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Vergonha de ir ao médico?

Medo de julgamento atrapalha tratamento e cura

Existem problemas de saúde que ainda são considerados tabus no momento de procurar um médico. Especialistas afirmam que é grande o número de pessoas que deixam de ir a consultas porque elas têm vergonha de revelar alguns tipos de problemas. Segundo a chefe do serviço de uroginecologia do Hospital São Vicente de Paulo (RJ), Rubina Lucia Fassio, há muito constrangimento de pacientes quando se trata de doenças uroginecológicas, principalmente o que compromete a parte sexual ou o convívio social. “Em situações de incontinência urinária, que, ao levantar do sofá, fica uma mancha úmida, ou quando tem que trocar de roupa ou comprar calcinha diante de uma perda de grande volume de urina. O constrangimento é tão grande que muitos ficam com vergonha de expor para o médico a queixa principal”, diz.
A cultura popular sobre algumas doenças também atrapalha a busca por tratamento: “Há a percepção errada de que a incontinência urinária é inevitável com o envelhecimento e de que não há tratamentos efetivos para tratá-la”, diz Cristiano Mendes Gomes, professor livre docente de urologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e chefe do Departamento de Disfunções Miccionais da Sociedade Brasileira de Urologia.
Segundo ele, em relação à incontinência fecal, o preconceito é ainda mais grave. “Alguns pacientes somente procuram um profissional de saúde para tratar a incontinência urinária ou fecal quando são ‘forçados’ pelo cônjuge ou outro familiar. Os homens são os que mais fogem do assunto”, revela.
Fassio comenta que é comum durante a anamnese (entrevista realizada pelo profissional de saúde) os pacientes tentarem esconder o problema. “Muitas vezes o acompanhante é quem nos relata que a pessoa está perdendo urina, se troca o tempo todo, usa absorvente e fica com cheirinho de xixi. Tudo em tom baixo, no momento em que a paciente vai ao banheiro se trocar para se encaminhar ao exame físico”.
Quanto maior a demora do paciente na procura de um médico, menor a chance de obter a cura com o tratamento conservador, tendo que se submeter a métodos mais invasivos, como a cirurgia. Além das incontinências, outros problemas como hemorroida, fissura anal e infecções sexualmente transmissíveis fazem com que a vergonha ou o receio do julgamento afaste o paciente dos consultórios.
Fassio conta que quando a questão envolve sexualidade, tudo fica ainda mais complicado. “Uma queixa importante, e muito frequente, é a do prurido vulvar, que são as famosas coceiras na região íntima feminina. Nem tudo que coça é candidíase, existem outras patologias como o líquen escleroso. Neste caso, as pacientes relatam coceira crônica e já chegam dizendo que têm uma alergia de muitos anos e que nunca melhora e, por constrangimento, levam muito tempo para procurar ajuda”, diz.
A vergonha de procurar e relatar o problema a um especialista pode levar o paciente a consultar fontes nem sempre seguras e ainda ao automedicamento. “O ‘Dr. Google’ pode ter diferentes efeitos nos usuários”, diz Gomes. “Dependendo da fonte consultada, pode trazer informações relevantes e mostrar que a pessoa não está sozinha e que há boas alternativas para tratar o problema. Outras, no entanto, podem minimizar o problema ou dar a ideia de que o problema é incurável”.
Com experiência no atendimento a pacientes com problemas na próstata, a psicóloga Thais Della Tônia, do Hospital Moriah, em São Paulo (SP), diz que uma maneira de enfrentar esse constrangimento é questionar os próprios julgamentos. Ela sugere se perguntar o que pensaria de uma pessoa em uma consulta que estivesse relatando uma infecção sexualmente transmissível. “Se você fosse o médico, o que pensaria do paciente? Você o julgaria?”, indaga.
Ela diz ainda que, além do constrangimento, o medo também pode estar por trás desse afastamento: “Consideramos em alguns casos que exista outro sentimento por trás dessa ‘vergonha’. Pode ser medo e, nesse caso, é necessário fazer a seguinte pergunta: O que pode acontecer se eu não fizer esse exame, se não procurar ajuda logo?”, observa.
Fassio esclarece que ao atender um paciente, o médico, na maioria das vezes, já faz o diagnóstico, deixando a pessoa mais relaxada e mais confiante de que o problema, que vinha sendo postergado há muitos anos, finalmente será resolvido. Segundo ele, um bom profissional tem que ter o seu jeito especial de receber esses pacientes, para que eles consigam fluir bem no diálogo e retornem com confiança e sem a vergonha que estavam. “Esse é nosso objetivo: ajudar sem críticas e tentar entender o porquê da demora em procurar um especialista”.

Fonte: UOL

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