China, Cuba, Rússia, Venezuela: PT adere ao lobby de autocracias
Partido Comunista da China veio ao Brasil assinar acordos com o PT
Por Carinne Souza
Por meio de discursos polêmicos e viagens internacionais, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já forneceu muitos indícios de que o Brasil apoia os governos autoritários da Rússia, da China, da Venezuela e de Cuba. Mas essa relação extrapolou a esfera diplomática e avançou para o campo político com a aproximação direta do Partido dos Trabalhadores (PT) e de parlamentares de outras legendas da base do governo com os partidos comunistas da China e de Cuba e com parlamentares das ditaduras da Venezuela e da Rússia.
A ação faz parte de um esforço da Rússia e da China, que inclui ações diplomáticas e lobby político, para se aproximar de nações da África e da América Latina em busca de apoio internacional. Ele acontece em um cenário, deflagrado pela invasão russa na Ucrânia, que vem sendo chamado por analistas internacionais de “Guerra Fria 2.0”. Rússia e China estão tentando atrair o máximo de aliados possível para um bloco que faz antagonismo aos Estados Unidos e seus aliados do G7 (grupo das sete maiores economias liberais do planeta).
Nos últimos dias, o PT demonstrou que tem respondido ao lobby feito por essas nações. Uma delegação de oito parlamentares do partido desembarcou na Rússia, entre 29 de setembro e 2 de outubro, para participar da Conferência Parlamentar Internacional Rússia-América Latina, evento promovido pelo governo russo. E, pouco antes disso, o partido recebeu, em sua sede em Brasília, uma comitiva do Partido Comunista da China. Na ocasião, os partidos assinaram acordos de “cooperação internacional”.
Para o doutor em Filosofia pela PUCRS e mestre em Relações Internacionais pela UFRGS, Cezar Roedel, China e Rússia têm se utilizado da “fragilidade conceitual” dos países do chamado Sul-Global para fazer da América Latina um “terreno propício a toda sorte de interesses obtusos”. De acordo com o especialista, a maioria das nações em desenvolvimento possui algum “fetiche com as autocracias” e criam um “vislumbre com a ideia de que as mesmas estejam a criar um novo polo de poder e uma ‘nova governança global’”.
O Sul-globalista contesta a ordem vigente e até mesmo o direito internacional. Acredita que um novo mundo possa surgir sob a égide de potências autocráticas e contestadoras da hegemonia do Ocidente. Preferem o pragmatismo mercantil e ideológico com ditaduras do que o caminho complexo da defesa da democracia”, analisa Roedel.
Os acenos do PT às investidas da China
À Gazeta do Povo, especialistas explicaram que é comum que partidos busquem alianças com legendas homólogas em outros países do mundo. As escolhas do PT para tais aproximações, contudo, geram desconforto. Neste ano, membros do partido brasileiro foram até a China se encontrar com parlamentares do Partido Comunista Chinês com o intuito de identificar possíveis acordos bilaterais. A viagem aconteceu em junho.
Três meses depois, foi a vez do PT receber uma comitiva vinda da China. Chefiada por Li Xi — secretário da Comissão Central de Inspeção Disciplinar do Partido Comunista da China —, as legendas assinaram acordos de cooperação internacional. À Gazeta do Povo, o PT justificou que tais encontros eram comuns e a associação entre os partidos já somam quatro décadas.
Mas o Partido Comunista Chinês, liderado por Xi Jinping, tem orientação muito mais Marxista-Leninista que os governos chineses das últimas décadas. Sob Hu Jintao (2002-2012) e Jiang Zemin (1987-2002), a China era vista sob a ótica do país que fez reformas econômicas pragmáticas, que permitiu empresas privadas, atraiu investimentos externos e aumentou as liberdades individuais.
Xi reavivou a política de Mao Tsé-Tung aumentando o controle sobre a sociedade e diminuindo as liberdades individuais. A economia chinesa voltou à tendência estatizante, empresários de sucesso começaram a ser perseguidos e o país adotou uma postura belicista.
A China também passou a ser acusada de crimes contra os direitos humanos de minorias étnicas, de restringir o acesso da população à internet e de manipular as notícias veiculadas na imprensa local. Essas características mostram a contradição do discurso de defesa da democracia adotado por Lula e pelo PT. O petista costuma minimizar esse fato e afirma que o Brasil tem uma política de não interferência nas questões de outros países. Também lembra sempre que a China é o maior parceiro comercial do Brasil. Nos últimos meses, contudo, Lula fez declarações em que deixou claro que seus interesses em Pequim vão além do comércio. Durante encontro com Li Xi em Brasília, Lula chegou a dizer que seu partido “tem uma forte relação com o Partido Comunista Chinês”.
É sempre uma alegria poder receber um país irmão. Um país com quem mantemos uma relação extraordinária, não apenas do ponto de vista comercial, mas do ponto de vista político”, continuou Lula. O mandatário brasileiro ainda disse que tem “toda a boa vontade e a disposição de estabelecermos cada vez mais uma relação forte com a China”.
Reunião na Rússia teve membros do PT, PCdoB, PSB, MDB e PSD
A China passou a sofrer sanções e isolamento do Ocidente ao travar uma guerra comercial com os Estados Unidos que teve início 2018. Já o isolamento russo passou a ocorrer depois que país decidiu invadir a Ucrânia em 2022. Vendo seu apoio internacional diminuir desde o início da guerra, Vladimir Putin passou a repetir a estratégia de Xi Jinping para atrair atenção dos países do Sul-Global. Na intenção de aproximar os países latino-americanos com as “maravilhas do desenvolvimento russo”, o Kremlin organizou a Conferência Parlamentar Internacional Rússia-América Latina.
No encontro, foram realizadas reuniões com aproximadamente 200 parlamentares da América Latina e do Caribe. Em Moscou, tais representantes assistiram a palestras sobre tecnologia, mobilidade urbana, desenvolvimento econômico e entre outros temas. Do Brasil, governistas do PT, PCdoB e PSB foram alguns dos convidados, além de representantes do MDB e do PSD.
O secretário-geral do Partido Socialista Brasileiro (PSB), Acilino José Ribeiro de Almeida, além de estar na comitiva enviada à Rússia, foi um dos palestrantes do evento. Questionado pela Gazeta da Povo sobre a viagem, o político declarou apoio à Rússia e disse que “Zelensky deveria ser preso como criminoso de guerra”. Contudo, Zelensky não cometeu nenhum crime de guerra. A Rússia foi responsável por bombardeio constante de civis inocentes e pelo rapto e deportação de milhares de crianças ucranianas.
Durante a viagem, os partidos de esquerda brasileiros ainda se encontram com representantes dos governos de Cuba e Venezuela. O evento na Rússia contou com uma agenda em Moscou que durou quatro dias. Mas, antes do convite para parlamentares e representantes de partidos marcarem presença em Moscou, Lula já havia feito acenos positivos ao país de Vladimir Putin. A Rússia é um dos principais fornecedores de fertilizantes para o Brasil e alegadamente por isso ganhou a atenção de Lula. Mas depois o alinhamento pareceu se tornar mais ideológico do que pragmático. Segundo analistas, a esquerda brasileira ainda tende a ver a Rússia como a velha União Soviética comunista. Mas o governo de Putin tem muito mais características da Rússia autocrática e imperialista do século XIX.
Lula foi um dos poucos presidentes do mundo que não só deixou de condenar o Kremlin pela guerra, mas o defendeu publicamente. Ele fez declarações contraditórias sobre a Ucrânia e chegou a dizer que o país invadido era tão culpado pelo conflito quanto a Rússia. O petista também se opôs a declarações de condenação a Putin em tratados internacionais, minimizando as atrocidades e crimes de guerra cometidos por Moscou e boicotando iniciativas diplomáticas para culpar a Rússia pela guerra.
Lula ainda enviou seu assessor de assuntos especiais, Celso Amorim, para uma visita à Rússia antes mesmo de visitar a Ucrânia, país invadido. Em recentes discursos, o mandatário brasileiro ainda chegou a condenar as sanções impostas pelos Estados Unidos e países europeus à Rússia como uma estratégia para tentar frear a guerra. O petista também utilizou o mesmo discurso para condenar os embargos à Cuba.
Cuba, Venezuela e Nicarágua não saem do radar de Lula (e nem do PT)
Enquanto tenta justificar a aproximação com China e Rússia pelos acordos comerciais, Cuba e Venezuela não saem do radar de Lula e do PT pela semelhança ideológica dos partidos. As duas nações latino-americanas foram palcos de conhecidos ditadores que são exaltados pela esquerda: Fidel Castro e Hugo Chávez — figuras essas que chegaram a ser mencionadas por Vladimir Putin em seu discurso durante a Conferência Parlamentar Internacional Rússia-América Latina. Seus sucessores hoje são Miguel Días-Canel e Nicolás Maduro, respectivamente.
No fim de maio, Lula foi muito criticado, inclusive por aliados, pelas declarações que fez sobre a Venezuela. Em uma tentativa de reativar a Unasul, o petista recebeu o ditador venezuelano, Nicolás Maduro, com honrarias de chefe de Estado no Brasil e chegou a dizer que o país era “vítima de uma narrativa de antidemocracia e autoritarismo”. Vale ressaltar que Maduro é acusado de crimes contra os direitos humanos, de fazer presos políticos e de manipular as eleições em seu país para não deixar o cargo de presidente — que ocupa há 10 anos.
Em junho, o site do PT ainda publicou uma matéria corroborando com a fala distorcida de Lula. Originalmente publicado no portal Brasil.247, o texto tem o título de “especialista em geopolítica desmonta narrativa para demonizar Venezuela”, o artigo tenta justificar os sério problemas enfrentados pela Venezuela.
Mesmo em meio a críticas, o mandatário repetiu discursos da Venezuela com Cuba e Nicarágua, países que ainda são liderados por ditadores. Em entrevista à Rádio Gaúcha, em junho, o petista disse que “o conceito de democracia é relativo”, ao abordar a ditadura de Daniel Ortega na Nicarágua. O político ocupa o cargo de presidente desde 2007 e é acusado de perseguir opositores políticos e também religiosos.
A autocracia cubana ainda chegou a ser visitada por Lula neste ano. O petista foi ao país na primeira quinzena de setembro para participar da Cúpula dos G77+China. Durante a passagem por solo cubano, criticou os embargos dos Estados Unidos ao país. Lula repetiu as mesmas críticas, poucos dias depois, em seu discurso na Assembleia Geral das Nações Unidas, que aconteceu em Nova York.
Todos esses ditadores ainda foram exaltados durante o Foro de São Paulo, que ocorreu em Brasília, entre os dias 29 de junho e 2 de julho. Com a presença de lideranças de esquerda do mundo inteiro, o evento teve reuniões e palestras em que se exaltava Che Guevara, Fidel Castro e Hugo Chávez.
Fonte: Gazeta do Povo