Cultura

Todos os fuscas da minha vida

Desde garoto sempre acalentei o “sonho” do carro próprio. Eu sempre fui aficionado por carros. Mas a grana era curta e o meu primeiro veículo foi um fusca. Veículo este adquirido com meus primeiros salários e com a ajuda de papai. E, assim, começou a saga com os “fuka” na minha vida. O primeiro espécime foi tão barato, mais tão barato, que o som interno valia mais que o próprio carro. Mas o que importa é que eu estava faceiro. Eu estava feliz.
Lembro, saudoso, de um doido que havia no meu bairro (de Fátima) que, pilotando um fusca azul envenenado, cruzava as ruas do bairro, numa corrida louca e desenfreada. O tal piloto maluco apostava corrida pelas ruas do bairro, quase atropelando as fofoqueiras de plantão, isto tudo sob todo o tipo de vaias, apupos e xingamentos. E eu, molecote, achava aquilo o máximo e pensava: “ainda vou ter uma máquina dessa”.

E, assim como a Glória do Mundo sempre passa, tive fuscas de todas as espécies, de toda cor e qualidade. Tive fuscão, fusca e fusquinha. Fusca original, rebaixado, estiloso, envenenado, baja, 1300 e 1600 cc. Tive, ainda, fuscas de todas as cores, azul, branco, bege, amarelo, vermelho. Só não tive o temido “FUSCÃO PRETO”.

Mas, entre todos, o que eu mais gostava era um fuka “Amarelão”, da cor da antiga TELEST, que eu passava o dia todo lavando, encerando e ouvindo música. No final do dia o “bicho” brilhava mais que vaga-lume no escuro. Esse fusca, tinha uma peculiaridade toda própria, pois, toda vez que eu fazia uma curva muito fechada, ele abria a porta e tentava despejar o carona. Foi assim que se deu a minha primeira tentativa de me livrar de minha esposa (na época, minha namorada).

Teve, também, bege, que só funcionava à base do empurrão e, por causa do “abençoado”, perdi uma antiga namorada. Ocorre que, depois de tanto empurrar o “auto”, um dia ela me disse, indignada: “tudo bem, eu continuo saindo com você, mas não traz mais o fusca”. Como o “coração é terra que ninguém anda” e, por motivos óbvios, tive que terminar aquele promissor relacionamento. Teve outro, o “fuka-bala”, que não tinha freio de mão, o que me obrigava a andar sempre com um paralelepípedo em seu interior, para escorá-lo nas descidas. Dava trabalho, mais sempre funcionava. Eu acho que o problema era na “Rebimboca da Parafuseta”.

Lembrei, também, de outra ocasião em que, pilotando um fusca envenenado, me enchi de coragem e abordei a garota mais bonita do bairro, ocasião em que ela me encarou e, me esnobando, friamente, disparou: “você deve estar me confundindo, não conheço ninguém que tenha fusca”. Nunca esqueci dessa desfeita, eu não sou de guardar mágoas, mas, eu gostava muito dos meus fuscas e, mais tarde, quando a situação melhorou, namorei a irmã dela, mais nova e mais bonita, somente para vingar o meu fusca humilhado.

Certa feita, fui visitar uma antiga namorada no Alto do Morro e, na empolgação, esqueci que “minha máquina” não contava com um eficiente sistema de freio. Resultado, depois do último amasso, entrei no possante e acelerei. Rapaz, que sufoco! Faltou freio no possante e somente não morri na avenida principal (Mal. Campos) por motivo de intervenção divina e porque joguei o auto contra um muro.

Outra ocasião, a vítima foi minha linda irmã, Ana Luiza, que tomou um baita de um susto. É que o fusca, “verde-abacate”, que eu tinha, perdeu o freio na BR 101 e tive que acionar um mecanismo de parada um tanto quanto inusitado, um poste. De outra oportunidade, pilotando outra máquina, dessas nervosas, desta vez já casado com Kely (minha eterna companheira), quase viajei para a ‘cidade do pé junto’. Acontece que, em pleno verão, resolvemos passear em “Costa Dourada” e na volta inventei de seguir por uma estrada de chão.

Tudo ia muito bem quando, numa descida que desembocava num pontilhão, o “bendito” do automóvel, perdeu o freio. Tal fato, apesar de trágico, acabou servindo de “teste de fidelidade”, pois minha amada esposa vivia dizendo que não me largava de jeito nenhum. Contudo, ao perceber que poderíamos cair no rio, ela tentou abrir a porta e pular. Para nossa sorte, a maçaneta soltou em sua mão, ela não conseguiu abrir a porta e não pulou. Eu consegui controlar o “bruto” e saímos são e salvos. Apesar desta desventura, continuamos casados até hoje.

Como se viu, são muitos momentos de pura emoção e felicidades, que somente quem já teve um fusca pode compreender toda a sua extensão. A roda da vida girou, a vida passou num instante nas voltas do meu coração e “mutatis Mutanti”, atualmente dirijo um carro automático importado, confortável e cheio de recursos, mas não me sai da lembrança a saudade curtida de todos os fuscas da minha vida.
E, por isso, que sempre digo “DEUS É BOM O TEMPO INTEIRO”!

Mário Vieira

Mário Vieira

Capixaba, casado, autor e advogado

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