Comportamento & Equilíbrio

A Violência das Instituições e dos Profissionais — Parte III

Os Feminicídios são diários. Mas há um grupo de pessoas que critica a lei Maria da Penha, emitindo opiniões de descrédito nas mulheres

No nosso imaginário, temos uma tendência a associar o olho roxo, os hematomas pelo corpo nas partes externas à roupa, o dente quebrado, ao resultado de uma violência contra a Mulher. E, se a vítima for uma Criança, as marcas na pele se misturam com uma pretensa desculpa que se abriga no sistema disciplinar, nos limites educacionais, ou com a esfarrapada desculpa de que a Criança caiu da cama. Recentemente, assistimos nos noticiários essa explicação sobre os 23 machucados de um menino que, por duas ocasiões, com um mês de intervalo entre uma e outra, que ele teria caído da cama. E, na segunda vez, o cair da cama provocou o óbito dessa Criança.
Os Feminicídios são diários. Mas há um grupo de pessoas que critica a lei Maria da Penha, emitindo opiniões de descrédito nas mulheres. Hoje mais um Feminicídio veio a público. Por ter recusado fazer sexo com o companheiro naquele momento, foram 16 facadas, na frente do filho de quase dois anos, à semelhança da Juíza Viviane, também na frente de suas três filhas pequenas, também com 16 facadas. Seria 16 um número cabalístico? Não creio nessas crendices. Talvez seja o número do movimento repetitivo de cada perfuração, que leva ao cansaço muscular do braço masculino. Movimento repetitivo de perfuração que extravasa a ira de uma frustração, de uma negação. O já consagrado “não se conformou com o fim do relacionamento”.
Legitimamente, vemos crescer a campanha do “não é não”. Uma tentativa de fundar uma Cultura de Respeito à vontade da Mulher, que pode ser letal. Mas, indispensável em tempos atuais. Coragem e força para sustentar o não, sem que isso se torne um rompimento. É apenas um não. Por que será que é tão difícil de ser escutado e respeitado? E que importância tem para a formação dos filhos, meninas e meninos.
No entanto, além da dificuldade do não dito por uma Mulher a um Homem, temos uma outra forma de não entre duas Mulheres, que não se importa com o respeito. Muito pelo contrário. Parece-me que está atrelado a uma experiência de prazer pelo Poder em esmagar uma figura feminina. Diria mesmo que, possivelmente, trazendo, merecidamente, Freud à baila, transborda de uma relação ressentida e/ou oprimida com o feminino. Estou sempre me indagando sobre as Mulheres que dizem nãos poderosos e perversos a outras mulheres. Temos visto isso se repetir como a repetição das 16 facadas. Parece que não se conformam com a força de uma outra, e partem para destruir. E, destroem.
Estou me referindo a profissionais que usam, com crueldade, alguns conhecimentos psicológicos, distorcendo e destorcendo conceitos e, até mesmo, o senso comum. Sem nenhum compromisso com a verdade nem com a Ciência, sem nenhuma sensibilidade pela situação da Criança e de sua mãe, são capazes de “interpretar” ao bel prazer, preceitos e princípios científicos que deveriam ter sido memorizados, que se tornam armas letais. Monetizando o exercício da profissão, falsificam e inventam Sofismas aberrantes.

Criança com olho roxo (Foto: Arquivo pessoal/O Globo)

São muitos e muitos laudos psicológicos plenos de achismos. O olhômetro usado na acareação entre a Criança e o suspeito de práticas de abuso sexual intrafamiliar faz pensar que estamos ressuscitando o mito de que o psicólogo, olho no olho descobre o que o outro está pensando, ou, se o outro está mentindo. Olhando o/a psicólogo/a adivinha se houve ou não abuso, ignorando toda a dinâmica científica da relação abusado/abusador. Olhando. É inacreditável que esta afirmação, baseada no olho nu, tenha tamanho grau de convencimento de Magistrados.
Vale também exercer um Poder opressor ao lançar mão de seitas que humilham e quebram o Princípio básico de confidencialidade, como a infiltrada constelação familiar, sempre seguida de afirmações de bons resultados porque a Mulher não volta mais para reclamar. No lugar de enxergar que a justiça perdeu todo o sentido quando a obrigou a pedir perdão de joelhos para seu agressor, aquele que lhe deixou muitas vezes seu olho roxo ou lhe quebrou algumas costelas, que a decepção com a Instituição que deveria protegê-la ou a seu filho que agora é obrigado a conviver com seu abusador, esses “profissionais” criam o entendimento de que, para o que apelidam de “pesquisa”, o resultado é exitoso porque a Mulher/Mãe não volta mais. Seguindo esta seita, a corrente de amor não pode ser quebrada, o agressor violento ou estuprador perverso não podem sair do “seio da família”. Afinal, o agressor e o estuprador são apenas veículos de um antepassado morto da linhagem da mãe, sempre da Mulher, que, ele sim, era violento e pedófilo. E esse antepassado é descoberto pelo constelador, ali, naquela sessão esotérica. Os seus descendentes nem tinham conhecimento desse portador de comportamento criminoso. Outra expressão do olhômetro do/a psicólogo/a.
Assim, fica tudo resolvido. Encontra-se um autor morto, num passado que pode atingir cinco, seis, sete gerações em ascendência, para o crime atual. A desresponsabilização é sacramentada. A do autor. A do profissional que “viu” o verdadeiro autor, o morto.
Engana-se a céu aberto. Somos coniventes com a enganação. Na Pensilvânia foram 647 Crianças mortas até que se fizesse uma lei de proteção com a Revogação da lei de enganação. A lei de alienação parental mata. A lei de alienação parental oferece um enorme edredom que abriga criminosos e profissionais violentos. De Joanna Marcenal a Henry, quantas Crianças foram vítimas da perversidade de adultos que precisam de momentos de prazer de um Poder Absoluto?

Ana Maria Iencarelli

Ana Maria Iencarelli

Psicanalista Clínica, especializada no atendimento a Crianças e Adolescentes. Presidente da ONG Vozes de Anjos.

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