Visão dupla pode ser causada por trauma, AVC e até uso de droga
A diplopia, conhecida popularmente como visão dupla, não é uma doença, mas, sim, um sintoma. Ela ocorre quando uma pessoa enxerga uma única imagem como se fossem duas sobrepostas, ou seja, imagens não alinhadas — tanto na horizontal como na vertical.
O problema desse sintoma, além de ser incômodo e dificultar a visão com profundidade, é que ele pode ser muito perigoso e trazer riscos não só para quem sente, mas também para quem está perto. Imagine que você está dirigindo no trânsito e começa a ver dois carros na sua frente, sendo que na verdade só tem um, ou está cozinhando com uma única panela no fogo e, ao invés de uma, começar a ver duas. O estrago pode ser grande.
O funcionamento da visão e a diplopia
“Os olhos são duas câmeras muito eficientes. Olhos saudáveis captam a imagem, convertem ela em sinal elétrico e levam para o cérebro. Então, imagens e luz são acomodadas pelas lentes, viajam dentro do olho nos meios transparentes, e a retina faz essa conversão de sinal, transforma o que era luz, imagem, cor, forma, profundidade em sinal elétrico, que é compreendido pelo cérebro. E ele registra isso no nível da nossa consciência e conecta com as informações prévias que a gente tem, a nossa memória visual”, explica Eduardo Melani Rocha, professor do Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP).
No entanto, quando esse sistema de mecanismo é abalado, há qualquer problema ocular ou outra doença relacionada, alguns sintomas podem surgir. Esse é o caso da diplopia, que é, principalmente, um sinal de alerta.
Thaís Helena Moreira Passos, oftalmologista do Hospital de Clínicas da Unicamp da Universidade Estadual de Campinas e do Hospital Estadual Sumaré, ressalta que “se uma pessoa tem visão pior em um dos olhos, o cérebro tem a capacidade de escolher qual imagem é melhor, e ‘filtrar’ a imagem do outro olho, de forma que, dificilmente a pessoa vai ter visão dupla e, sim, monovisão, com supressão do olho com menor acuidade visual”.
A diplopia ocorre quando os olhos enxergam normalmente, mas não conseguem trabalhar juntos por alguma razão. Dessa forma, as imagens captadas começam a ficar diferentes uma da outra, e o cérebro perde a capacidade de interpretação. Esse sintoma pode ter alterações perceptíveis, como estrabismo espontâneo, da mudança de conformação orbitária (com o olho mais fundo ou para fora) ou não apresentar nenhum aspecto visual. Isso vai depender das causas.
Segundo os especialistas, ela atinge, principalmente, os adultos e, muitas vezes, melhora de forma espontânea. Há dois tipos de diplopia: a monocular, quando o sintoma se dá através de um olho só, e a binocular, quando atinge os dois olhos.
“Se essa visão dupla vem associada a sintomas como fraqueza muscular, náuseas, vômito, dificuldade para andar, falar, mastigar ou engolir, são sinais de mais atenção, porque muitas vezes (a diplopia) pode estar associada a causas neurológicas ou neuromusculares, e daí merece um atendimento mais rápido mesmo. Nesses casos precisa ser avaliado por um oftalmologista ou neurologista”, explica Emerson Castro, oftalmologista do Hospital Sírio-Libanês (SP).
Causas da visão dupla
Problemas oculares
Os problemas e doenças oculares que podem ser causadores da diplopia são: lente intraocular deslocada; miopia; astigmatismo — dependendo do grau; ceratocone; catarata; estrabismo; olho torto; alterações na retina.
Outra doença que pode causar diplopia é a orbitopatia de graves, que é uma alteração da órbita, provocada por uma doença da glândula tireoide, que leva a alterações dos músculos oculares. E, às vezes, a agressão é tanta que pode restringir a movimentação muscular.
Além disso é importante entender que os músculos extrínsecos do olho, os que fazem os olhos virarem de um lado para o outro, precisam trabalhar sempre em conjunto e superalinhados. “Se tivermos qualquer problema nesses músculos ou na atividade conjunta, pode aparecer a visão dupla. Isso pode acontecer por um trauma, por exemplo, quando um músculo é roto durante um acidente, ou quando fica preso entre os ossos numa fratura de órbita ou até mesmo pelo uso de algumas substâncias como a toxina botulínica”, destaca Thaís Helena, ressaltando a importância do cuidado na hora de escolher o profissional para aplicar o tão sonhado botox.
Contudo, na maioria dos casos, quando o sintoma não está relacionado a graves doenças, apenas relaxar a musculatura do olho, ou seja, descansar a visão, e olhar para longe já melhora o quadro.
Tumores e AVC
Alguns tumores na órbita podem causar diplopia por deslocar um olho da posição habitual ou dificultar a movimentação dos músculos oculares. Nesses casos, o tratamento é mais difícil, porque o sintoma está diretamente associado ao tumor ou ao AVC, logo, a cura depende também da regressão da doença.
“Você pode dar óculos com prisma, que são lentes especiais para tentar desentortar esse olho, pode fazer cirurgia, você pode aplicar toxina botulínica (botox) no músculo do olho. Então o tratamento vai desde nada até cirurgia e toxina botulínica. Mas essas causas são mais complicadas, nem sempre conseguimos melhora do quadro”, afirma Castro.
Doenças preexistentes e neurológicas
Os pacientes diabéticos também podem desenvolver uma alteração que entope os vasinhos que mexem com os nervos e, consequentemente, os músculos do olho. Hipertensão arterial e colesterol alto também podem fazer surgir esse sintoma.
O professor Eduardo Rocha ressalta que, assim como todo o processamento da imagem é feito no cérebro, o mecanismo do controle de movimento (para montar a imagem) também, numa estrutura chamada tronco cerebral. “É do tronco cerebral que saem os nervos que vão enervar os músculos do olho. Doenças vasculares, arteriosclerose, colesterol muito alto, infarto, derrame podem levar a má irrigação dessa região específica, e num determinado momento, o indivíduo ficar estrábico, com diplopia e com o músculo e o nervo funcionando mal, porque ele está mal irrigado de sangue e recebendo pouco nutriente”, esclarece Rocha.
Além disso, algumas doenças neurológicas também entram nesta lista. Isso porque elas podem desestruturar a função neurológica dos nervos que enviam as informações para a movimentação ocular, como acontece na esclerose múltipla. Outra situação que também pode causar esse sintoma é a miastenia gravis, uma doença autoimune causada por uma disfunção do sistema imunológico, em que a comunicação entre os nervos e os músculos é afetada causando fraqueza muscular. Entre outras coisas, essa doença tem como consequência deixar as pálpebras caídas e fracas e a diplopia. Nesses casos, a doença preexistente precisa ser tratada para melhorar o sintoma.
Uso de drogas
O uso de drogas também pode resultar em diplopia. A recomendação dos especialistas é parar completamente de usar para que os efeitos colaterais desapareçam. Os oftalmologistas afirmam que a diplopia é um sinalizador de que algo pode estar errado com a saúde. Portanto, se você está com visão dupla, procure um médico o mais rápido possível para começar uma investigação.
Fonte: UOL