E o adolescente? Momento da mistura da liberdade e dependência — Final

Uma das mudanças que geram insegurança na adolescência se deve à angústia corporal
Um grande mal-estar na adolescência se deve à angústia corporal. As transformações do corpo se dão de maneira muito intensa e rápida. Não é possível escondê-las. Os seios crescem muito rápido, e atraem olhares que não sabe lidar ainda. A voz fica grossa e, de repente, mais fina que a voz que tinha na infância. Tudo exposto a todos, principalmente, àqueles adultos familiares que passam a fazer “piadinhas” de constrangimento sobre este crescimento. Este comportamento, ao contrário de sua defesa, é vexatório para o adolescente, mas é muito frequente e super bem tolerado por todos. Há até os que o defendem dizendo que é para desinibir o adolescente. As maneiras de exercer o Poder sobre um vulnerável são as mais variadas. As pessoas não gostam de perder uma oportunidade do exercício do Poder sobre o outro, em especial, as imaturas.
O corpo que muda a cada dia, de maneira veloz, deixa no adolescente a desconfortável sensação de descontrole, e de impotência sobre esta ausência de controle. Não é à toa que o adolescente busca tantas situações de sensação de onipotência compensatórias desta angústia sobre o corpo. Não controlar o aparecimento das poluções noturnas, equivalentes à vergonha dos episódios de enurese noturna da infância, causa muito constrangimento e vergonha. Ou a menarca, a primeira menstruação, que é propagada a toda a família. Não há como controlar, ou deter, estas “provas” da introdução na vida adulta.
Esta angústia corporal tem reflexos na mente que se sente sendo oprimida por algo que não tem ingerência. A incerteza é um fator diuturno, a ilusória sensação de controle que conquistou na infância dentro de parâmetros ditados pelos adultos, não mais funciona. Como administrar esta experiência que se passa no corpo, quando não se tem ainda a maturidade suficiente para tolerar esta opressão do incontrolável?
À medida que a adolescência avança, a experiência vai tecendo a maturidade. Aos poucos. O adolescente vai aprendendo a suportar, cada vez um pouco mais, este movimento do corpo e da mente. Há um tempo de adolescência, que não é só cronológico. Ele tem variações peculiares a cada história de vida.
Mesmo sendo saudável e necessário o término da adolescência, ela vai nos acompanhar a vida toda, dando viço e vigor a novos projetos que abraçamos. Assim como é importante mantermos viva a criança com suas brincadeiras, que existe dentro de nós, e que não nos permite envelhecer a mente, é, igualmente, importante alimentar a permanência de um espaço mental para o adolescente que fomos. A atração pelo novo trará o tempero para o enraizamento no conhecido estabelecido, encorajando mudanças que serão saudáveis.
Claro que não estou aqui fazendo apologia da eterna adolescência ou do rompimento de uma adolescência tardia, com todas as consequências, por vezes, desastrosas porquanto já tendo compromissos adultos que são lançados pelo ar nestas ocasiões regressivas. Além do quase ridículo de homens e mulheres maduras se comportando, inconsequentemente, como adolescentes, por uma briga pessoal com o narcisismo abalado pelo tempo.
Esta discrepância entre o tempo cronológico e o tempo psicológico transborda, em muito, a aparência da inadequação engraçada. A inconsequência da adolescência não cabe mais na vida adulta. Mas, quantas vezes assistimos esta cena continuada em algum dos nossos entornos. Como também assistimos os prejuízos deste comportamento refletido nos filhos adolescentes destes atrasados no tempo. Parece que, ao constatar que o tempo passou, o filho ou a filha estão na adolescência, é acionado um mecanismo de defesa de negação desta realidade, um botão da competitividade entra também em funcionamento e tudo se faz de maneira que é difícil ter consciência do próprio negacionismo. Vemos mães invadirem o guarda-roupa da filha, pais virarem “brothers” da turma do surf, sem a menos cerimônia.

A consequência danosa deste comportamento negacionista de adultos é que ele vai abortar a adolescência do filho ou filha. O que pode acarretar uma repetição lá na frente. Ou seja, o padrão vivido pelo lado da adolescência frustra por um pai ou uma mãe que “adolesceram” tardiamente, pode oferecer esta possibilidade para este adolescente que teve esta sua etapa sonegada. E a repetição em ciclo venha a acontecer, com prejuízos também em repetição.
O medo e o risco devem ser vividos em seu tempo. Libertar-se da infância, buscar o novo, arriscar mais que um malabarismo motor infantil, correr o risco de ser criticado pelos seus ícones afetivos, mãe e pai, tudo isso misturado com uma sólida dependência do pertencer a uma “tribo” que se identifica, é indispensável. A liberdade e a dependência que caracterizam este rico período do desenvolvimento, devem ser esgotados na medida do possível e do saudável. Esta é uma prevenção para construção de uma vida adulta plena.