Economia

O novo marco do saneamento

O novo marco não é sobre privatizar a água, mas é dar a gestão do recurso para uma empresa, privada ou não, que terá de oferecer uma contrapartida para fornecer o serviço

Texto: *Luiz Felipe Magnago Blulm

Recentemente foi aprovado o novo marco do saneamento. Como tudo que envolve uma quebra de monopólio estatal, o novo marco tem sido alvo de grandes polêmicas. Majoritariamente criticado por partidos e entidades com viés mais à esquerda, entre as principais críticas estão os argumentos de que água é um direito e não pode ser privatizada e de que, com esse marco, os mais pobres serão prejudicados no acesso ao serviço.
Antes de mais nada, vamos analisar a realidade do setor hoje. Apenas 6% da rede de água e esgoto é gerida por empresas privadas, cerca de 104 milhões de pessoas não têm acesso à coleta de esgoto e 35 milhões não têm acesso à água potável. Diante desse cenário, temos no Brasil 15 mil mortes por ano e 350 mil internações graças à falta de saneamento básico. Para reverter esse cenário, estima-se que seja necessário um investimento de R$ 500 bilhões de reais, uma quantia que, atualmente, o governo não dispõe para investir e que não vai dispor tão cedo. E o que o novo marco faz para tentar mudar isso?
O marco traz o fim do direito de preferência a empresas estatais de fornecer o serviço. Além do fim da preferência, quem ganhar a licitação, seja uma empresa privada ou pública, deverá cumprir as metas estabelecidas pelo novo marco ou poderá perder o contrato. Entre essas metas 99% da população deverão ter água potável em casa até dezembro de 2033 e 90% da população com coleta e tratamento de esgoto até dezembro de 2033. O marco ainda prevê ações para diminuição do desperdício de água e aproveitamento da água da chuva.
Para a economia, o novo marco traz uma série de benefícios, ainda mais agora com a crise causada pelo novo coronavírus. Com a falta de capacidade do governo para realizar investimentos tão pesados, a abertura desse serviço para iniciativa privada pode alcançar mais de 700 bilhões de reais em investimentos e gerar por volta de 700 mil empregos no País nos próximos 14 anos. Sem contar os benefícios para saúde pública e para a vida dos brasileiros mais pobres, que são os mais afetados com a falta desse serviço chamado de básico. Há também o benefício ambiental, com a coleta de esgoto, a natureza deixará de ser o destino desses dejetos.
O novo marco não trata de uma privatização da água como alguns críticos alegam. No cenário que temos hoje as opções que temos são ou abrir para o investimento privado ou deixar mais da metade da população brasileira desamparada. Chamar um serviço de direito, por mais essencial que seja, não o torna universal, é preciso investir, ter planejamento e metas, coisas que não tínhamos antes. O novo marco abre a possibilidade para que esses investimentos aconteçam. O novo marco não é sobre privatizar a água, mas é dar a gestão do recurso para uma empresa, privada ou não, que terá de oferecer uma contrapartida para fornecer o serviço, que são os investimentos e o cumprimento das metas. Quanto à crítica de que o novo marco vai prejudicar os mais pobres, vale ressaltar que são exatamente eles que são os mais prejudicados com a falta desse serviço.
Há uma famosa frase que diz “Insanidade é continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes”. O novo marco é uma tentativa de obter resultados diferentes, visto que, ano após ano, o investimento do governo nesse serviço básico vem sendo reduzido. Pode ser que o novo marco não alcance totalmente as metas estabelecidas, mas certamente trará uma melhora muito bem vinda e necessária para a população brasileira.

Luiz Felipe Magnago Blulm
Administrador pela Ufes, Mestre em Administração pela Fucape, graduando em Ciências Econômicas pela Ufes e membro do Grupo de Estudos de Políticas Públicas

Related Posts

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

EnglishPortugueseSpanish