesso à educação e no acesso a métodos contraceptivos em todo o mundo, a queda no número de filhos por família se repetiria em 183 dos 195 países e territórios estudados, incluindo o Brasil.
Segundo os autores, a população brasileira saltaria de 211,8 milhões (dado de 2017) para um pico de 235,49 milhões em 2043, quando entraria em queda acentuada, até chegar a 164,75 milhões de brasileiros em 2100.
As mortes decorrentes do novo coronavírus, ressaltam os pesquisadores, “dificilmente vão alterar significativamente as tendências de longo prazo previstas para a população global”.
Ainda assim, apontam os pesquisadores, quando o tamanho da população e a distribuição destas pessoas por faixa etária mudam, a maneira como as pessoas vivem, o meio ambiente, as políticas públicas e a economia também se transformam.
As mortes decorrentes do novo coronavírus, ressaltam os pesquisadores, “dificilmente vão alterar significativamente as tendências de longo prazo previstas para a população global”
O Brasil do fim do século 21
Os autores da pesquisa, que teve entre seus financiadores a Fundação Bill e Melinda Gates, apontam que a queda já percebida na quantidade de filhos por família no Brasil deve se intensificar nas próximas décadas.
Ao mesmo tempo em que as taxas de natalidade diminuirão, eles apontam que a estimativa de vida dos brasileiros poderá saltar de em torno de 76 anos para uma média de 82 até o fim do século.
O resultado direto seria uma população mais velha que a atual — o que também pode significar um encolhimento na economia brasileira, como explica à BBC News Brasil o norueguês Stein Emil Vollset, professor de saúde global da Universidade de Washington e um dos autores do estudo.
“Prevemos reduções no PIB total no Brasil como resultado do encolhimento da população em idade ativa, o que por sua vez é impulsionado pelas baixas taxas de fertilidade no País”, disse o professor por e-mail à reportagem.
“As taxas de fertilidade no Brasil estão abaixo do nível necessário para manter os níveis atuais da população há vários anos e prevemos que as taxas de fertilidade permanecerão abaixo do nível necessário para crescimento ao longo deste século”, continuou Vollset.
Segundo o levantamento, o Brasil se manteria como 8ª maior economia do mundo até 2050. Mas, até 2100, o Brasil seria ultrapassado por Austrália, Nigéria, Canadá, Turquia e Indonésia, e cairia para a 13ª posição no ranking das maiores economias do mundo.
Dono da sexta maior população mundial em 2017, ano usado como referência pelo estudo, o Brasil deve ocupar a 13ª colocação entre os países com mais habitantes até 2100.
“As taxas de fertilidade no Brasil estão abaixo do nível necessário para manter os níveis atuais da população há vários anos e prevemos que as taxas de fertilidade permanecerão abaixo do nível necessário para crescimento ao longo deste século”
Um novo futuro
Em nota enviada a jornalistas, o editor-chefe da revista Lancet, Richard Horton, disse que a pesquisa “oferece uma visão sobre mudanças radicais no poder geopolítico”.
“O século 21 assistirá a uma revolução na história de nossa civilização humana. A África e o mundo árabe moldarão nosso futuro, enquanto a Europa e a Ásia recuarão em sua influência”, diz.
Entre as principais movimentações no ranking das 10 maiores economias do mundo entre 2017 e 2100, segundo o estudo, destacam-se o avanço da Índia para o pódio dos maiores PIBs mundiais (um salto da sétima para a terceira posição) e uma ascensão meteórica da Nigéria, que saltaria da 28ª posição para a nona e se tornaria o primeiro país africano entre entre as 10 mais.
“Até o final do século, o mundo será multipolar, com Índia, Nigéria, China e EUA como potências dominantes. Este será realmente um mundo novo, para o qual devemos nos preparar hoje”, diz Horton.
A Rússia, por sua vez, cairia da atual 10ª posição para a 14ª. O vácuo dos russos seria ocupado pelo Canadá, que pularia da 11ª para a 10ª posição.
Segundo o professor Vollset, as flutuações nos PIBs dos países resultariam, entre outros fatores, de um “declínio no número de adultos em idade ativa (…) que poderá resultar em grandes mudanças no poder econômico global até o final do século”.
No mundo inteiro, segundo o estudo, a fatia da população com mais de 65 anos será bem maior que a com menos de 20 (ou 2,37 bilhões contra 1,7 bilhão).
Os pesquisadores argumentam que essa queda na proporção de jovens pode significar uma redução em índices como inovação das economias.
Também encolheria o mercado interno — formado por pessoas aptas a consumir bens e serviços. “Aposentados têm menos probabilidade de comprar bens de consumo duráveis do que os adultos de meia-idade e jovens”, exemplificam os autores em nota à imprensa.
Segundo os autores, o fenômeno expõe “enormes desafios ao crescimento econômico trazidos por uma força de trabalho em declínio”, além de sobrecargas a sistemas de previdência social e saúde frente a populações cada vez mais idosas.
“Até o final do século, o mundo será multipolar, com Índia, Nigéria, China e EUA como potências dominantes. Este será realmente um mundo novo, para o qual devemos nos preparar hoje”
A explosão africana
O levantamento indica que as populações de 183 países do mundo devem encolher — “a não ser que a baixa natalidade seja compensada por imigração”.
Ainda assim, a população da África subsaariana, em média, deve triplicar até o fim do século, passando de 1,03 bilhão em 2017 para 3,07 bi em 2100.
Países subsaarianos, junto aos do norte da África e às nações do Oriente Médio serão os únicos, segundo o estudo, a registrarem aumento populacional até o fim do século.
O ranking dos cinco países mais populosos do mundo trará Índia (1,09 bilhão), Nigéria (791 milhões), China (732 milhões), EUA (336 milhões) e Paquistão (248 milhões).
Já a lista das 10 maiores populações incluirá, além da Nigéria, outros quatro países da África: República Democrática do Congo, Etiópia, Egito e Tanzânia.
A situação é bem diferente da Ásia e da Europa — continentes onde acontecerão as maiores quedas em termos populacionais.
No primeiro grupo, o Japão deve encolher das atuais 128 milhões de pessoas para 60 milhões em 2100, e a Tailândia deve ver sua população caindo de 71 para 35 milhões. A queda prevista para a China é ligeiramente menor, porém ainda impactante: de 1,4 bilhão em 2017 para 732 milhões em 2100.
Já na Europa, a população espanhola pode encolher de 46 a 23 milhões, enquanto a Itália perderá 30 milhões de cidadãos (de 61 para 31 milhões) e os portugueses irão de 11 para 5 milhões.
A jornalistas, o diretor da escola de medicina da Universidade de Washington, Christopher Murray, disse que o “estudo oferece aos governos de todos os países a oportunidade de começar a repensar suas políticas sobre migração, força de trabalho e desenvolvimento econômico para enfrentar os desafios apresentados pelas mudanças demográficas”.
“Para países de alta renda com populações em declínio, políticas abertas de imigração e políticas de suporte para que famílias tenham a quantidade de filhos que desejarem são as melhores soluções para sustentar os atuais níveis populacionais, de crescimento econômico e de segurança geopolítica”, diz o professor.
Os autores também ressaltam que as respostas de governos ao declínio da população não podem em qualquer hipótese interferir na liberdade e nos direitos reprodutivos das mulheres.
Limites
Entre os possíveis problemas do estudo, os autores dizem que as previsões podem ser afetadas pela quantidade e qualidade dos dados, “embora o levantamento tenha usado os melhores dados disponíveis”.
Eles também apontam a possibilidade de imprevistos que possam afetar ritmos de “fertilidade, mortalidade ou migração”.
Fonte: BBC News Brasil