Qual a responsabilidade da Cesan na Serra?
Companhia terceiriza suas obrigações e município fica sem saber a quem cobrar
Desde a chegada dos europeus em solo brasileiro que o nosso meio ambiente vem sendo agredido infindavelmente. Atualmente, para se ter uma ideia desse desastre, somente nos primeiros dois meses de governo da dupla Lula/Marina Silva, Amazônia e Cerrado, juntos, tiveram mais 536 mil hectares de áreas jogadas ao fogo. Mas o fogo não é o único agente corrosivo das nossas áreas naturais.
Mudanças bruscas no meio ambiente são ocorridas pelas ações direta do homem ou por acontecimentos naturais, dentre elas podemos citar as principais poluições como atmosférica e do solo, poluição sonora e visual e, por último, chamo atenção para a que considero a pior: a poluição das águas, provocada pontualmente pela falta de investimentos no Saneamento Básico, que traz uma série de prejuízos para o País e a população, principalmente, a mais vulnerável.
Segundo o Instituto Trata Brasil, em 2021, o Brasil investiu mais de 17,33 bilhões em saneamento básico, no entanto, ainda temos quase 100 milhões da população brasileira sem acesso à água tratada e à coleta de esgoto. Uma lástima!
Por anos, agredimos nossos espelhos d’água como rios, mares, lagoas, nascentes entre outros. Resíduos domésticos e industriais são despejados em nosso meio ambiente sem nenhuma interferência do poder público. Aqui, no Espírito Santo, somos obrigados a pagar caro pelo ‘desserviço’ prestado pela Companhia Espírito-Santense de Saneamento (Cesan) que, por tabela, contratou a Serra Ambiental para coletar e dar destino apropriado ao esgoto da população serrana, o que, absurdamente, não vem acontecendo.
Mas, por onde andam os órgãos fiscalizadores para sanar os principais problemas enfrentados como crise hídrica e poluição dos nossos espelhos d’água? Para tentar responder a este e outros questionamentos, o Fatos & Notícias entrevistou o secretário de Meio Ambiente da Serra (Semma), Cláudio Denicoli.
Para o secretário, eventos climáticos extremos serão cada vez mais comuns, uma vez que o mundo não para e os desafios continuarão a aparecer como períodos de chuvas intensas e outros de seca extrema.
Devido às mudanças climáticas, os eventos extremos serão cada vez mais comuns. Inclusive períodos de grandes precipitações e épocas de secas intensas. Em decorrência disso, temos estimulado os cidadãos serranos a reaproveitarem água da chuva, além de intensificarmos as ações de educação ambiental e ganhos em índices construtivos para quem construir reservatórios para águas pluviais, de acordo com o novo Plano Diretor Municipal Sustentável, aprovado há cerca de um mês”, explica Denicoli.
De acordo como o secretário, no Brasil ainda não existe legislação que exija o reaproveitamento de águas residuais o que mostra que a Serra saiu na frente. Os efluentes provenientes das estações de tratamento de esgoto na Serra, são, por lei, de responsabilidade da Cesan, que por sua vez transferiu todos os serviços de coleta, tratamento e manutenção do sistema de esgotamento sanitário a uma empresa privada, portanto, é de sua competência e responsabilidade reutilizar esses efluentes. “No entanto, sabemos que já existe uma negociação avançada com a empresa Arcelor Mittal para a reutilização do efluente de uma ETE.
Todavia, pela péssima eficiência das ETEs aqui no município, será necessário realizar um novo tratamento para que possa ser reutilizado no seu processo produtivo, o que encarece e dificulta a negociação”, explica.
Denicoli afirma ainda, que a Semma contratou uma empresa especializada para fazer análise dos efluentes das ETEs do município. Não obstante a Cesan ter repassado os serviços de coleta e tratamento de esgoto a uma empresa particular — há 10 anos — não existe melhora na qualidade das águas superficiais do município, o que está evidenciado pelos resultados obtidos a partir das amostras coletadas.
Dessa forma, contratamos um laboratório especializado na coleta e análise para que possamos monitorar essas águas sendo, este, um dos instrumentos da política de meio ambiente”, ressalta o secretário.
Perguntado se as estações estão operando dentro dos seus contratos e de suas licenças, Denicoli explica que o município possui 21 ETEs e apenas a de Manguinhos opera em conformidade com os padrões de tratamento determinados nas normas legais. As outras 20, não possuem a eficiência necessária, inclusive, pasmem, existem ETEs no município em que o esgoto sai mais sujo do que entra, ou seja, o tratamento está tão saturado, tão obsoleto e inadequado, que as ETEs estão sujando o esgoto e lançando essas águas contaminadas nos nossos mananciais, rios e lagoas. E não há previsão de melhoria nem a médio prazo, pois não há qualquer investimento nas estações de tratamento de esgoto, que deveriam ser as primeiras a receberem melhorias.
“Para se ter uma ideia da gravidade da situação, são lançados, diariamente, na natureza, cerca de 40 milhões de litros de esgoto com tratamento precário, somente no município da Serra. Quanto às lagoas e praias do município fazemos uma fiscalização intensa e punitiva, inclusive em situações corriqueiras de extravasamento de esgoto. Somente no ano passado, a Cesan e a empresa terceirizada foram multadas em quase R$ 10 milhões, todavia, a Cesan não as paga e a terceirizada entra na justiça comum. Inúmeras denúncias já foram feitas aos órgãos de controle, porém sem nenhuma ação efetiva”, critica Denicoli.
Para finalizar, volto à inquestionável incompetência técnica do Ministério do Meio Ambiente, cujos dados mostram que, nos primeiros meses do atual governo, praticamente as agressões ambientais, em todas as escalas e magnitudes, triplicaram. Questionei Cláudio Denicoli sobre essa situação e ele não fugiu da resposta. O secretário atribui os fatores a alguns elementos bem interessantes como a falta de educação ambiental (no amplo sentido do termo) e à impunidade, que se tornou quase inerente aos envolvidos no tema.
Em primeiro lugar, coloco a falta de educação ambiental, que deveria ser dada nas escolas por meio de matéria específica, no entanto, a Política Nacional de Educação Ambiental proíbe que exista uma cadeira exclusiva, o que considero inexplicável. Segundo, a clara falta de fiscalização e a certeza da impunidade. Terceiro, a enorme falta de debate sobre o assunto. E, por último, a real incapacidade dos gestores que ocupam cargos públicos na área ambiental não possuírem qualquer formação na área”, destaca.
Legenda foto de capa: Esgoto correndo a céu aberto – Serra/ES