Comportamento & Equilíbrio

A Madrasta repaginada — Parte II

A madrasta repaginada tem ainda uma reserva para atingir a mãe, quando a sente inalcançável. A Criança. Se alguém quer atingir uma mulher/mãe, use sua cria como veículo de agressividade

Nesse emaranhado de emoções e sentimentos em curso, um ponto muito importante também passa negado, a competitividade entre as mulheres. Do olhar aos gestos, passando pelas palavras ácidas, as mulheres têm muita dificuldade de sentir empatia pela outra. A sororidade fica nas campanhas. É preciso que sejam multiplicadas à exaustão.
Essa desunião/competição feminina não é originária das mulheres, ela é estrutural, um tentáculo do machismo. Enquanto os homens se defendem até quando não se conhecem, as mulheres se arranham tanto mais quanto mais se conhecem. Enquanto eles se unem se protegendo uns aos outros, elas se dividem se expondo umas às outras. Se você quer enfraquecer um grupo, promova sua fragmentação. É uma estratégia dos que mantêm o Poder. E aqui, não seria diferente. Sabemos que não haveria opressor se não houvessem oprimidos que se juntam a ele.

A psicanalista, Anna Freud, explica bem essa atitude com o entendimento do Mecanismo de Defesa do Ego, chamado “identificação com o agressor”. Depois, o estudo sobre a Síndrome de Estocolmo veio desvendar aquela mudança de atitude daquele que é torturado e que passa para o lado do seu torturador, aliando-se a ele. Por vezes, relações pseudoamorosas surgem para embalar essa ilusão do Poder desfeito pela aliança que apareceu.

(Foto: iStock)

No âmbito doméstico, parece-me que a configuração instalada é a hostilidade velada ou explícita, ou em graduações entre esses dois pontos, onde o homem, ex de uma e atual da outra, fomenta essa encrenca porque isso o mantem numa posição privilegiada, patrocinada pelas duas mulheres. Posição muito confortável, aliás. Administra, de tempos em tempos, uma violência vicária, nomeando uma ou outra na “procuração” para executá-la.

No entanto, não devemos esquecer que a madrasta repaginada tem ainda uma reserva para atingir a mãe, quando ela a sente inalcançável. A Criança. Se alguém quer atingir uma mulher/mãe, use sua cria como veículo de agressividade.

Assim, tomamos conhecimento dos muitos, muitos episódios de violência praticados pela madrasta repaginada. Elas cometem todo tipo de violência, da física à psicológica, passando até pela sexual para agradar o genitor que tem taras com a criança. A misoginia entre as mulheres é extensa e, aparentemente, incompreensível. Mas, é incontestável o número enorme de Mulheres em Postos Públicos, atacando outras mulheres através de preconceitos, de falsas afirmações.

Precisamos lançar luz sobre o machismo das mulheres. É estrutural, e de difícil acesso. Estamos, apenas, iniciando uma reorganização humanitária onde homens, mulheres, e outros, todos, terão garantias de Direitos. Ainda um desejo incipiente diante de tanto fundamentalismo secular. O machismo é um gerador de ilusões de Poder, baseado no controle e opressão do outro mais vulnerável. Ele está em todos os segmentos de todos os grupos humanos. E Crianças, as mulheres, os LGBTQIA+, os idosos, os indígenas, os pobres/pretos/periféricos, enfim, todos os desamparados são atrativos para essa ilusão de Poder esmagador. As Milícias Psicológicas são exímias lobistas de distorções que confundem muitas.

(Foto: iStock)

Esse desejo de Poder é almejado pelos mais fracos, pelos medrosos. Encontramos muitas mulheres/madrastas que se identificam com essa posição machista e exercem, assim, a violência contra a Criança. Escondem-se atrás da falácia da disciplina e batem nas Crianças, intimidando-as para que não relatem para a mãe.

A Madrasta repaginada precisa honrar o privilégio de uma substituição afetiva, da responsabilidade de acolher uma Criança que sofre aquela separação, ou está com a mãe ou está com o pai custa caro para ela. É leviano achar e publicitar que ter duas casas é melhor para a criança. Basta se imaginar mudando de casa sem parar que vamos ter uma leve percepção do transtorno que é se tornar mochileiro na infância. Ter duas casas é não ter nenhuma.

Precisamos de muitas boadrastas! Precisamos pensar a Mulher em sua essência, e não como chocadeira de um dono que se vale dessa posição social e submete mais uma mulher, a madrasta, a seus caprichos predadores.
PS.: Não estamos generalizando. Como existem justos na Justiça, também há Homens feministas, e Mulheres que honram sua função na vida.

Ana Maria Iencarelli

Ana Maria Iencarelli

Psicanalista Clínica, especializada no atendimento a Crianças e Adolescentes. Presidente da ONG Vozes de Anjos.

Related Posts

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

EnglishPortugueseSpanish