Comportamento & Equilíbrio

Dia das Crianças! E os 130 mil…

Quem conhece uma Criança que perde o pai ou a mãe para a morte, sabe do que está sendo tratado aqui. Ter a vida do pai interrompida quando ainda se é Criança é muito doloroso

Mas, e as mais de 130 mil crianças órfãs da covid-19? Precoce orfandade. Será que são mesmo 130 mil? Mais? Menos? Onde estão? Quem são? Como passaram o Primeiro Dia das Crianças sem seus pais, sem suas mães? Mas, e as Crianças que estão sob o Regime de Privação Materna Judicial pela lei de alienação parental? Parece que são mais de cinco mil. Ninguém sabe também. Foram entregues a seus agressores como punição à Mãe que denunciou abuso sexual intrafamiliar ou violência doméstica.
Mas, e as Crianças que estão em situação de “insegurança alimentar”? Nome bonito para dizer da fome. Uma comida para o Dia da Criança. Um brinquedo? O imaginário está com fome. É melhor não gastar energia com sonho.
Ser Criança é uma beleza! Não é tão fácil quanto parece, vida de Criança, para a Criança, é muito dura. E falamos de condições normais. Ter que crescer e perder os privilégios dos pequenininhos. Todos os dias buscar novas respostas sobre o mundo, todos os dias ter que cumprir o que adultos dizem que é para o bem dela, sem que consiga alcançar esse “bem”. Por que estudar? Por que tomar banho? Por que comer cenoura e espinafre? Por que ir dormir quando ainda quer brincar mais? Por que cumprimentar outros adultos que mal conhece? Tudo isso, e muito mais, lhe é repetido diariamente. Mas, somos obrigados a ouvir que mães programam a cabeça de seus filhos para que eles rejeitem o pai, só por vingancinha. Como será que essas mães conseguem implantar esse chip, se nem o que é repetido diuturnamente é decorado? Qual seria essa mágica? É a tal da “implantação de falsas memórias”, propagada como tendo pesquisas “comprobatórias”, o que não consta, cientificamente. Nesse ponto caímos naquela equação: pseudociência/Ciência, mentira/verdade.

(Ilustração: Brunna Mancuso/CNN Brasil)

O Estatuto da Criança e do Adolescente, ECA, reza em seus Artigos 3º, 4º, 5º, e 7º, todos entre muitos outros, pelos Direitos Fundamentais, pela Proteção Integral da Criança. E, enquanto indivíduo em formação, portanto, vulnerável, é dever de TODOS proporcionar as condições que proporcionem seu pleno desenvolvimento.
E, a nossa Carta Magna nos determina: “Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à Criança e ao Adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e ao convívio familiar e comunitária, além de colocá-la a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. Mas, os 130 mil órfãos da covid-19 me maltratam. Quem vai garantir os Direitos Fundamentais dessas Crianças e Adolescentes? Vale ressaltar que os pais são os mantenedores de seus filhos. Na ausência deles, há que se garantir, minimamente, a sobrevivência básica. Não vi nenhum pequeno traço de RESPONSABILIDADE DEVIDA para com esses órfãos. Nada. Diria mesmo que essa é mais uma forma de violência transparente, avassaladora em suas sequelas irreversíveis.

(Ilustração: Brunna Mancuso/CNN Brasil)

Quem conhece uma Criança que perde o pai ou a mãe para a morte, sabe do que está sendo tratado aqui. Ter a vida do pai interrompida quando ainda se é Criança é muito doloroso. Ter a mãe subtraída quando se tem poucos anos, é o desamparo absoluto. Muitas entre essas Crianças tiveram pai e mãe retirados abruptamente por um vírus invisível. Para a Criança, que ainda nem acedeu à noção de morte de maneira completa, esta é a vivência da amputação de um ou mais membros. Uma mutilação irreparável que marca com uma sombra sempre à espreita.
Onde está o Estado? Onde está a nossa reponsabilidade? O que podemos fazer? São mais de 130 mil Crianças e Adolescentes.
Na próxima semana daremos continuidade às reflexões sobre a Injustiça e a Ecolalia. Mais um jovem está preso há 11 dias sob acusação de ser filho de um traficante que já está preso. O “ponto” é que o pai do jovem, músico de uma Igreja e funcionário com trabalho regular, tem o mesmo nome do traficante que é pai de outro jovem. Não foi olhado o nº de CPF, nem a filiação do pai, os avós do garoto que tem 21 anos, que está esperando o final do feriadão para que seja apreciado seu pedido de Habeas Corpus.
Estamos mesmo cumprindo nossas leis? E que leis são feitas para serem obedecidas? Como explicar para as Crianças e Adolescentes que a Justiça é para todos?
Mesmo assim, há justos na Justiça.

(Ilustração: Brunna Mancuso/CNN Brasil)
Ana Maria Iencarelli

Ana Maria Iencarelli

Psicanalista Clínica, especializada no atendimento a Crianças e Adolescentes. Presidente da ONG Vozes de Anjos.

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