Dinheiro do BNDES para indústria reacende temores; governo diz que desta vez será diferente
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O presidente do BNDES, Aloízio Mercadante: participação do banco no programa industrial do governo reacende temores sobre dinheiro do Tesouro e participação do banco em empresas, mas governo diz que desta vez será diferente
Por Raphaela Ribas
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Ao anunciar seu programa de estímulo à indústria, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prometeu cerca de R$ 300 bilhões para o setor até 2026. A maior parte desse valor, cerca de R$ 250 bilhões, virá de financiamentos e outros aportes do BNDES. Batizado de Nova Indústria Brasil, o programa foi saudado pelo empresariado do setor — que, no entanto, cobrou mais recursos — e recebido com muitas reservas pelo mercado financeiro e economistas liberais.
O temor é de que o governo ressuscite velhos “fantasmas” de gestões anteriores do PT, como a famigerada política das empresas campeãs nacionais, que consumiu centenas de bilhões de reais — de dinheiro do contribuinte — em benefício de empresas escolhidas a dedo.
A maior preocupação foi com a possibilidade de que o Tesouro voltasse a repassar dinheiro do contribuinte para o BNDES apoiar empresas com juros abaixo de mercado. Também chamou atenção o anúncio do presidente do banco, Aloízio Mercadante, de que a instituição terá R$ 8 bilhões para “equity”, ou seja, participação acionária em empresas. A declaração deu a entender que o BNDES voltaria a comprar ações e ser sócio de empresas, prática controversa de tempos passados que foi revertida em grande parte durante o governo de Jair Bolsonaro (PL).
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As ações que o BNDES detém em empresas privadas são usadas pelo governo para tentar influenciar seus rumos e também para acomodar aliados em conselhos de administração. No ano passado, chamou atenção a indicação dos ministros Anielle Franco, da Igualdade Racial, e Carlos Lupi, da Previdência, para o conselho da metalúrgica Tupy. Após o episódio, o banco admitiu que pretendia “maximizar” sua participação nas empresas.
Ao falar dos R$ 8 bilhões destinados a participações acionárias, Mercadante salientou o objetivo de investir em empresas da cadeia de veículos elétricos.
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Temos 8 bi de equity, que nós queremos investir em empresas. Crédito é namoro, equity é casamento. São setores muito importantes, por exemplo, esse segmento de minerais críticos fundamentais para o futuro de baterias e toda mobilidade elétrica”, disse Mercadante em 22 de janeiro, dia do anúncio do programa.
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“Já estamos com cinco fábricas de ônibus no Brasil, produzindo ônibus elétrico. O Brasil tem a sétima reserva de lítio do mundo. E nós queremos ter controle e presença estratégica nesse segmento”, afirmou o presidente do banco estatal, segundo registro do site EPBR. “Esse é um setor que o BNDES quer entrar com equity”, acrescentou. Em um comunicado do governo, esses R$ 8 bilhões foram incluídos em eixos chamados “inovação” e “descarbonização”.
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Após a repercussão negativa dos primeiros anúncios, integrantes do governo correram para fazer esclarecimentos. Eles negaram que o Tesouro voltará a financiar o BNDES. Disseram também que a participação acionária do banco em empresas não será direta e, sim, por meio de fundos de investimento — em total contraste com a afirmação inicial de Mercadante de que o governo almejava “controle e presença estratégica” no segmento de veículos elétricos.
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“Não tem nada a ver com questão fiscal. O governo não vai fazer nenhum aporte de dinheiro para o BNDES, não vai colocar recurso a mais no BNDES”, disse o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Geraldo Alckmin (PSB).
Mercadante, por sua vez, afirmou no Jornal Nacional, da TV Globo, que o BNDES vai atuar em equity via fundos no mercado de capitais, e não via compra direta de ações.
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“O volume de recursos que está destinado para os próximos três anos são R$ 8 bilhões. É um valor bastante pequeno. Mas ele vai ser feito de que forma? Através de editais públicos, com esses fundos privados, gestores privados, onde o BNDES participa com no máximo 25% para atingir alguns nichos que banco não tem condições de fazer, que os bancos privados também não”, disse Mercadante. “Tem que ser agentes privados, bancos privados, e vamos procurar e apoiar essas empresas. A discussão não é mais se tem que ter ou não. É como fazer. Aprender com os erros do passado e fazer melhor para gente recuperar nossa indústria”, completou.
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O diretor de Desenvolvimento Produtivo, Inovação e Comércio Exterior do banco estatal, José Luis Gordon, deu mais detalhes em entrevistas a jornais.
Você não vai escolher uma empresa A, B ou C; você vai investir em empresas junto com o mercado em fundos que poderão ser gerenciados por privados, como BTG, Pátria, Genial, por exemplo. Então, você vai junto com o mercado de capitais para investir em startups, pequenas empresas que possam desenvolver tecnologias e produtos importantes em áreas estratégicas”, afirmou Gordon ao “Estado de S. Paulo”.
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Segundo ele, não haverá aporte do Tesouro Nacional no BNDES, nem equalização de taxas de juros (ou seja, subsídios bancados pelo contribuinte), e o BNDES fará escolha das empresas em conjunto com bancos e gestoras. O primeiro fundo em desenvolvimento, disse, é dos chamatos “minerais críticos” — fundamentais para veículos elétricos, por exemplo.
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Passado recente do BNDES deixa mercado ressabiado
Alessandra Ribeiro, economista e sócia da Tendências Consultoria, considera que o anúncio da nova política industrial teve efeito ruim sobre os mercados porque, ainda que tenha pontos meritórios, não ficou claro como o programa será implementado.
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Dados os erros do passado [das gestões anteriores do PT], acho que esta é a principal crítica. No passado, o dinheiro veio do Tesouro e não vimos benefícios para a sociedade, apenas para empresas. Depois veio o inchaço e a crise fiscal. Com isso, o mercado fica supersensível. Outro ponto é como o BDNES vai selecionar as empresas que vai investir?”, questiona.
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A questão da participação societária em empresas é ainda mais crítica, uma vez que poderia aumentar a ingerência política do governo sobre o setor privado. Sobre os setores que vão receber os aportes, a economista entende que há diferentes situações. No caso da bioenergia, onde o Brasil está desenvolvido, ela acredita que a atuação do BNDES pode servir de um bom impulso caso a agenda seja bem desenhada. No caso dos veículos elétricos, porém, ela alerta para o retorno do investimento.
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Tenho muita dúvida se algum tipo de benefício [do BNDES] para produzir carros elétricos no Brasil vai efetivamente gerar renda, emprego e atividade econômica que sejam positivas. Primeiro, porque o investimento geralmente não se paga, nem de longe. Segundo, porque não somos produtores, e é para atrair estrangeiros. O ideal seria investir onde tem mais retorno”, diz.
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Fonte: Gazeta do Povo