Altar

Com a neblina baixa, a visão era praticamente zero, para os dois lados da estrada. Em meio a uma tempestade repentina, um casal foi obrigado a procurar um local para pernoitar. Em baixa velocidade, eles procuraram por um tempo, contudo nenhum hotel estava com a aparência que eles almejavam. Entretanto, o medo por terem que enfrentar uma noite no veículo foi aumentando e logo começaram a aceitar outros padrões de acomodações, porém as oportunidades foram ficando mais escassas. Por quilômetros, não havia nem mesmo um posto de combustível. Por volta das 22h, uma luz surgiu entre a densa neblina. De fato, era um posto, com uma pequena hospedaria no fundo. Os dois se entreolharam, desconfiados, pois não era o que queriam.
Assim que chegaram à recepção, eles notaram um ambiente precário e antigo. Quadros com molduras amareladas, algumas fotos de décadas atrás, um carpete sujo e gasto pelas solas de sapatos. Além de perceberem que o lugar exalava um aroma de bálsamo com canela. As luzes eram fracas e piscavam incessantemente. À mesa central, uma brochura com as assinaturas dos hóspedes e, quando observaram, perceberam que a quantia somada não chegava a três páginas. Eles sorriram, timidamente, imaginando como seriam as demais acomodações. Após o pagamento adiantado, receberam a chave do quarto com indicações que ficariam no final do corredor.
Eles entraram por um estreito e longo corredor, as paredes eram escuras e o cheiro de mofo predominava. A esposa logo observou uma falha na parede entre as portas dos quartos. Ao se aproximar, encontrou uma pequena sala, com dois espelhos virados para uma mesa de centro. Algumas velas acesas rodeavam a imagem de Nossa Senhora. Ao lado da imagem, uma Bíblia aberta no salmo 91. Ela deduziu que se tratava de um altar, somente os espelhos a deixaram apavorada. Eles preferiram seguir para o quarto, mas o desejo dela era voltar ao automóvel e dormir no estacionamento. Ela pressentiu algo péssimo.
O quarto era de uma simplicidade constrangedora, no entanto, o casal só pensava em dormir. Um quadro na parede destacava o rosto de uma bela criança, contudo, no seu olhar havia malícia. Para ela, foi difícil adormecer. Após poucas horas de sono, um ruído assustou o casal. Era como se algo muito pesado tivesse caído no chão. Após o susto, o silêncio retomou e ele adormeceu. Algum tempo depois, passos pelo corredor, era como se os hóspedes estivessem deixando o local na madrugada. Entre trovões e raios, conversas por todos os lados. Acostumados com a movimentação do local, eles voltaram a dormir.
Quando o sol estava prestes a nascer, a jovem esposa sentiu uma carícia em seu rosto. Ao despertar levemente, ela não acreditou que seu marido havia acordado tão cedo. Os seus dedos a tocavam com carinho, ela abriu os olhos com um sorriso no rosto. No entanto, ela imediatamente notou que o seu marido estava dormindo virado para o lado oposto. Com os olhos abertos e paralisada, a jovem sentiu algo a tocar suavemente.
Sem hesitar, ela pulou da cama e chamou por ele, pedindo que saíssem naquele exato momento. Ela o explicou com a voz trêmula, ele, ao perceber a gravidade da situação, resolveu atender. Assim que eles chegaram à recepção vazia, deixaram a chave no balcão. A mulher, por curiosidade, analisou a quantidade de hóspedes naquela noite, anotados no caderno, porém, na data correspondente, não havia nenhum nome, além dos dois. Em seus olhos, uma surpresa desagradável, a sensação ruim piorou e o mesmo pensamento passou pela mente de ambos: estamos em um local mal-assombrado!
O casal se abraçou em conforto. Saíram sem olhar para trás, cada um, em suas preces particulares. Suas mentes ficaram profundamente perturbadas pelas terríveis conclusões.
Autora: Silvia Vanderss
Conto: Altar
Inédito
Palavras: 616