Ao amarrar os sapatos
E foi assim, somente assim que,
Ao me curvar para amarrar os meus
Sapatos e, aqui eu confesso, com
Certa dificuldade, que ao fitar mais
Fixamente aqueles velhos cadarços
Desalinhados é que eu me dei conta
Do longo caminho já percorrido pelos
Meus pés cansados
Mais uma vez curvado, não tive
Como deixar de visualizar o chão
Batido e meio empoeirado, um
Pedaço de terra firme, um naco
Do enorme chão, por mim, tantas
Vezes já pisado
Ainda circunflexo, tentei me levantar
De súbito e num salto, mas uma amiga,
Antiga e incômoda dor me fez parar e
Obrigou-me a refletir um bocado, pensei
Sobre os lances da vida, sobre as idas
E vindas da estrada, vitórias e tropeços,
Além das inúmeras pedras do caminho,
Todas elas, graças a Deus superadas, não
Tive como deixar de pensar também na fé,
Na força, na determinação e na humildade
Impedido pelo aguilhão que insistia em me
Acossar, desisti por alguns instantes do meu
Intento e foi justamente neste instante, que
Ao olhar mais detidamente para as minhas
Botas, foi que me lembrei dos meus Irmãos
Em Cristo, companheiros de jornada e que
Andam por aí moribundos de mãos vazias,
De pés sujos e descalços
Lembrei-me do grande amálgama da vida,
Dos problemas do mundo, do destino do ser
E da dor, da fome e da miséria, da guerra, do
Ódio e da ira, do orgulho e do egoísmo, da
Soberba e do desamor que carregamos no peito
Recordei-me dos pobres e desafortunados,
Lembrei-me dos invisíveis e dos excluídos, dos
Desalojados e dos desassistidos, dos sem-tetos,
Dos sem-terra, dos analfabetos e dos não instruídos
Sentindo-me meio impotente e entristecido,
Aproveitei-me do momento e me ajoelhei, orei,
Vibrei e pedi perdão por minha iniquidade, pedi
A Deus força e coragem para lutar contra a injustiça
E contra a desigualdade e, somente aí, finalmente,
Obtive a força necessária para me levantar
Me pus de pé e agradeci por tantas bênçãos
Até aqui recebidas e foi aí, enfim, que pude
Respirar aliviado, caminhar e seguir adiante.
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