A Cultura do Estupro de Criança e a Pedofilia Intrafamiliar Acobertada — Parte I

Uma menina, importa. Apesar de termos alguns milhares de meninas e meninos que são vítimas da Pedofilia Intrafamiliar, como esta menina, o Estado não se importa. Todas as crianças e adolescentes, importam
Estupro de Vulnerável. Gravidez na Infância. Pedofilia Intrafamiliar. Como é doloroso pensar estas atrocidades. Pensar, já dói.
Faremos um intervalo no tema sobre a locução da alienação parental. Continuaremos em seguida. Faz-se necessário escutar o grito de uma criança. Situação emblemática de milhares de bebês, crianças e adolescentes, que trouxe à tona a pedofilia incestuosa acobertada. Sei que estou pisando num terreno de areia movediça, num terreno minado. Mas, mesmo assim, não vou me furtar ao desafio. Dogmas escurecem nossa capacidade de pensar e de sentir empatia. O que menos vimos foi a sensibilidade do se colocar no lugar daquela menina. Definitivamente, não temos respeito pela criança. As vozes vociferavam em alto volume o que deviam fazer com ela. Sem escutá-la ao cabo de quatro anos de estupros continuados, fazendo com que outros estupros continuassem. É a revitimização social e institucional que já se estabeleceu. Até o Direito ao Anonimato, garantido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, foi violado. Além do inferno interno que sua mente vai arder, o inferno social promoverá a sensação de que não há mais lugar sossegado. Todos apontarão com a crítica afiada e devastadora.
Um fato midiático, de grandes proporções, politizado, traz, de novo, a rachadura patrocinada pela intolerância do pensar diferente. Nossas vísceras apodrecidas ficam à mostra. Argumentos religiosos são radicalizados. E se o outro não tem religião? Se eu tenho e pratico uma religião, não quer dizer que eu possa olhar para o outro que é agnóstico como sendo alguém inferior a mim. E, aqui, é uma questão de obediência à lei, que não deve ser infiltrada por crenças e credos. É da ordem da cidadania.
“Os artigos 4º e 5º do Estatuto da Criança e do Adolescente, ECA, segundo os quais é dever do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos à vida, à saúde, à dignidade, bem como não permitir que nenhuma criança ou adolescente seja objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade, opressão, unido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”. Isto foi escrito pela Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça. Torcemos muito para que todos, TODOS que, por ação ou omissão, tenham atentado contra os direitos fundamentais desta criança.
O Artigo 17 do ECA reza que “o direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.
Como conciliar saúde, vida, dignidade, se esta menina sofria há mais de quatro anos com estupros continuados? Este é o cuidado que nos propomos a oferecer à criança? Que tipo de adulto conseguirá ser se teve sua infância triturada? Mesmo com a cruel concretude de uma gravidez precocíssima por estupro, aos 10 anos, antes da menarca e de ser estabelecido o ciclo menstrual, um corpo infantil, sem espaço para uma bolsa de líquido amniótico, desenvolvimento hormonal ainda buscando a entrada na adolescência, sem capacidade para operar a grande revolução hormonal de uma gestação, ainda sem o aparecimento dos seios, portanto, com as glândulas mamárias ainda impossibilitadas de produzir leite, com o corpo fisiologicamente apertado, mesmo assim, vimos uma atitude insensível, dura, onde os predicados, me nego a repetir, que eram atribuídos à menina. Revitimizada. Muitos estupros sociais. Para onde ela irá agora?

Nem saúde, nem vida, nem dignidade. Nem mesmo o Direito a ter sua identidade preservada. Seu nome, seu endereço, sua avó, os xingamentos, esta menina perdeu a sua vida tão pouco digna. Os artigos do ECA, o 3º, o 4º, o 5º, o 7º, o 8º, o 13, o 17, etc., etc., etc. Onde estavam as Instituições ditas “protetoras”, as de saúde, as educacionais, os Conselhos Tutelares? A Promotoria Pública? E, onde estavam as pessoas que gritavam em desobediência à lei tardia que, entre três itens, o caso contempla dois itens? Estupro e risco à vida da mulher, no caso, da criança. Por Ação e Omissão do Poder Público, assistimos ao desrespeito aos crimes cometidos. Os crimes sexuais domésticos. Os crimes sociais de discriminação, exclusão, segregação, negligência, ausência de Políticas Públicas, Prevaricação.
Sob a batuta de crenças e credos, as leis que regem o comportamento social, são violadas. Todos temos a possibilidade de acreditar em Deus, num Deus. Mas, todos precisamos respeitar quem é agnóstico. Faz-se necessário organizar o pensamento. Ser a favor ou contra o aborto, é uma questão cidadã. Ser a favor ou contra a interrupção de uma gravidez precocíssima de uma criança de 10 anos, é uma questão legal e humanitária com a menina que já teve a infância roubada sob tortura. Rigores morais e religiosos, mesmo que de fervorosos fiéis, não podem determinar atitudes que excluem quem não comunga do mesmo credo. Seguindo um famoso livro religioso, “dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”.
Uma menina, importa. Apesar de termos alguns milhares de meninas e meninos que são vítimas da Pedofilia Intrafamiliar, como esta menina, o Estado não se importa. Todas as crianças e adolescentes, importam. Enquanto isso, somos surpreendidos pela nova determinação da Justiça. O Superior Tribunal de Justiça, STJ, comunicou que o estupro de vulnerável não implica em condenação em regime fechado. Ninguém gritou. Por que? Não é difícil pensar nas consequências. O silêncio é uma concordância com o relaxamento do regime dos raríssimos processos que condenam estupradores.
Esta situação de barbárie evidenciou as vísceras sociais apodrecidas. Omissão e Ação do Estado. Somos todos responsáveis por esta menina e por todos os outros meninos e meninas que sofrem toda sorte de abusos intrafamiliares.