Meio ambiente

Restauração da Mata Atlântica é iniciativa de referência para ONU

Anúncio aconteceu durante o Dia da Restauração de Ecossistemas na COP15 da Convenção sobre Diversidade Biológica, no Canadá

A Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu o trabalho de restauração florestal da Mata Atlântica como um dos mais promissores e relevantes do mundo, declarada como uma das 10 Iniciativas de Referência da Restauração Mundial da Década da ONU da Restauração de Ecossistemas. O anúncio foi realizado nesta terça-feira (13) durante a 15ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica da ONU (COP15), realizada em Montreal, no Canadá.

Essas iniciativas reconhecidas estão elegíveis para receber apoio, financiamento ou conhecimento técnico da ONU. E mostram como os defensores do meio ambiente estão consertando ecossistemas danificados em todo o planeta.

Em todo o mundo, nossas florestas estão sitiadas” disse a diretora-executiva do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), Inger Andersen. “A restauração da Mata Atlântica por meio do engajamento das comunidades locais é um poderoso lembrete de que a natureza pode se recuperar quando tem uma chance e que pode trazer enormes benefícios no processo”.

O trabalho é liderado pelo Pacto pela Restauração da Mata Atlântica e pela Rede Trinacional de Restauração da Mata Atlântica, que conta com organizações da Argentina, Brasil e Paraguai. Com o objetivo de restaurar 15 milhões de hectares até 2050, o PACTO é uma coalizão multissetorial que reúne mais de 300 organizações para restaurar a Mata Atlântica. A Rede Trinacional de Restauração da Mata Atlântica é um movimento transfronteiriço que abrange a Ecorregião trinacional do Alto Paraná na Argentina, Brasil e Paraguai, com mais de 60 organizações. Os membros dos dois coletivos possuem mais de 30 anos de experiência em restauração em diferentes contextos socioeconômicos e ecológicos.

Atuamos com colaborações conjuntas diretas nos territórios em que cada ator exerce funções fundamentais para a execução dos projetos, respeitando os contextos locais com o envolvimento de comunidades tradicionais e com o empoderamento feminino. Restaurar é muito mais que o plantio de árvores, é assumir um compromisso com a qualidade de vida de milhares de pessoas”, afirma Taruhim Quadros, representante da Rede Trinacional de Restauração da Mata Atlântica.

(Foto: Renato Augusto Martins/CC)

Muitos mais do que plantar árvores
A nomeação reconhece que a restauração é uma atividade que vai além do plantio de árvores, promove múltiplos benefícios para natureza e pessoas, capaz de gerar trabalho e renda.

Restauração é um sistema inclusivo que funciona de maneira diversa e de longo prazo, envolvendo diversas instituições”, explica Taruhim.

Para Lucía Lazzari, uma das representantes da Rede Trinacional de Restauração da Mata Atlântica na Argentina, a indicação enquanto Referência Mundial da Restauração é um reconhecimento de muitos anos de trabalho. “Para poder conduzir e propiciar verdadeiros processos de conservação e restauração da Mata Atlântica é fundamental que as comunidades locais estejam informadas e envolvidas. São elas e eles os verdadeiros agentes da mudança”, comenta Lazzari.

De acordo com Alex Fernando Mendes, secretário executivo do Pacto pela Restauração da Mata Atlântica, “o movimento ajuda a difundir a restauração em larga escala ao mesmo tempo que conecta iniciativas e compartilha conhecimento. Assim, até 2030, teremos um milhão de hectares restaurados ou em processo de restauração na Mata Atlântica, atuando de forma descentralizada e na elaboração de documentos de referência”, comenta.

As iniciativas de restauração na Mata Atlântica também promovem a conservação de espécies, aumentam a conectividade das paisagens, melhoram a provisão hídrica, estimulam a educação ambiental, o engajamento e bem-estar de comunidades locais e benefícios sociais. Ambos os coletivos também trazem iniciativas voltadas para a captação de recursos, monitoramento da qualidade das florestas restauradas, além da construção de parcerias para a restauração em larga escala e de longo prazo.

Nomeação
O título da ONU reconhece não apenas o legado de restauração da Mata Atlântica, mas também traz à tona que as iniciativas atuais das redes fortalecem coalizões e uma estratégia robusta de conservação, alinhadas com o Plano de Ação da Década da Restauração de Ecossistemas da ONU (2021-2030).

O progresso de todas as 10 Iniciativas de Restauração contempladas será monitorado de forma transparente por meio da Estrutura para Monitoramento da Restauração de Ecossistemas, a plataforma da Década da ONU para acompanhar os esforços globais de restauração.

Para a nomeação como Referência da Restauração Mundial, a ONU criou um comitê especial composto por cientistas e pesquisadores. Foram considerados mais de 20 critérios de avaliação, tais como: envolvimento de comunidades locais nas tomadas de decisão, formação de coalizões, contribuição para os acordos internacionais de redução de emissões, potencial de crescimento e replicabilidade, entre outros.

Em todo o mundo foram 156 propostas concorrendo ao título de Referência da Restauração Mundial, que, juntas representam mais de 96 milhões de hectares restaurados e com potencial de geração de mais de 1,5 milhão de postos de trabalho verdes.
Além da iniciativa da Mata Atlântica, também foram nomeadas como Referência da Restauração Mundial iniciativas na África, Oceania, América Central, Oriente Médio e Ásia. A lista completa está disponível AQUI.

20 anos de trabalho pela Mata Atlântica
Uma das mais de 15 unidades regionais do Pacto pela Restauração da Mata Atlântica é a Associação Ambientalista Copaíba, localizada na região de Socorro (SP). A instituição foi fundada há mais de 20 anos por um grupo de jovens e hoje tem um viveiro próprio com capacidade de produzir até 700 mil mudas ao ano e atua em 19 municípios da região leste do estado de São Paulo, fazendo girar a economia local e transformando a paisagem.

Vista geral da área de reflorestamento de Ellen Fontana, proprietária parceira do projeto Raízes de Mogi Guaçu (Foto: Tuane Fernandes/WWF-Brasil)

A restauração contribui para que possamos manter e garantir as seguranças básicas, desde alimentar, energética e hídrica que refletem diretamente na segurança econômica do nosso planeta. E isso mostra a necessidade de políticas públicas que apoiem essas iniciativas para ampliar a escala da restauração”, afirma Flávia Balderi, secretária-executiva da Copaíba.

Ellen Souza faz parte de um grupo cada vez maior de produtores que tentam manter o equilíbrio ambiental para agregar valor a seus produtos. Ela é a quinta geração à frente de uma propriedade de 50 hectares em Socorro que produz banana, abacate, eucalipto e café. Desde 2020, a fazenda recebe o apoio direto da Copaíba para a restauração e recomposição de áreas nativas. A proprietária faz a relação da sua produção com a restauração da paisagem florestal.

Eu acredito que, quanto maior o equilíbrio, melhor a lavoura fica, menor incidência de pragas e doenças, menos uso de defensivos, mais diversidade e harmonia no plantio. E isso impacta no sabor natural do grão. Quem compra o nosso produto reconhece todo o trabalho que realizamos. Muito além disso, é nossa forma de contribuir para um legado de um futuro melhor para minha filha, minha família. De combater as mudanças do clima que já nos afetam. Eu sei que minha contribuição é bem pequena, mas, se cada um fizer sua parte, faremos uma grande diferença no mundo”, afirma.

Mata Atlântica
O processo de degradação e desmatamento Mata Atlântica no Brasil começou há quase 500 anos, com a exploração desenfreada de espécies madeireiras, passando por diversos ciclos econômicos.

Exemplo de impacto humano na Mata Atlântica: corte seletivo de madeira (Foto: Renato A. F. Lima)

A Mata Atlântica é o lar de mais de 70% da população brasileira, seus rios fornecem água para grande parte das maiores cidades do país e para a maior concentração populacional da América do Sul, na região metropolitana de São Paulo. Este anúncio é um reconhecimento do papel único que este bioma desempenha não apenas em termos de serviços ecossistêmicos, mas também para a economia e para as pessoas”, afirma Julie Messias da Silva, Secretária de Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente do Brasil.

No Paraguai e na Argentina, começou mais recentemente, há cerca de 100 anos, devido à intensa exploração madeireira e à conversão em pastagens e agricultura. Os três países ainda enfrentam desafios para a conservação do bioma, sendo a restauração das paisagens uma oportunidade de aumento da cobertura florestal.
Victor Kreimer, Ministro de Ecologia e Recursos Naturais Renováveis de Misiones, Argentina, afirma que “a biodiversidade, como a onça-pintada, não reconhece fronteiras geopolíticas. Esforços transfronteiriços, trinacionais no nosso caso, são essenciais para entregar impacto positivo e sustentabilidade nas nossas ações”.

É importante destacar que a Mata Atlântica é um bioma que abriga uma biodiversidade única, contendo Ecorregiões Prioritárias para Conservação Global, além de ser reconhecida como uma Reserva da Biosfera MAB da Unesco (Programa MAB da Unesco em 1993 e 2009). Acima de tudo, o bioma é um ‘hotspot’ de restauração de florestas tropicais, “mostrando oportunidades econômicas com maior viabilidade e potencial de fornecer benefícios associados” (Brancalion et al. 2019).

Fonte: CicloVivo

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