Ciência Meio ambiente

Macaúba pode substituir soja na produção de biodiesel

Estudo aponta viabilidade econômica da planta nativa consorciada com pastagens gerando ganhos em sustentabilidade e segurança alimentar

A macaúba, uma palmeira nativa, mas ainda pouco explorada comercialmente pode ser a chave para o Brasil aumentar a sua produção de biodiesel sem a necessidade de abrir novas áreas ou competição com culturas destinadas à alimentação, como a soja. Com uma produção cinco vezes maior de óleo, a árvore tem capacidade de contribuir para a recuperação de pastagens e áreas degradadas, sendo também uma alternativa para aumentar a rentabilidade em fazendas pecuárias do País.

“A macaúba é uma estrela. Quando Deus fez a macaúba esqueceu de colocar defeitos”, brinca a doutora em gestão e economia florestal Silvana Ribeiro Nobre, responsável pela elaboração do estudo “Viabilidade da macaúba para a produção de biocombustível”, encomendado pelo WWF-Brasil.

Considerando-se uma demanda de 11,5 bilhões de litros de biodiesel em 2030 para atender às determinações do Programa Nacional de Biocombustíveis, o levantamento destaca que seriam necessários 11 milhões de hectares de soja para produzir todo o biodiesel necessário para a abastecer o mercado brasileiro — cerca de dez vezes a área atual, estimada em 1,6 milhão de hectares pela Conab.
Já no caso da Macaúba, a área necessária para garantir o mesmo abastecimento seria 81,8% menor, de apenas dois milhões de hectares. A espécie chega a produzir seis mil litros de óleo por hectare ante 500 obtidos com a soja, que hoje responde por 70% da matéria-prima usada na produção de biodiesel no País. Associada ao cultivo em sistemas integrados, a maior produtividade da palmeira permitiria até mesmo suprir as importações brasileiras do combustível fóssil — hoje ameaçadas por uma crise global de oferta.

Macaúba (Foto: Embrapa/Daniela Collares)

“A gente tem área suficiente de pecuária para produzir junto com a macaúba e ainda aumentando a produtividade da pecuária porque a macaúba, além de produzir na área de pecuária, ela melhora as condições do solo, melhora a condição de retenção de água, o sistema radicular dela é excelente e ela pode ser produzida na área de cerrado inteira do Brasil”, observa Silvana ao destacar os 60 milhões de hectares destinados à pecuária no País e a aplicabilidade da macaúba em áreas degradadas onde, hoje, avançam o uso de técnicas regenerativas.

Segundo dados do Mapbiomas, o percentual das áreas de pastagem com sinais de degradação no Brasil passou de 70% em 2000 para 53% em 2020, com avanços ainda mais significativos entre as áreas severamente degradadas, cujo percentual caiu de 29% para 14% no mesmo período (22,1 milhões de hectares).

“Naturalmente isso já está acontecendo, a melhoria das pastagens degradas está lá no Mapbiomas, você entra na plataforma e constata isso. É uma tendência nacional, o que é uma notícia ótima porque a macaúba vai entrar em sinergia com essa tendência que já existe de melhorar as pastagens”, avalia Silvana.

Macaúba mantida pela Embrapa Cerrados em seu banco ativo de germoplasma com mais de 105 cultivares da espécie (Foto: Zineb Benchekchou/Embrapa)

A partir dos dados de recuperação de pastagens, a pesquisadora elencou as regiões prioritárias para o plantio da macaúba considerando infraestrutura de acesso e a probabilidade de interesse dos produtores pelo cultivo da palmeira. Distribuídas entre Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás, elas têm em comum justamente o avanço da agricultura sobre as áreas de pecuária e, em alguns casos, o aumento de cobertura vegetal com florestas.

“Quando alguns produtores melhoram a condição das pastagens isso torna mais fácil para os outros também melhorarem porque esses vizinhos vão ter esses exemplos, o que é importantíssimo quando a gente pensa em extensão rural”, lembra Silvana.

O foco em áreas de pecuária tem outra vantagem: além de contribuir com a recuperação da pastagem, a torta de macaúba resultante da extração do óleo também pode servir de alimento para o gado, reduzindo a dependência do milho e do farelo de soja que, a cada ano, pesam mais na planilha de custos de pecuaristas do mundo todo.

“O lugar natural dela é justamente a pastagem. Ela casa tão bem com pastagem que é difícil pensar que a macaúba vai se expandir numa área exclusiva pra ela porque isso não é nem atrativo para o produtor”, observa o coordenador de conservação do WWF-Brasil, Ricardo Fuji.

Tais características fazem com que a macaúba consiga contribuir, simultaneamente, para a segurança energética e alimentar, reduzindo a pressão sobre a cadeia da soja e do milho em meio a preços recordes dos grãos no mercado interno e externo. Nativa, a árvore é uma espécie imune às oscilações do mercado internacional e poderia contribuir com a criação de uma nova cadeia de valor para o agronegócio brasileiro, segundo apontam os pesquisadores.

“Essa demanda não vai concorrer com a produção de alimentos justamente porque ela vai se consorciar e a tendência natural é se consorciar com a pecuária e sem diminuir a produtividade, pelo contrário, vai aumentar”, pontua Fuji.

Fonte: Um Só Planeta

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