Educação

Escola quilombola recria clássicos infantis a partir da identidade da comunidade

Projeto “Historinhas do Quilombo” transforma Chapeuzinho Vermelho em Chapeuzinho Afro e reescreve outras histórias clássicas valorizando as crianças e os jovens do território quilombola de Mata Cavalo (MT)

O território quilombola de Mata Cavalo está localizado no município de Nossa Senhora do Livramento, a 50 quilômetros da capital do Mato Grosso, Cuiabá. Nossa comunidade, que é descendente de africanos escravizados, tem aproximadamente 500 famílias. Juntos, lutamos para manter a cultura e as tradições quilombolas.
A Escola Estadual Quilombola Tereza Conceição Arruda tem tido um papel importante nesse sentido. Ela passou a ser caracterizada pela Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso como unidade de ensino de educação escolar quilombola no ano de 2011, e recebeu esse nome em homenagem à professora Tereza, primeira educadora quilombola da comunidade, e uma das precursoras da educação formal em Mata Cavalo.

O currículo espelha o que preconiza a legislação a respeito da educação escolar quilombola: a escola deve se apresentar como a escola do lugar, não apenas no lugar. Ou seja, oferecendo atividades e metodologias que contemplam e valorizam os saberes e fazeres locais, a oralidade e a ancestralidade, fazendo com que os estudantes não se sintam invisíveis e desconexos da sua realidade. Rompemos com os paradigmas eurocêntricos, que sempre permearam a educação pública, inclusive nos territórios quilombolas.
Nosso foco está em trazer para dentro do espaço escolar os saberes e fazeres da comunidade e articulá-los com os conhecimentos científicos. Para levar esse discurso à prática, professores da escola realizaram uma formação em etnossaberes graças a uma parceria com o Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Escolar Quilombola, da UFMT (Universidade Federal do Mato Grosso), entre 2017 e 2021.

No vídeo abaixo, explico a definição

“Historinhas do Quilombo”
Um dos projetos que está sendo realizado na escola neste ano de 2022, a partir da abordagem dos etnossaberes, é a reescrita de clássicos da literatura infantil. Cientes da carência de acervo literário que potencializassem o protagonismo de personagens quilombolas/negros nos contos infantis e percebendo a necessidade de se trabalhar a melhoria da aprendizagem da leitura, escrita e interpretação de texto, iniciamos o projeto “Historinhas do Quilombo” com a reescrita de histórias como “Branca de Neve e os Sete Anões”, “Chapeuzinho Vermelho”, dentre outros. Nossa proposta é quebrar estereótipos de base colonialistas, racistas, sexistas e machistas, presentes, historicamente, na maioria dos livros de literatura infantojuvenil trabalhados nas escolas, inclusive, nas escolas quilombolas.

As histórias dos clássicos infantis estão sendo reescritas com ênfase nos traços específicos das crianças e jovens da comunidade, a fim de contribuir para a valorização das ideias de negritude, empoderamento e resistência, da luta dos quilombolas e suas estratégias de libertação em relação aos processos de subalternização a que fomos submetidos historicamente.
A ideia principal é possibilitar aos pequenos e pequenas a vivência da própria história, contribuindo dessa maneira para a construção positiva de sua subjetividade, de sua autoestima, de sua formação crítica e reflexiva acerca da temática étnico-racial, cumprindo assim o que determinam as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Escolar Quilombolas

O documento certifica que os discentes quilombolas devem ter acesso a história, cujo alicerce tenha referências nas vivências e experiências das/dos estudantes da comunidade quilombola, mostrando a beleza negra, a reconstrução da cultura silenciada, a afirmação dos cabelos crespos/cacheados, o respeito pela ancestralidade, a luta, a resistência e o empoderamento das comunidades quilombolas e das populações negras.
As personagens já reescritas e trabalhadas na escola foram “Negra Bela e os sete Pantaneirinhos”, escrita a partir da história de “Branca de Neve e os Sete Anões” e “Chapeuzinho Afro”, escrita a partir do clássico “Chapeuzinho Vermelho”. Essas histórias trabalham a valorização do território quilombola, realçando a beleza paisagística do lugar, a estética da negra/quilombola é exaltada, e a luta quilombola ganha espaço.

Para a leitura das histórias, as crianças são convidadas a sentar em roda na sala toda decorada, e os contadores vêm caracterizadas dos personagens, contando a história com entonação e muita criatividade. Os olhos dos estudantes brilham. Isso vem contribuindo bastante para a melhoria na leitura e escrita, pois também são trabalhados interpretação de texto e atividades escritas a partir da história.

Fonte: Porvir

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