Comportamento & Equilíbrio

Por que há poucos negros na Argentina? A história explica

Como guerras, doenças e a imigração europeia estão ligadas à redução da população negra na Argentina

Por Isabela Oliveira

Em 1996, o então presidente argentino Carlos Menem disse que “na Argentina não há discriminação porque não há negros” como no Brasil. A afirmação aconteceu no mesmo ano do assassinato do ativista afro-uruguaio José Delfín Acosta Martínez pela polícia de Buenos Aires, ao defender dois brasileiros de uma abordagem policial racista.
De acordo com dados do governo da Argentina, em 1778, a população de afro-argentinos em Buenos Aires, capital do país, era de 29,70%. Mas, no século 19, as coisas começaram a mudar, e em 1887, esse número já era de apenas 1,87%. A maior queda ocorreu a partir de 1838, já que, na época, 23,71% das pessoas ainda eram negras.
Entretanto, vale observar que, de 1806 a 1938, de mais de 62 mil habitantes, subiu de 3329 para 5717 o número de pessoas não identificadas em nenhuma categoria étnica, grupo que representava também a população parda.

Guerras e doenças mataram negros na Argentina
Em entrevista ao jornal El País, o historiador Felipe Pigna contou que, na Guerra da Independência (1810 – 1818), Guerras Civis (1814 – 1853) e na Guerra do Paraguai (1864 – 1870), os homens negros argentinos eram usados como “bucha de canhão”. Ou seja, eram vistos como dispensáveis pelo governo e pelos militares diante de ataques inimigos.

Em um vídeo em seu canal “Caçador de Histórias”, o mestre em história social Flávio Muniz explica que, devido à falta de homens disponíveis para o serviço militar, em 1813, o governo criou decretos de recrutamento para pressionar homens e crianças escravizados a servir ao exército, oferecendo-os liberdade após um período mínimo de contribuição, entre outras leis discriminatórias. Nesse período, há também alguns poucos relatos de soldados que abandonaram o país para livrar-se da escravidão e da guerra.

Além disso, epidemias como a de cólera, em 1861, e de febre amarela, em 1871 — e a doença de altitude Soroche, entre os soldados que lutavam na Bolívia — também causaram grandes índices de mortalidade entre as pessoas pobres no país, o que incluía os afro-argentinos. Mas, além da alta mortandade, os poucos nascimentos também contribuíram para a redução dos negros na Argentina.

Baixa natalidade de crianças negras no século 19
Segundo Pigna, “a natalidade era muito baixa, inclusive em comparação com outras sociedades latino-americanas”. Isso porque os amos evitavam o casamento de escravos, assim como as gestações de escravas, alegando que isso as impedia de trabalhar, além dos riscos de morrerem durante o parto.

Em Buenos Aires, o censo de 1810 mostra que, apesar da quantidade de mulheres negras e de mulheres brancas em idade fértil (de 15 a 44 anos) ser próxima, com 59% no primeiro grupo e 56% no segundo, para cada mil mulheres, 400 crianças nasceram das brancas, enquanto apenas 256 nasceram das negras, representando um menor índice de natalidade. Ao mesmo tempo, a taxa de mortalidade das crianças negras era maior. Em 1828, para cada mil crianças, morreram 442 meninos negros e 376 meninas negras, contra 246 meninos brancos e 251 meninas brancas.

Miscigenação clareou pele da população
Por fim, entre 1880 e 1900, somou-se à redução da população negra o aumento da imigração europeia, com quase um milhão de imigrantes, sobretudo em Buenos Aires. Com a miscigenação, a cor dos argentinos mudou.

A pele é um dos traços que mais rapidamente branqueia”, disse a antropóloga María Belén Zaninovich ao El País, citando os cabelos crespos como uma herança negra atual.

Fonte: Giz Brasil

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