Comportamento & Equilíbrio

Feminicídios e a lei da alienação parental

Artigo escrito por Ana Liési Thurler

O PL 6371/2019 está na pauta da Câmara Federal para ser votado nesta semana. Apresentado pela deputada Iracema Portella (PP-PI), pede a revogação da Lei da Alienação Parental (12.318/2010) aprovada com tramitação rápida, tentando neutralizar a Lei Maria da Penha com o silenciamento das mulheres.
No Brasil, as mulheres mantêm mobilização no enfrentamento ao feminicídio e a todas as formas de violências sexistas desde o assassinato de Ângela Diniz, em 1976, em Búzios (RJ) e o julgamento de seu assassino, Doca Street, em 1979, quando a vítima, sob a lógica patriarcal, se tornou ré. São 45 anos de resistência feminista para desnaturalizar a violência machista contra as mulheres.
No Distrito Federal, essas mobilizações começaram em 1987, com o assassinato de Thais Mendonça por Marcelo Bauer. O Fórum de Mulheres do Distrito Federal organizou, então, ato em memória de Thais, já lembrando outras mulheres vítimas dessa violência extrema, na igreja Nossa Senhora de Guadalupe. Significa que, em mais da metade da existência na capital deste País, as mulheres também estão na resistência. Durante esse tempo, palavras de ordem se repetiram incansavelmente: ‘Não se cale. O silêncio é cúmplice da violência’. Entretanto, a partir da vigência da Lei 12.318/2010, muitas mulheres preferiram se calar. Denunciando violências, não poucas mães passaram a ser acusadas de alienadoras e tiveram até reversão da guarda em favor de pais violentos e abusadores.
Em Sobradinho (DF), em 20 de junho último, Thais Campos Silva, 27 anos, esperava a chegada da filha de dois anos. Seu ex-marido, Osmar Sousa Silva, 36 anos, com quem compartilhava a guarda, devolveria a criança. Quando ela abriu a porta da casa, entretanto, ele não entregou a criança deixada com o irmão, e desferiu contra ela cinco tiros certeiros. Sua morte alimentou dramaticamente os números de feminicídios.

Ato pede revogação na Lei de Alienação Parental, em setembro de 2017 (Foto: Maia Rubim/Sul21)

No Rio de Janeiro, Barra da Tijuca, véspera do último Natal, Viviane Vieira do Amaral desceu do carro para levar as meninas ao encontro do pai — as gêmeas com sete anos e a mais velha, com dez anos. A guarda compartilhada das crianças garantia ao ex-marido, Paulo José Arronenzi, acesso à Viviane. Avistando-as, ele não buscou as meninas. Ali, em via pública e diante das filhas, feriu mortalmente a mãe, com diversas facadas. Na denúncia do Ministério Público, consta motivo torpe: “Inconformismo do acusado com o término do relacionamento, especialmente pelas consequências financeiras do fim do casamento na vida do engenheiro”. Três meses antes do feminicídio, Viviane lavrou Boletim de Ocorrência, mas manteve o compartilhamento da guarda das meninas.
Mães brasileiras temem serem acusadas de alienação parental e perder a guarda e todo contato com seus filhos, desumanidade que a Lei da Alienação Parental tem permitido. Assim, aceitam compartilhar a guarda de crianças com homens violentos, custando-lhes a vida.
Lei 12.318, Revogação Já.

Ana Liési Thurler
Doutora em Sociologia, feminista

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