Comportamento & Equilíbrio

Precisamos falar sobre Moïse e Henry — Parte VI

Vivemos a tirania da Positividade Tóxica, mas o discurso do ódio tem corredores escorados na “liberdade de expressão”

A Barbárie que acometeu Moïse e Henry é uma fratura exposta de vários ossos ao mesmo tempo. Denuncia o vigor da estupidez, do comportamento subanimal, a prevalência do irracional. Quando não somos os autores de Sofismas maliciosos, somos presas fáceis desses Sofismas e os seguimos como se dogmas fossem. Deixar-se enganar parece que aciona a preguiça de pensar, de se posicionar. É claro que é muito difícil se opor à eloquência ameaçadora de manipuladores. Diante de intimidações que vão desde a rejeição, passando pelo xingamento velado de que comemos capim, até a ameaça de morte, muitos sucumbem e se autodesculpam pensando aquele “não tenho nada a ver com isso”, silenciando e recuando, ou, até, aderindo ao manipulador. Mais um seguidor, hoje um “título” que, saindo da flutuação semântica, enraizou-se na língua social. Os demônios, todos, liberados, e a ideologia do “endemoniar”, ou demonizar alguém, porque pensa diferente, à solta.

Positividade tóxica (Foto: iStock)

Vivemos a tirania da Positividade Tóxica, mas o discurso do ódio tem corredores escorados na “liberdade de expressão”. Ou seja, somos obrigados a distribuir perdão para todos os lados, mas somos escorraçados ao expormos um questionamento que seja. Pode-se falar o que quiser, mas não se pode pensar diferente. Paradoxo de difícil compreensão. Tomando a liberação tão ansiada dos Cassinos, apreende-se que a falácia de aumento do turismo, aumento dos empregos, arrecadação de mais verbas para a Educação, a Saúde e a Segurança Pública, despreza a realidade da ausência de sustentação dessas ilações. Ninguém se importa com o aumento da doença adicção, a dependência que corrói indivíduos e seus familiares, o uso ilícito das tais “verbas” da jogatina. Nas instalações de Cassinos, os Jogos de Azar são protegidos de qualquer brisa de desistência que possa contaminar o jogador. Construídos dentro de Hotéis de luxo, os Cassinos são projetados para empurrar todos os jogadores, os dependentes e os curiosos, para as mesas de jogo. A arquitetura prevê uma única porta que dá acesso ao verdadeiro labirinto, em sequência de ofertas de delírios de sorte. Não há portas de saída em cada salão. Se há um arrependimento, ele tem que conduzir com força o jogador para a única porta de saída passando de novo por todos os estímulos a “tentar” mais uma vez. Não acredito que seja ingenuidade afirmar que a abertura de Cassinos trará progressos.

Violência contra a criança (Foto: Reprodução)

A vulnerabilidade de Crianças, Mulheres e jovens PPP, (preto, pobre e de periferia), é o motivo de mortes bárbaras. Mas só temos parcas estatísticas de assassinatos de Mulheres, talvez pelo respaldo da Lei Maria da Penha. Essa Lei não conseguiu minorar a violência, mas, pelo menos, consegue nos fornecer alguns números. O Brasil é o 5º País em Feminicídio, uma Mulher a cada sete horas, segundo os dados que chegam a ter registros. E uma Mulher é estuprada a cada 10 minutos. Há alguns anos, a Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência (Abrapia), que foi talvez a 1ª ONG, enquanto eu estava na presidência chegou ao dado estatístico de que uma Criança era estuprada a cada oito minutos. Qual será o número agora que os abusadores gozam da cobertura jurídica da lei de alienação parental para se esconder nisso que se tornou um dogma? Dos jovens PPP, ninguém tem nenhuma vaga ideia. Mas, não somos racistas. Assim como não somos machistas.

Numa Potência Armada, recentemente, uma Lei foi apresentada por duas deputadas e duas senadoras, e já assinada pelo presidente, descriminalizando a violência doméstica. Agressões que não resultem em fraturas não são mais consideradas crimes, têm redução de pena para 15 dias, antes, dois anos, ou pagamento de multa apenas. A “justificativa” é que essa liberação da agressão se faz necessária na defesa do Direito do Homem de disciplinar os filhos e a mulher. Palavras do Presidente desse País.
No último dia 11 de março, fui convidada pelo Presidente do Senado a estar no Lançamento da Rede Equidade. Esse é o conceito mais adequado para atender reivindicações de gênero, posto que diferencia as peculiares necessidades para dirimir as desigualdades. Não é igualdade. É equidade. Mas será que, após todas as Recomendações, já ratificadas pelo Brasil, de Instituições Internacionais, OMS, ONU-Direito da Criança, Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH-OEA), Pacto de San José, Convenção de Belém do Pará, Convenção para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), e de Instituições Nacionais, ECA, C.F. CNS, Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), Conselho Federal de Psicologia (CFP), Representações da Sociedade Civil, que buscam combater a violação dos Direitos da Criança, a Rede Equidade, por exemplo, conseguirá dar abrigo e proteção EFETIVA às Mulheres e Crianças vitimadas pela Violência Intrafamiliar? Que aquele “papel” a Medida Protetiva, não seja encontrado na mão da Mulher que rompeu o relacionamento abusivo, e, por isso, tomou 16 facadas? Leis não faltam. Mas também não falta a barbárie contra vulneráveis.

Há poucos dias, aconteceu mais uma comoção de revolta contra um filme que trazia a Pedofilia à tela. Bastante fidedigno, mostrava o horror do que Gardner, inventor da alienação parental, defendia como sendo normal, como fazendo parte do repertório natural da sexualidade humana. (Pp. 24 e 25 de seu livro “True and false accusations of child sex abuse”). Em meu canal de YouTube, (anamariaiencarelli) tem uma sequência de afirmações aberrantes e perversas que esse guru da alienação parental escreveu. Esta é uma barbárie que foi consagrada como dogma jurídico. A naturalização da Pedofilia, é um objetivo e está contida no pensamento de Gardner, e, portanto, em sua tese de que é alienação parental toda denúncia de incesto. Uma mãe histérica que falhou nas obrigações matrimoniais, segundo esse autor. Para ele, se o pai abusa de um filho ou filha, a culpa é da mãe, e ela deve aceitar o abusador de sua Criança.

Cena do filme ‘Como se tornar o pior aluno da escola’ (Foto: Reprodução YouTube)

O tal filme que expõe cenas de Pedofilia, em humor grotesco, tem quatro anos de feito e licenciado pelo Ministério da Justiça. Por que agora ele é recortado e lançado como vírus na internet? Onde estavam as pessoas que estão, agora, pedindo sua censura? Por que essas mesmas pessoas não se juntam às Representações da Sociedade Civil para pedir PROVIDÊNCIAS EFETIVAS para os vídeos pornográficos de Crianças e Bebês que estão na deep web? Por que a Sociedade como um todo não se responsabiliza pela Exploração Sexual Intrafamiliar?
Nego-me a acreditar que as pessoas, do Direito, da Psicologia, do Serviço Social, tenham lido o que Gardner afirmou e defendeu. As milhares de Crianças e suas mães não estariam submetidas à tortura intrafamiliar nesse Holocausto doméstico, consentido por todos.

Ana Maria Iencarelli

Ana Maria Iencarelli

Psicanalista Clínica, especializada no atendimento a Crianças e Adolescentes. Presidente da ONG Vozes de Anjos.

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