Segurança jurídica — Continuação
Um dos princípios que regem a atuação do juiz é a imparcialidade, já que nosso sistema penal tem como dogma o princípio do contraditório
Coluna — Na Minha Opinião
Há 15 dias tivemos a oportunidade de falar sobre a segurança jurídica, onde esclarecemos ser um princípio jurisdicional a estabelecer que o direito deve oferecer, àqueles a ele sujeitos, a capacidade de regular suas condutas de maneira razoavelmente previsível e estável.
A insegurança jurídica é uma situação que ninguém deseja viver no país. Ainda dissemos que a previsibilidade e a estabilidade devem ser marcas indeléveis de um sistema jurídico ideal. No Brasil de hoje estamos presenciando mudanças pontuais da interpretação do direito pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o que gera insegurança jurídica.
Nosso desejo foi chamar a atenção para uma decisão do STF tomada recentemente pelo ministro Alexandre de Moraes, que causa insegurança jurídica. É que a Constituição Federal de 1988 inaugurou, no nosso País, o sistema do contraditório, onde a ação penal pública foi reservada como atribuição exclusiva do Ministério Público.
A separação das competências de cada ente torna claro e evidente que, ao Judiciário, foi definido o poder de julgar, que é incompatível com o poder de acusar ou de produzir provas. Um dos princípios que regem a atuação do juiz é a imparcialidade, já que nosso sistema penal tem como dogma o princípio do contraditório.
Mas, infelizmente, o Supremo Tribunal Federal virou as costas para a nossa Carta Magna e declarou ser constitucional o seu Regimento Interno, no seu “Art. 43. Ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do Tribunal, o Presidente instaurará inquérito, se envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, ou delegará esta atribuição a outro Ministro”.
A utilidade do inquérito policial é subsidiar a ação penal, ou seja, o inquérito tem como finalidade carrear provas para a futura ação penal que, no caso dos crimes de ação penal pública, só pode ser proposta pelo Ministério Público.
Porém, o ministro Alexandre de Moraes indeferiu o pedido de arquivamento da Procuradoria da República em um processo que apura notícias falsas atribuídas ao Presidente da República. No dia 05 de agosto de 2022 o ministro Alexandre de Moraes, do STF, rejeitou um pedido da Procuradoria-Geral da República para arquivar a investigação que apura se o presidente Jair Bolsonaro (PL) divulgou dados sigilosos sobre um ataque hacker contra Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
No dia 1º de agosto de 2022 a vice-Procuradora-Geral da República, Lindôra Araújo, afirmou que Moraes violou o sistema acusatório ao ordenar novas medidas de apuração no caso, apesar de um pedido anterior de arquivamento feito pelo PGR, Augusto Aras.
A pergunta que se faz é: se o Ministério Público é o titular da ação penal e somente Ele pode dar início a um processo criminal, de que adianta o Supremo Tribunal Federal se negar a arquivar as investigações? A resposta é bastante perturbadora.
É que o ministro Alexandre de Moraes pode estar apostando numa providência que já funcionou em momento anterior, cuja culpa pelo resultado é do próprio Ministério Público. Em 16 de abril de 2019, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, considerou ilegal o inquérito aberto pelo Supremo e pediu o arquivamento das investigações. Mas o ministro relator, Alexandre de Moraes, negou o pedido e o inquérito continua em andamento.
A ex-Procuradora-Geral da República enviou ofício ao ministro Alexandre de Moraes, pedindo, além do arquivamento da investigação sobre ofensas a ministros, a anulação de todos os atos praticados no âmbito da investigação, como buscas e apreensões e a censura a sites. Na verdade, ela usou um termo mais forte: disse que estava promovendo o arquivamento.
Entretanto, o novo Procurador da República Augusto Aras, promoveu denúncias amparadas em provas obtidas nas investigações que sua antecessora promoveu o arquivamento.
Com esse conduta Augusto Aras legitimou as ações do ministro Alexandre de Moraes, validando um procedimento apuratório que a Procuradoria da República já havia se manifestado pela ilegalidade.
Certamente que Alexandre de Moraes pode estar esperando que isso volte a ocorrer, pois se o Presidente Jair Bolsonaro não for reeleito, muito provavelmente o próximo Presidente da República, que as pesquisas indicam ser Luiz Inácio Lula da Silva, indicará um novo Procurador da República que não pensará duas vezes para atrapalhar a vida de Jair Bolsonaro e tentar macular de todas as formas o nome dele, para destruir o patrimônio político que foi construído.
Um Procurador da República indicado por Lula daria prosseguimento a todos os inquéritos policiais e processos ainda abertos contra Jair Bolsonaro, desde que não tenham sido arquivados, pois a Lei declara que um inquérito policial só pode ser reaberto se aparecerem novas provas.
Eis o motivo pelo qual o ministro Alexandre de Moraes vai desprezar a manifestação da Procuradoria da República e vai fechar os olhos para a regra constitucional que dá ao Ministério Público a última palavra sobre investigações. Isso é insegurança jurídica na essência da palavra.