PF retira da rede arquivos com mensagens privadas de ex-assessor de Moraes

Mensagens de Tagliaferro sobre Moraes foram excluídas de pasta de acesso público
Por Renan Ramalho e Aline Rechmann
A Polícia Federal retirou de uma pasta pública na internet arquivos que continham mensagens de WhatsApp do perito Eduardo Tagliaferro, ex-assessor do ministro Alexandre de Moraes, com sua mulher e seu advogado. O material, que continha conversas íntimas entre o casal e protegidas por lei com o advogado ficou disponível por quase duas semanas para acesso público.
Esses arquivos compõem anexos do inquérito aberto no Supremo Tribunal Federal (STF), sob relatoria de Moraes, para investigar Tagliaferro por suposto cometimento do crime de violação de sigilo funcional, em razão do vazamento de mensagens mais antigas, publicadas na Folha de S.Paulo, em agosto do ano passado, com a equipe do ministro — os diálogos revelaram como ele encomendava relatórios, junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), para suspender perfis e remover postagens nas redes sociais.
As mensagens de Tagliaferro com a mulher e o advogado, ocorridas ao longo de 2024, foram capturadas pela PF para investigar se ele foi o responsável pelo vazamento à imprensa das mensagens com a equipe de Moraes. Os arquivos foram disponibilizados numa pasta aberta na rede no último dia 1.º de abril, com link e endereço na internet informado dentro de um relatório com a análise do material.
Nesta quarta-feira (16), após a publicação, na Gazeta do Povo, de mensagens enviadas à sua mulher, em que Tagliaferro expressou temor de ser preso, por ordem de Moraes, ou até morto, caso contasse o que sabia sobre o trabalho que realizava, os arquivos com a íntegra das conversas estavam retirados da pasta pública na internet.


Na última sexta-feira (11), a reportagem questionou, por meio da assessoria de imprensa da PF, o delegado que conduz o inquérito e o agente da PF que elaborou o relatório que dá acesso ao material. Não houve resposta. Nesta quarta, a reportagem voltou a questionar a PF sobre a retirada dos arquivos, mas não recebeu esclarecimentos até a publicação desta reportagem — o espaço permanece aberto.
A extração dos dados do celular de Tagliaferro e sua mulher foi autorizada por Moraes em novembro do ano passado, numa decisão de quebra de sigilo telemático. A pedido da PF, ele também permitiu a devassa nas conversas com a defesa, que por lei também são sigilosas; no pedido, o delegado do caso, Thiago Peixe, afirmou que o advogado poderia estar envolvido em atos supostamente ilícitos, mas no final da investigação não apontou qualquer indício de ilegalidade.
Em geral, conversas privadas de investigados sem qualquer relação com a suspeita de crime em investigação ficam em segredo de Justiça, para preservar a intimidade, um direito constitucional. A lei de interceptação telefônica, que regula o procedimento de captação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática, diz que as transcrições das conversas devem ser preservadas em sigilo, em autos apartados.
A reportagem também questionou o gabinete de Alexandre de Moraes, por meio da assessoria de imprensa do STF, se houve falha na disponibilização pública do material, mas não houve resposta até a publicação desta reportagem. Para dois especialistas do tema, ouvidos sob reserva, a disponibilização das conversas privadas viola não apenas o direito constitucional da intimidade, mas princípios da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), e pode resultar em punições administrativas aos responsáveis. A PF também não se manifestou ao ser questionada sobre o assunto.
A pasta com os arquivos das conversas foi acessada pela Gazeta do Povo a partir do relatório com a análise do material, juntado ao inquérito no mesmo dia em que Tagliaferro foi indiciado por suposta violação de sigilo funcional. O inquérito agora é analisado pela Procuradoria-Geral da República (PGR), a quem cabe decidir se denuncia o perito ou arquiva o caso.
Inquérito contra Tagliaferro é relatado por Moraes
Tagliaferro passou a ser investigado por Moraes, no ano passado, após a divulgação de mensagens, em reportagem da Folha de S.Paulo, que apontavam que o ministro teria solicitado informalmente, por meio de outros assessores, a produção de relatórios à assessoria chefiada pelo perito no TSE.
As mensagens foram vazadas de um grupo composto por Tagliaferro e por Airton Vieira, juiz instrutor do gabinete de Moraes no STF, e Marco Antônio Vargas, juiz auxiliar de Moraes durante sua presidência no TSE. Nas mensagens, esses auxiliares davam ordens e direcionamentos informais para Tagliaferro produzir relatórios contra supostas fake news nas redes sociais.
Eduardo Tagliaferro foi assessor do ministro Alexandre de Moraes no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), entre agosto de 2022 e maio de 2023. Ele foi demitido um dia após ser preso por causa de um desentendimento com sua ex-mulher em casa.
Fonte: Gazeta do Povo