Economia

Inflação começa a pesar mais para a classe média

Aumento de preços em aplicativos de transporte, seguros de veículos e aluguel pressionaram a inflação da classe média em junho, segundo levantamento

Por Roberta Ribeiro

Manter o padrão de vida está ficando mais caro para as classes média e alta. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) demonstram que a alta na inflação de serviços, principalmente aplicativos de transporte, aluguel e seguros de veículos, elevou o custo de vida dessa faixa da população em junho.
O levantamento indica que nesse mês a alta de preços começou a pesar mais para as classes média e alta do que para os mais pobres, que até então vinham sendo afetados por índices mais altos. Já havia inflação significativa para todos os estratos sociais; a diferença agora é que os índices sobre os segmentos intermediários e mais altos passaram a ser maiores.

Segundo o Ipea, os índices de inflação para a população de renda média-alta e alta foram de 0,27% e 0,28% em junho, respectivamente, o que significa uma elevação na comparação com os índices de maio (0,21% e 0,08%). Os porcentuais de junho foram mais altos para esses grupos do que para as famílias de renda mais baixa.

Enquanto isso, a queda no preço de alguns alimentos, após nove meses de elevação, desacelerou o aumento da cesta de consumo que impacta diretamente as camadas da população de renda mais baixa. No entanto, no acumulado de janeiro a junho, a inflação sobre as famílias mais pobres ainda é mais intensa. De acordo com Matheus Dias, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da FGV (FGV-Ibre), os números retratam a influência maior que os alimentos têm na cesta da população de baixa renda, em comparação com a população de renda mais elevada. Para a população de baixa renda, o percentual gasto com alimentação é bastante elevado, fazendo com que altas nesses produtos prejudiquem mais esse grupo.

A população de baixa renda acaba se beneficiando desse movimento de menor pressão dos preços de alimentos, porque tem uma proporção da renda bastante significativa dedicada à compra de alimentos. Então, quando você tem um alívio nesses preços, essa parte da população acaba se beneficiando”, afirma.

À medida que a renda aumenta, a proporção do consumo de alimentos diminui em relação ao total de despesas. “As pessoas não compram mais alimentos porque a renda aumentou. Elas podem sofisticar o consumo, deixar de consumir um produto de baixa qualidade por um de qualidade mais elevada, consumir itens importados, seguir para linhas premium”, disse.

Salário mínimo e emprego pressionam inflação dos serviços
Em relação à alta inflacionária no setor de serviços, um dos principais fatores é o aumento do nível de emprego e do salário mínimo. Como o setor é intensivo em mão de obra, há uma alta nos custos, que acaba sendo repassada para o consumidor. Um estudo da consultoria LCA 4intelligence demonstrou que os incrementos salariais explicam praticamente 70% da inflação de serviços. De acordo com a consultoria econômica, a inflação de serviços deve fechar o ano em 5,2%.

Até maio, a inflação dos serviços vinha se mantendo sob controle em razão da baixa no valor das passagens aéreas (27,9%), que não se manteve em junho, quando teve alta de 0,8%. Além disso, também tiveram alta o transporte por aplicativo (13,7%) e o aluguel de veículos (5,5%).

Cuidados pessoais e habitação afetaram inflação em junho
Além dos transportes, a alta da inflação em outros setores, como habitação, também foi decisiva para o aumento da inflação para a população de renda média-alta e alta em junho. O grupo saúde e cuidados pessoais também pesou na inflação dessas faixas de renda, impulsionado pelos reajustes de 0,51% nos serviços de saúde e de 0,57% nos planos de saúde.

Em 12 meses, maior inflação foi a da alta renda
No acumulado de 12 meses, a faixa que registra o maior índice de inflação é a classe alta: o avanço médio dos preços foi de 5,4%, segundo o Ipea, ante 5,24% para os que têm renda muito baixa. A elevação de preços observada em serviços pessoais (5,5%) e mensalidades escolares (6,5%) contribuiu significativamente para o índice. Além disso, reajustes nos preços de vestuário, itens premium de alimentação e até mesmo de joias também estão impactando a alta da inflação para as faixas de renda média-alta e alta.

Inflação para população pobre foi mais alta entre janeiro e junho
Mesmo com o alívio no mês de junho, a faixa mais pobre da população foi mais afetada pela inflação no acumulado de janeiro a junho deste ano. O estudo do Ipea mede a inflação por faixa de rendimento e divide as famílias em seis grupos, de acordo com os respectivos ganhos mensais: renda muito baixa, baixa, média-baixa, média, média-alta e alta.

A inflação para cada uma dessas faixas em junho e no acumulado do primeiro semestre foi a seguinte:

  • Renda muito baixa (renda familiar abaixo de R$ 2.202 por mês): inflação de 0,2% em junho e 3,19% no 1.º semestre
  • Renda baixa (R$ 2.202 a R$ 3.303): inflação de 0,21% em junho e 3,15% no 1.º semestre
  • Renda média-baixa (R$ 3.303 a R$ 5.505): inflação de 0,23% em junho e 3,09% no 1.º semestre
  • Renda média (R$ 5.505 a R$ 11.010): inflação de 0,24% em junho e 2,97% no 1.º semestre
  • Renda média-alta (R$ 11.010 a R$ 22.020): inflação de 0,27% em junho e 3,04% no 1.º semestre
  • Renda alta (acima de R$ 22.020): inflação de 0,28% em junho e 2,58% no 1.º semestre

No acumulado de janeiro a junho, contribuíram para a inflação da classe de baixa renda (3,2%) a alta de 3,6% no preço dos alimentos no domicílio e de 7% na energia elétrica. A faixa de renda alta tem a taxa menos elevada (2,6%), beneficiada pela queda média de 27,9% das passagens aéreas no período.

Alta nos preços continua perceptível para quem tem menos renda
Matheus Dias explica que, mesmo que a queda no preço dos alimentos tenha trazido um alívio inflacionário para as camadas de renda mais baixa, nem sempre há um benefício perceptível por essa faixa da população. A inflação de alimentos subiu quase sem tréguas nos últimos anos, fazendo com que o nível de preços esteja muito alto.

Então, é bastante comum as pessoas de mais baixa renda alegarem que, apesar das quedas, os preços ainda estão muito altos”, afirma. O elevado valor da cesta básica faz com que as pessoas de renda mais baixa recorram a alternativas para conseguir manter o consumo. “Muitas acabam recorrendo ao endividamento para conseguir consumir a cesta básica”, explica.

Tarifas de Trump podem baixar preço dos alimentos no Brasil
Segundo Dias, se as tarifas de 50% impostas por Donald Trump aos produtos brasileiros entrarem em vigor, elas podem ajudar a reduzir o preço dos alimentos no mercado interno. Isso pode ocorrer caso setores exportadores de alimentos, principalmente, não consigam escoar a produção.

Nesse caso, em vez de irem para os EUA, os produtos podem ser direcionados para o mercado interno e, com a maior oferta, o preço tende a cair. De certa forma, é o que ocorreu em junho: com o aumento na safra e na oferta de alimentos, o preço caiu. Por outro lado, em relação a produtos manufaturados, por exemplo, caso o Brasil estabeleça uma tarifa recíproca para importações dos EUA, o custo irá aumentar, pressionando os preços.

Fonte: Gazeta do Povo

Luzimara Fernandes

Luzimara Fernandes

Jornalista MTB 2358-ES

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