Comportamento & Equilíbrio

As aparências enganam, um serial estuprador — Parte II

O professor se mostrou muito poderoso, absoluto, para todas as suas vítimas. E excedia esse gozo de Poder ao dopar as alunas e outras moças, para ter um pedaço de carne que não reagia a nada

E o Serial Estuprador teve medidas restritivas e tornozeleira. Mas, ainda bem que a Delegada, encarregada do inquérito, entendeu que ele precisava ser preso. Ela pensou nas vítimas que não iam denunciá-lo enquanto ele estivesse livre. Essa é a situação mais comum: a vítima fica acuada, intimidada, recebendo ameaças do predador e, muitas vezes, das Instituições que levam títulos de “protetoras”, só título.
O professor de Direito de Família está preso. E agora que as denúncias não param de chegar à Delegacia, as Instituições que o abrigavam, garantindo legitimidade, prestígio, autoridade técnica, tentam se desvencilhar do fato de o terem em alto em seus quadros. É incrível. Mas insistem em dizer que não tinham nada a ver com as suas práticas macabras e bárbaras. Trabalharam juntos por mais de uma década, eram compadres e comadres sociais também, mas apressam-se em dizer que “as mães” — estigma das pessoas que ousam denunciar os estupros de vulneráveis intrafamiliares, portanto, incestuosos — ousam “tentar macular” a reputação ilibada de criminosos sexuais. Mas, seguem dobrando a aposta de que as mães são loucas, afirmando que as Instituições às quais pertencem, continuam “ilibadas”, se esquivando de se pronunciar claramente contra as práticas criminosas que se avizinhavam, e estavam no “deep solo” em que todos pisavam.

O Serial Estuprador seguiu altivo, investido de sua postura arrogante, sem algemas, para a prisão temporária, para que outras vítimas possam se encorajar para ir até a Delegacia. Tenho certeza que algumas delas, mesmo com sua prisão e depois com sua condenação, não farão a denúncia do estupro brutal sofrido. A dor de uma mandíbula deslocada ou fraturada, de inúmeros hematomas, de um corte na região vaginal que precisou ser suturado e permanecer em hospitalização, não permite que se experimente a segurança de ir relatar para a Polícia e, tomara, para a Justiça. O professor se mostrou muito poderoso, absoluto, para todas as suas vítimas. E excedia esse gozo de Poder ao dopar as alunas e outras moças, para ter um pedaço de carne que não reagia a nada. Nunca saberemos sobre suas ferramentas, seus instrumentos de tortura, os concretos. Só imaginamos por esse simulacro de Necrofilia, o primitivismo e a barbárie de sua mente que planejava e executava sequencialmente esse ritual ultraperverso.

(Foto: iStock)

Assisti a um vídeo do colunista Paulo Germano que, brilhantemente, falou sobre o que chamou de “vitrine de caça”, montada por professores para “pegar” alunas. E, precisamente, entre outras coisas que apontam para sua lucidez Ética, chama atenção para o uso da hierarquia por criminosos sexuais. As vítimas do referido professor tinham essa assimetria com a figura de autoridade, a autoridade de conhecimento e a autoridade da retaliação nas notas do curso. Já vimos isso algum tempo atrás com um tal João, líder religioso, outra hierarquia muito usada por predadores, dos pequenos aos severos. Aquele João foi denunciado por anos a fio por uma filha a quem abusava, e que nada era considerado de suas queixas. Foi necessário que uma mulher estrangeira fizesse uma denúncia de fora para dentro e uma instituição séria de defesa de mulheres vítimas de violência, se dedicasse na insistência das muitas denúncias que não atravessavam a blindagem do predador.

Com a Maria da Penha também foi necessário que a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenasse o Brasil pela omissão na proteção daquela mulher que entre outros atentados intrafamiliares, tomou um tiro que a levou para a cadeira de rodas para sempre. E, dentro da condenação ao país, havia a exigência de uma Lei de Proteção de Combate à violência contra as Mulheres brasileiras. Foi assim que construímos a Lei Maria da Penha.

No entanto, temos consciência que a existência de uma Lei, por melhor que ela seja, como no caso, não é suficiente para homens violentos e inescrupulosos, precisamos demolir essa cultura do estupro como prazer masculino. Os índices de Feminicídio crescem em progressão geométrica, apesar da Lei. Quantas mulheres são assassinadas com a Medida Protetiva de Urgência nas mãos. E quantas são espancadas até a morte depois que um juiz revoga sua Medida Protetiva, sob o argumento de que o indivíduo violento já “melhorou”. Deveria haver cobrança de Responsabilização para os agentes que cometem erros tão grosseiros, ou os que induzem aos erros grosseiros com laudos psicológicos vendidos.

(Foto: iStock)

Os homens podem ser bons e não deixam de ser homens, não perdem, ao contrário, ganham masculinidade. E as mulheres/mães não são loucas quando buscam proteção para um filho ou filha, obedecendo ao Art. 13 do ECA. A denúncia de suspeita ou confirmação de crime contra a criança, é obrigatória.
O uso da hierarquia numa pretensa conquista amorosa, a torna uma trapaça, como falou o colunista, uma arma violenta. Não precisa de muitos neurônios para localizar o prazer maior do professor de Direito de Família. Como venho refletindo, apesar dos estupros, o que inclui todos os comportamentos lascivos, inclusive sexo oral numa criança, há uma profissional que minimiza essa prática afirmando que não é nada, se efetivarem no campo sexual, o Prazer buscado pelo estuprador é o do Poder. É com a sensação gloriosa e recheada de onipotência, que inclui enganar a todos com uma postura “ilibada”, que leva ao Gozo Supremo. Essa sensação de ser superior aos pobres mortais, ludibriados debaixo do nariz, é o saldo do estupro. Para o predador, o regozijo total.

No caso do Professor de Direito de Família, função de liderança e de formação de profissionais, advogado renomado, fica a suspeita de que, talvez, houvesse um “clubinho de estupradores”. Afinal levar cenas dessa magnitude para seus pares, seria mais uma condecoração, entre tantas que já recebia. Ele já defendia abertamente, uma tese, que pais violentos e abusadores deveriam permanecer em “convivência normal” com seus filhos vítimas. Ao que era, é, seguido pelos seus correligionários em credo desse tipo de Direito de Família. Em causa própria? Em causas próprias? Uma Seita de desqualificação da mulher e das crianças. Tudo sob os auspícios da justiça e de defensores do Direito de Família? Quando teremos Responsabilizações?

Ana Maria Iencarelli

Ana Maria Iencarelli

Psicanalista Clínica, especializada no atendimento a Crianças e Adolescentes. Presidente da ONG Vozes de Anjos.

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